15 Dezembro 2023
“Apontar os combustíveis fósseis como causadores da mudança climática está certo. No entanto, com a situação que estamos vivendo, precisamos é de vontade política para enfrentar as mudanças necessárias, em diversos setores e no próprio sistema econômico, para reduzir as emissões de forma drástica e contínua. Então, resta (quase) tudo por fazer”, escreve Juan López de Uralde, ativista e político ambientalista espanhol, em artigo publicado por Público, 13-12-2023. A tradução é do Cepat.
Quando terminam as cúpulas do Clima, os delegados presentes costumam felicitar-se pelos resultados alcançados, sem ter uma perspectiva do que realmente significam no mundo exterior. Em relação à COP28, ouvimos mais uma vez avaliações que falam de um “acordo histórico” e de um “importante êxito”.
Em minha avaliação, o diagnóstico mais correto é o daquele delegado que afirmou sobre a declaração final: “Salvamos a cúpula de Dubai, mas não o planeta”. Essa afirmação reflete exatamente o que aconteceu: resultados claramente insuficientes para o planeta, mas que são vistos como um sucesso por quem participou no calor das negociações.
Toda análise deve ser feita em um contexto, e com uma situação de mudança climática cada vez mais intensa, a COP28 tinha que ter dado uma resposta incisiva para recuperar a credibilidade neste processo. O ano de 2023 bateu mais uma vez o recorde e é o mais quente desde que há registros. A mudança climática se agrava e os seus efeitos são cada vez mais evidentes: secas prolongadas, ondas de calor, temperaturas recordes, chuvas torrenciais e mares muito quentes são algumas das consequências já visíveis.
Por outro lado, as emissões globais de gases do efeito estufa não param de aumentar. De fato, voltarão a bater o recorde em 2023. Por isso, o mundo esperava desta COP medidas ambiciosas que promovessem verdadeiramente políticas de mitigação da mudança climática.
O acordo alcançado in extremis em Dubai foi, portanto, decepcionante e insuficiente. Em primeiro lugar, a declaração final não adotou a linguagem de “eliminação dos combustíveis fósseis” que estava sobre a mesa. A presidência da COP que ostentava o sultão Al Jaber (ao mesmo tempo presidente da petroleira ADNOC dos Emirados Árabes) conseguiu substituir a palavra “eliminação” por uma referência à “transição para deixar para trás os combustíveis fósseis”.
Esta mudança não é pequena e corresponde à mobilização de todos os países produtores de petróleo para evitar uma linguagem que possa ter consequências para as petroleiras. A OPEP chegou inclusive a enviar cartas a seus países membros alertando sobre as possíveis consequências da COP28 em seus interesses. Contudo, há outras questões que esvaziam ainda mais o acordo.
Um dos aspectos que mais contrariou as ONGs foi a introdução de tecnologias controversas no acordo final, inclusive, contrárias à luta climática. É o caso, por exemplo, da referência ao gás como combustível de transição. O gás é um combustível fóssil e, portanto, faz parte do problema e não da solução. Tampouco salvar o carvão através das possíveis, e pouco demonstradas, tecnologias de captura de carbono foi compreendido como um anseio de se avançar contra a mudança climática, mas, ao contrário, como outro entrave na transição energética para um modelo baseado 100% em energias renováveis.
Colocar a energia nuclear - como fez a COP28 - no mesmo nível das energias renováveis, como alternativa aos combustíveis fósseis, é um novo triunfo do lobby nuclear, mas inútil para reduzir as emissões. A energia nuclear não pode ser considerada uma solução real contra a mudança climática por vários motivos: seu alto custo, o longo prazo para a construção de novas centrais e o fato de ser uma tecnologia perigosa e que gera resíduos radioativos.
Do outro lado da balança, existe o compromisso de multiplicar por três a contribuição global das energias renováveis ou duplicar a eficiência energética. Estas, sim, são boas medidas que contemplam objetivos concretos.
Por outro lado, o acordo está cheio de boas intenções. Contudo, um dos problemas do processo das COPs é que os objetivos acordados não são vinculantes para os países. O Acordo de Paris estabeleceu uma meta – esta, sim, vinculante – de não ultrapassar em mais de 1,5 grau as temperaturas pré-industriais. No entanto, nada obriga os países a cumprir a redução de emissões. Este é um dos pontos mais fracos de todo este processo: que os acordos não sejam vinculantes para os governos.
Em suma, por mais que queiram que acreditemos, não estamos diante de um avanço histórico. Apontar os combustíveis fósseis como causadores da mudança climática está certo. No entanto, com a situação que estamos vivendo, precisamos é de vontade política para enfrentar as mudanças necessárias, em diversos setores e no próprio sistema econômico, para reduzir as emissões de forma drástica e contínua. Então, resta (quase) tudo por fazer.
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COP28: o acordo salva a cúpula, mas não o planeta - Instituto Humanitas Unisinos - IHU