16 Novembro 2024
"Hoje, falamos sobre esse esforço consciente chamando-o de 'inclusão': um conceito, no entanto, que por sua vez não é suficiente, pois continua a manter uma distinção entre 'normais' e 'diferentes': coloca os primeiros em uma posição de superioridade e presume que eles têm a tarefa de acolher os segundos", escreve Vera Gheno, linguista italiana, em artigo publicado por La Stampa, 10-11-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Há alguns anos, assisti a uma palestra de Telmo Pievani, um filósofo da biologia. Fiquei impressionada quando ele disse que o ser humano é fisiologicamente programado para reconhecer o “diferente de si mesmo” e temê-lo, pelo menos por uma fração de segundo: em outras palavras, instintivamente tendemos à xenofobia. A amígdala, uma parte do lobo temporal do cérebro que gerencia as emoções e antecipa as reações do córtex cerebral, é a responsável. Por exemplo, quando vemos uma pessoa com alguma diferença visível (pele de outra cor, um corpo de tamanho incomum, uma roupa extravagante), a amígdala nos coloca em alerta antes que o nervo óptico tenha enviado seu impulso ao neurocórtex. Depois disso, este último registra o que está acontecendo e nos faz superar a reação instintiva de repulsa.
O funcionamento da amígdala é uma motivação para relativizar a ideia inerentemente ingênua de que “os seres humanos são todos iguais”: nossa biologia inevitavelmente nos leva a perceber as diferenças e, em primeiro lugar, a vê-las como uma possível fonte de perigo. O conceito de igualdade é o resultado da mediação que vem depois, do “pensamento lento”, como diria Daniel Kahneman. A questão é que essa etapa exige um esforço consciente: um esforço pequeno, mas significativo, que é parte do nosso ser animais sociais. Em resumo, a igualdade não existe, mas deve ser construída.
Hoje, falamos sobre esse esforço consciente chamando-o de “inclusão”: um conceito, no entanto, que por sua vez não é suficiente, pois continua a manter uma distinção entre “normais” e “diferentes”: coloca os primeiros em uma posição de superioridade e presume que eles têm a tarefa de acolher os segundos (negando-lhes a possibilidade de escolher como, quando e o quanto querem ser incluídos). Por isso, o conceito de inclusão também deveria ser superado, na direção de uma possível “convivência das diferenças”, conforme postulado pelo pesquisador Fabrizio Acanfora: uma sociedade em que as pessoas, com sua variedade de características, possam buscar juntas uma forma de conviver serenamente.
Como iguais, mas sem negar as diferenças (no plural). Nesse processo, a linguagem desempenha um papel importante: não para mudar magicamente a realidade, mas para ajudá-la; as palavras que escolhemos servem para tornar visíveis as ideias, as convicções, os julgamentos, os preconceitos, os conhecimentos que possuímos e podem contribuir para a criação de círculos virtuosos, nos quais as palavras e as ações se reforçam mutuamente. Por isso, escolhi, há alguns anos, adotar a visão da Acanfora e falar, por minha vez, de linguagem ampla em vez de inclusiva. Para mim, a linguagem ampla é uma concepção da língua como um espaço de infinitas possibilidades: quanto mais maneiras tivermos de dizer as coisas, mais ampla será a escolha à nossa disposição. Nas palavras de Tullio De Mauro (que remontam a 1975): “A escola tradicional ensinou como se deve dizer algo. A escola democrática ensinará como se pode dizer algo, em que fantástico universo infinito de formas distintas de comunicar somos projetados quando temos de resolver o problema de dizer algo”. A linguagem ampla não prescreve, não proíbe, mas propõe.
Da próxima vez que alguém reclamar que não se pode mais dizer nada, observe-a: talvez vocês possam ler em seu rosto o privilégio de nunca ter sofrido o peso das palavras como membro daquele grupo de pessoas rotuladas a fogo pela nossa sociedade como “diferentes”.