09 Janeiro 2024
"Quando parece que chegamos ao fim do poço com o 8 de janeiro, executado por uma extrema-direita desvairada, deparamo-nos com fatos, ideias, ações, politicagens, indicando que o fim do poço é um pouco mais embaixo", escreve Edelberto Behs, jornalista.
Eis o artigo.
Quando parece que chegamos ao fim do poço com o 8 de janeiro, executado por uma extrema-direita desvairada, deparamo-nos com fatos, ideias, ações, politicagens, indicando que o fim do poço é um pouco mais embaixo.
Como definir a proposição do senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), general da reserva do Exército, ex-vice-presidente da República, que encaminhou projeto de lei concedendo anistia aos condenados pelos ataques aos três Poderes no fatídico 8 de janeiro. Então, um militar reformado dá o pior exemplo para a vida democrática, defendendo perdão a quem quis derrubar a democracia na base do golpe! Não se espera tal defesa de quem se diz defensor da pátria!
Não só isso. A proposta é elitista, discriminatória. O próprio Mourão explicou o teor do projeto de lei. “Para que não haja dúvidas, não estamos propondo uma anistia ampla, mas apenas para esses crimes específicos, dada a impossibilidade de identificar objetivamente a intenção de cometê-los. Remanescem, todavia, as acusações e condenações pelos crimes de dano, deterioração do patrimônio tombado e associação criminosa, pois são condutas que podem ser individualizadas a partir das imagens de vídeos que mostraram toda aquela manifestação”.
Ou seja, perdão para os que financiaram a baderna e ficaram na retaguarda incentivando as buchas de canhão a demonstrarem força, poder, incivilizado, claro, ao invadirem as instituições pilares da democracia e destruir patrimônio da União. Mas cabe cana aos que deram ouvidos ao canto da sereia e colocaram o golpe em prática. Fica isento, assim, também o ex-presidente, que, afinal, estava fora do país e não teve nada a ver com a baderna. Haja hipocrisia. Anistia aos endinheirados. Cadeia para os pés-rapados. É Alice no país das maravilhas.
Maravilhoso, ao inverso, é também essa proposição do edil paulistano Rubens Alberto Gatti Nunes, pelo partido União Brasil, que teve seus 15 minutos de fama quando a imprensa divulgou o protocolo do seu pedido de abertura de CPI na Câmara Municipal contra a atividade do padre Julio Lancellotti e seu trabalho de apoio a moradores de rua da capital paulista. A CPI pretende investigar organizações não governamentais que supostamente fornecem alimentos, utensílios para uso de substâncias ilícitas e tratamento aos grupos de usuários que frequentam a Cracolândia.
Ou seja, o vereador Rubens Gatti, que é advogado, quer crucificar um padre que segue ensinamentos de Jesus de amor ao próximo, de socorrer o samaritano. O edil tem uma atitude “cristofóbica”, que a turma da extrema-direita tanto denuncia. Para melhor entender a constância e firmeza política – quiçá ideológica – do agora famoso vereador paulistano, basta conferir que de 2011 a 2022 ele passou por cinco partidos político, acabando no União Brasil. Os partidos que já contaram com sua valorosa contribuição foram: PR, de 2011 a 2016; MDB, de 2016 a 2020; Patriota, de 2020 a 2021; PSL, de 2021 a 2022; Podemos (2022) e finalmente o União Brasil (2022).
Em nota pública, o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic) somou sua voz à defesa do padre Julio, que, assinalou, se destaca como defensor da dignidade das pessoas em situação de rua. “Seu ministério é de doação às pessoas que são diariamente identificadas pelos arautos da teologia da prosperidade como sub-humanas, e pelas elites econômicas como perigosas, porque a simples presença de uma pessoa moradora de rua em bairros importantes dos centros urbanos desvaloriza imóveis e, na avaliação dessas elites, tornam feias as ruas e praças”.
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O fundo do poço é mais embaixo. Artigo de Edelberto Behs - Instituto Humanitas Unisinos - IHU