21 Agosto 2023
"O ritmo das transformações dos “grandes projetos” implantados na região amazônica servem para gerar commodities para o mercado internacional", escreve Lúcio Flávio Pinto, em artigo publicado por Amazônia Real, 17-08-2023.
Lúcio Flávio Pinto é jornalista desde 1966. Sociólogo formado pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo, em 1973. Editor do Jornal Pessoal, publicação alternativa que circula em Belém (PA) desde 1987. Autor de mais de 20 livros sobre a Amazônia, entre eles, Guerra Amazônica, Jornalismo na linha de tiro e Contra o Poder. Por seu trabalho em defesa da verdade e contra as injustiças sociais, recebeu em Roma, em 1997, o prêmio Colombe d’oro per La Pace. Em 2005 recebeu o prêmio anual do Comittee for Jornalists Protection (CPJ), em Nova York, pela defesa da Amazônia e dos direitos humanos. Lúcio Flávio é o único jornalista brasileiro eleito entre os 100 heróis da liberdade de imprensa, pela organização internacional Repórteres Sem Fronteiras em 2014.
O ministério da Agricultura estima que a produção de grãos na safra 2022/23 seja 17,4% maior que a do ciclo passado. Deverá ter um incremento de 47,4 milhões de toneladas, resultando na colheita de 320,1 milhões de toneladas.
Já no Pará, a estimativa de crescimento da produção é menor, de 16,3% em relação à safra anterior. Passará de 3,9 milhões em 2021/2022 para 4,5 milhões de toneladas em 2022/2023.
Ou seja: o total da colheita de grãos no Estado não chega a 10% do volume adicional da safra nacional. Nem na Amazônia tem expressão. A safra atual na região Norte, como um todo, deverá ter um aumento de 18,2% em relação à safra anterior, saltando de 14,3 milhões para 16,9 milhões.
Esses números querem dizer que o Pará não passa de escoadouro para a grande produção de grãos do Centro-Oeste, principalmente de Mato Grosso, para o mundo. É um caminho de passagem de centenas de balsas em um vai e vem incessante.
Elas fazem a conexão da carga que chega à beira dos rios, transportada por milhares de quilômetros de estradas de rodagem (futuramente, também por ferrovias), embarcando em balsas em cidades do interior da Amazônia (principalmente Itaituba e Santarém, no Pará, e Itacoatiara, no Amazonas). E é transferida para navios de até 80 mil toneladas nos portos litorâneos da área metropolitana de Belém e em Macapá.
Deverão ser exportados 95,64 milhões de toneladas de grãos, 17 milhões a mais que em 2022. Serão mais 21,83 milhões de farelo e 2,60 de óleo tendo como destino o mercado internacional.
A maior participação paraense é na exportação de oleaginosas, devendo ficar em torno de 7,17 milhões de toneladas.
Função colonial da agricultura que se soma a funções idênticas em energia e minérios. A Amazônia é um ponto de extração e de passagem dessas riquezas, que são volumosas, como no caso do minério de ferro. São 230 milhões de toneladas por ano, extraídos da província mineral de Carajás, que um dos maiores trens de carga do mundo leva, por quase 900 quilômetros, do centro-sul do Pará, até a Ponta da Madeira, na ilha de São Luís, no Maranhão.
Esse grande e poderoso sistema de transporte surgiu, foi sendo ampliado e se tornou complexo num curto espaço de tempo. Um dos primeiros braços dessa teia de comunicação surgiu em um extenso rio, o Capim, que começa e termina no interior do Pará.
Os moradores da região, uma das mais antigas de ocupação pelo colonizador europeu, foram surpreendidos pela passagem de comboios de balsas, nunca antes avistados. Ninguém sabia o que essas embarcações transportavam. E quando ouviram falar sobre elas, desconheciam o produto que levava: o caulim, uma argila de múltipla utilidade, dos remédios e tintas à cobertura de papéis especiais. Mas logo surgiu outro produto, a bauxita, que serve à fabricação de alumina e alumínio.
Hoje, as balsas foram substituídas por minerodutos, também uma novidade no local. Em uma das pontas está uma grande jazida de bauxita. Na outra ponta, a maior fábrica de alumina do mundo, fora da China, e a 8ª maior metalúrgica de alumínio do mundo.
Assim tem sido o ritmo das transformações dos “grandes projetos” implantados na região para gerar commodities para o mercado internacional. Tanto as minerais como as agrícolas, além de energia bruta. Quem se interessar pelo que ocorre no hinterland amazônico, vai se surpreender com o que descobrir.
Por exemplo; que as maiores multinacionais de alimentos, como a Cargill, a Bunge e a ADM, dos Estados Unidos, controlam caminhões, balsas, navios e portos pelos quais vão as matérias primas amazônicas, sem carga de retorno. E quase sem atraírem o interesse dos moradores da Amazônia.
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Riqueza que vai e não volta. Artigo de Lúcio Flávio Pinto - Instituto Humanitas Unisinos - IHU