08 Novembro 2022
"Não seria melhor para os nossos padres, pouco antes da proclamação das leituras, descer do presbitério, sentar-se nas primeiras filas (nunca estão completamente ocupadas) e desfrutar da escuta da Palavra como se fossem sobretudo batizados?".
A proposta é do teólogo Marco Ronconi, professor de religião na diocese de Roma e professor de teologia no Instituto Leoniano de Anagni, Ronconi colabora com o Centro de Fé e Cultura “A. Hurtado” da Pontifícia Universidade Gregoriana e com a revista Jesus. Há alguns meses, pela editora Effatà, foi publicado o seu livro intitulado Teologia da bar. Libere conversazioni su Dio e dintorni, em artigo publicado por Jesus, 02-11-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Mas como pode um padre ficar constantemente virado para a assembleia? Eu sei que é uma discussão que tem dividido os especialistas, mas penso que em certos momentos da celebração eucarística - especialmente durante a liturgia da palavra - o padre deveria presidir de costas para os outros. Digo isso para o seu bem! Não sei se quem lê esta página já foi ministrante, isto é, se já se sentou em um presbitério que normalmente permite uma visão bastante completa e detalhada da assembleia. Se o fez, sabe que daquele lugar, para o padre (e para os ministrantes) é de fato impossível escutar as leituras que antecedem o Evangelho. Termina a oração coletiva, "por Cristo nosso Senhor, amém", todos se sentam, até o celebrante – sabe-se lá por que ele é o único a ser chamado assim, como se a assembleia fizesse algo diferente – vai até o seu assento, arruma decorosamente as vestimentas e a cena que se apresenta diante dele torna impossível desfrutar de uma profecia, de uma aventura patriarcal, de um hino paulino ou de um cenário apocalíptico.
Como alguém pode se entregar à escuta ou participar do canto responsorial se diante dele, impossíveis não ver, estão os filhos do catecismo, mal contidos em sua tagarelice ou em seu evidente desinteresse (exceto aqueles dois ali que, pela forma como olham para as mãos talvez sejam mais preocupantes do que todos os outros)? E se ele olhasse para além das primeiras filas, as coisas não melhorariam (os exemplos serão todos convencionalmente relatados ao masculino para evitar estereótipos de gênero): há aquele de olhos fechados que talvez durma ou talvez medite (nunca saberemos, a menos que ronque), aquele que espia o celular mas poderia ser algo grave (esperamos que não, claro que porém...), aquele que lê o folheto olhando para ele como se fosse uma enciclopédia, o aquele que não para quieto e passa de banco em banco ou não para de se mexer aquele vestido de uma maneira no mínimo bizarra para estar numa missa, aquele que encara o padre de forma inquietante (oh meu Deus, estou com a batina manchada?), aquele que olha para o chão à sua frente e o que fixa o céu.
Mas isso não é tudo: o olhar preocupado de um o fará lembrar de uma situação familiar complicada, a cabeça baixa de outro o fará temer que o resultado do exame tenha dado errado, a presença de toda uma família desconhecida o fará duvidar de sua memória, enquanto os óculos grossos do professor do colégio o deixarão embaraçado ao repensar as reflexões que preparou para a homilia e eis que chega o costumeiro retardatário... mas já chegou também o "aleluia, aleluia".
Não seria melhor para os nossos padres, pouco antes da proclamação das leituras, descer do presbitério, sentar-se nas primeiras filas (nunca estão completamente ocupadas) e desfrutar da escuta da Palavra como se fossem sobretudo batizados? Faria muito bem para eles e talvez nos lembrasse que diante da Palavra de Deus estamos todos no mesmo plano, todos ouvintes mais ou menos distraídos e participativos, de acordo com a vida que temos - não outra – para escutar o máximo que pudermos e receber mais do que merecemos.
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Se o celebrante descesse do presbitério - Instituto Humanitas Unisinos - IHU