A reflexão bíblica é elaborada por Adroaldo Palaoro, padre jesuíta, comentando o evangelho do 16º Domingo do Tempo Comum, ciclo A do Ano Litúrgico, que corresponde ao texto bíblico de Mateus 13,24-43.
“Deixai crescer um e outro até a colheita!” (Mt 13,29)
A impressão que temos é que a paciência deixou de ser a virtude de nosso tempo; parece estar ameaçada de extinção. Aumenta a ansiedade que não espera, a angústia de não ter ainda o que se busca e a inquietude que parece não ter fim. Vivemos o tempo do imediatismo, da instantaneidade e da urgência. A pressa é a marca do nosso ritmo de vida e, por isso, nossas ações, decisões e a construção de nós mesmos são tão efêmeras e sem raízes. O impaciente se afoga em sua instabilidade, atropela tudo e rompe a harmonia, a beleza e a relação com os outros.
No entanto, a paciência é a atitude que faz vir à tona um conjunto de qualidades que nos fazem crescer como pessoas: saber esperar o ritmo das coisas e pessoas, tolerar o novo e diferente, aprender a conviver com aquilo que nos é próprio e respeitar o dos demais, firmeza na adversidade, levar adiante nossas próprias convicções, deixar-nos tocar pela crítica construtiva, olhar a realidade com uma visão mais ampla, crer naquilo que podemos chegar a ser, guardar no coração aquilo que ainda não está resolvido, não atropelar as pretensões dos outros, entrar em harmonia com a natureza, sonhar com uma realidade nova, trabalhar e confiar, respeitar o tempo de maturação das pessoas...
A paciência não é um controle absoluto de tudo, senão impedir que a urgência das coisas nos arraste para o turbilhão de pressas que nos impede respirar, pensar, decidir e agir com criatividade.
Em hebraico, a expressão “ser paciente”, significa “ter grandes narinas”. Isso quer dizer: respirar profundamente. De fato, ser paciente é ter uma respiração larga, uma respiração profunda.
Observemos a maneira como respiramos, quando estamos impacientes; a respiração se torna curta quando estamos ansiosos. Ativar em nós a paciência é entrar no fluxo do ritmo tranquilo da respiração.
Ser paciente é voltar sobre nossos próprios pés, enraizar-nos, aterrissar, estar aí, não nos deixar arrastar pela emoção. Após ter expirado profundamente, alguém é capaz de escutar o outro, é capaz de ser paciente.
A paciência é tecida na espera, mas também é uma virtude que se ativa no esforço constante, muitas vezes rotineiro e pouco heroico. A paciência abre a possibilidade do novo futuro, mantém acesa a busca e movimenta valores como a perseverança, o discernimento, a confiança, a resistência, a contemplação...
Segundo o evangelho deste domingo, o mistério escondido numa semente e as potencialidades presentes no ser humano merecem de todos nós o sagrado respeito pelo ritmo de crescimento, suscitando em nós uma atitude de admiração e encantamento.
A sementeira já foi realizada com êxito, as forças de Deus continuam agindo, mesmo ocultas e desenvolvendo-se de uma forma silenciosa. Ainda não chegou a colheita, mas, com certeza ela virá. Enquanto isso, convém esperar pacientes e tranquilos e confiar na ação providente de Deus. O ativismo, a pressa e a inquietação não nos farão atingir os objetivos que almejamos; não são as pessoas que realizam o Reino de Deus por suas forças; o Reino chega pela força de Deus e vai crescendo silenciosamente, “por si só”, sem que se perceba a sua expansão.
As três pequenas e inspiradas parábolas deste domingo nos falam de espera paciente, de respeito aos ritmos e processos, de confiança no dinamismo da vida... Jesus, em diferentes intervenções, faz referência a todo o processo agrícola, desde o plantio da semente até a colheita dos frutos. Semear, cuidar do crescimento, colher... tem seu ritmo próprio, o ritmo da natureza.
As três parábolas têm uma mensagem comum. Nas três, o Reino de Deus se compara com algo pequeno e, ao mesmo tempo, carregado de vida, que cresce e se manifesta pouco a pouco, a partir de dentro, sem ruídos nem aparências. Não se impõe como uma superestrutura na qual vivemos ou temos, mas que perpassa e transforma tudo, como uma força silenciosa, mas potente, que vem da natureza, não de nós mesmos.
Infelizmente, estamos perdendo o ritmo da natureza e queremos que tudo aconteça com a mesma rapidez quando nos comunicamos através dos meios eletrônicos. Temos “entranhas de impaciência”. Desistimos facilmente diante da falta de frutos ou as más ervas que crescem no campo da vida; queremos que as coisas sejam como imaginamos que devem ser; queremos plantar hoje e encher os celeiros amanhã. É preciso voltar a aprender com a mãe natureza.
Um olhar repousado e paciente supõe capacidade contemplativa e vida interior, aprender a diminuir a velocidade de nossas vidas, ações e pensamentos, e preparar-nos para a serenidade e para a espera criativa.
“A idolatria começa com um gesto de impaciência” (Onaknin). Na parábola do trigo e joio a impaciência dos empregados leva-os a querer ter o controle do campo, onde fora semeada boa semente. A paciência, pelo contrário, está na entranha mesma da Vontade de Deus, que quer que cada coisa se desenvolva em liberdade, com seu tempo e seu espaço, sem que ninguém se sinta ameaçado. A paciência é mão estendida para Deus e para o outro, enquanto a impaciência é um punho que ameaça e arrebata.
O “apressado”, coloca-se em estado de revolta contra o que ainda está inacabado, sufocando seu amadurecer e impedindo o ritmo normal de desenvolvimento.
A “pressa” tende a mostrar-se raivosa e impor-se, cega, à realidade. Prisioneiro de suas limitações, o impaciente julga absurda toda demora e mostra-se incapaz de ter interesse por tudo o que o cerca. Impaciente e irado, caracteriza-se pela intolerância que é destruidora.
A paciência, por sua vez, nos dispõe a olhar ao nosso redor e sermos surpreendidos por tanta beleza; ela nos possibilita aguardar e deixar-nos “tocar” por algo surpreendente.
Cada um de nós recebeu milhões de boas sementes ao longo de nossa vida. Também nos foram oferecidos todos os nutrientes que precisamos para crescer em meio às más ervas, misturadas em nossa realidade interior. Será que somos conscientes de que germinar e dar frutos, fermentar e mudar nosso ambiente, é um processo lento que requer nossa colaboração? Como vivemos os tempos nos quais parece que estamos debaixo da terra, no escuro, para poder sair e dar frutos?
É preciso, sobretudo, escutar nosso terreno interior com mais profundidade. Ali há um rico “celeiro” e reservas dos melhores recursos que devem ser mobilizados para o nosso crescimento e maturidade.
A espiritualidade inaciana nos revela que a paciência é uma ferramenta imprescindível no processo de decisão, uma luz que indica o próximo passo no longo caminho de construção de nós mesmos. O hábito permanente do discernimento pode tornar revolucionários os pequenos gestos de cada dia.
Pois a paciência implica aprender a parar nas encruzilhadas dos caminhos para eleger o melhor.
A paciência faz a vida; ela mobiliza nossos recursos mais nobres, desperta a criatividade e nos impulsiona a investir nossas melhores energias naquilo que é essencial e que dá sentido ao nosso caminhar.
Devemos deixar transparecer a paciência do Criador e trazer em nós a marca do tempo, dominando a pressa, purificando-a pela mística da atenção a tudo e todos que compõem o nosso cotidiano. Como simples peregrinos que somos, sempre a caminho, haveremos de suportar, pacientes, o adiamento. Em clima de festa sentiremos a vida em sua lenta e promissora evolução.
- Seu ritmo cotidiano é iluminado pela paciência do Criador, que trabalha em tudo e em todos ou ele tem a marca da pressa, da ansiedade, da impaciência?...