Devemos dialogar, sempre. No voo de volta a Roma, o Papa Francisco responde às perguntas dos jornalistas que o acompanharam ao Cazaquistão e volta a falar sobre a guerra na Ucrânia, sobre o direito à defesa, do tráfico de armas. Mas fala também sobre o papel da política e do Ocidente em uma crise de valores que corre o risco de gerar populismos.
Respondendo a uma pergunta sobre a situação na Alemanha, Francisco explica que a Igreja precisa de pastores, não de planos pastorais.
No início da coletiva de imprensa, o Papa desejou um feliz aniversário à jornalista do jornal italiano Avvenire Stefania Falasca e depois fez servir um bolo para festejá-la.
A entrevista coletiva é publicada por Vatican News, 16-09-2022.
Zhanat Akhmetova (TV Agency Khabar) - Bom dia Santo Padre. Muito obrigado por sua visita ao Cazaquistão, qual é o resultado de sua visita, às origens de nosso povo, o que o inspirou?
Para mim foi também uma surpresa. Porque eu realmente da Ásia Central - exceto pela música de Borodin - não sabia de nada. Foi uma surpresa encontrar os representantes dessas nações. E também o Cazaquistão foi realmente uma surpresa porque eu não esperava que fosse assim. Eu sabia que é um país, é uma cidade, que se desenvolveu bem, com inteligência. Mas encontrar, após trinta anos desde a independência, tal desenvolvimento, eu não esperava. Então, um país tão grande, com dezenove milhões de habitantes... Inacreditável. Muito disciplinado, e bonito. Com muitas belezas: a arquitetura da cidade bem equilibrada, bem disposta. Uma cidade moderna, uma cidade que eu diria talvez "do futuro".
Foi isso que me impressionou tanto: o desejo de avançar não apenas na indústria, no desenvolvimento econômico e material, mas também no desenvolvimento cultural. Foi uma surpresa que eu não esperava. Depois o Congresso... uma coisa muito importante. Está em sua sétima edição. O que significa que se trata de um país com visão, que faz dialogar aqueles que normalmente são descartados. Porque existe uma concepção progressiva do mundo para o qual a primeira coisa a ser descartada são os valores religiosos. É um país que se apresenta ao mundo com tal proposta... já fez sete vezes, é maravilhoso! Então, se houver tempo, eu voltarei a falar sobre este encontro inter-religioso. A senhora pode se orgulhar do seu país, da sua pátria.
Visão panorâmica de Nursultan, antiga Astana, capital do Cazaquistão, com destaque para o palácio presidencial. Foto: Mariusz Klusniask | Flickr CC
Rudiger Kronthaler (ARD) - Santo Padre obrigado por sua mensagem de paz, eu sou alemão como se pode ouvir do meu sotaque. Meu povo é responsável por milhões de mortes há oitenta anos. Gostaria de fazer uma pergunta sobre a paz, já que meu povo é responsável por milhões de mortes. Nós aprendemos na escola que nunca se deve usar armas, nunca a violência: a única exceção é a autodefesa. Na sua opinião, neste momento é preciso dar armas à Ucrânia?
Esta é uma decisão política, que pode ser moral, moralmente aceita, se for feita de acordo com as condições de moralidade, que são muitas, e então podemos falar sobre isso. Mas pode ser imoral se for feito com a intenção de provocar mais guerra ou vender as armas ou descartar as armas que não preciso mais. A motivação é a que em grande parte qualifica a moralidade deste ato. Defender-se não é somente lícito, mas também uma expressão de amor à Pátria. Aquele que não se defende, aquele que não defende algo, não ama, enquanto aquele que defende, ama.
Aqui se toca uma outra coisa que eu disse em um de meus discursos, ou seja, que se deve refletir mais sobre o conceito de guerra justa. Porque hoje todos falam de paz: há tantos anos, há setenta anos as Nações Unidas falam de paz, fazem tantos discursos sobre a paz. Mas quantas guerras estão acontecendo neste momento? A que o senhor mencionou, Ucrânia-Rússia, agora Azerbaijão e Armênia, que parou um pouco porque a Rússia saiu como garante, garante da paz aqui e faz guerra lá... Depois há a Síria, dez anos de guerra, o que está acontecendo lá que não para a guerra? Que interesses movem estas coisas? Depois há o Chifre da África, depois o norte de Moçambique ou a Eritreia e uma parte da Etiópia, depois Myanmar com este povo sofredor que tanto amo, o povo Rohingya que gira, gira e gira como um cigano e não encontra paz.
Mas estamos em uma guerra mundial, por favor... Lembro de uma coisa pessoal, quando criança, eu tinha nove anos de idade. Lembro-me de ouvir o alarme do maior jornal de Buenos Aires: naquela época, para festejar ou dar más notícias, soava o alarme - agora já não soa mais - e podia ser ouvido em toda a cidade. A mãe disse: "O que está acontecendo?". Estávamos em guerra, no ano de 1945. Uma vizinha veio até a casa e disse: "O alarme soou..." e chorava: "a guerra acabou"! E hoje vejo mamãe e a vizinha chorando de alegria porque a guerra acabou, em um país sul-americano, tão distante! Estas mulheres sabiam que a paz é maior que todas as guerras e choravam de alegria quando a paz foi feita. Eu não me esqueço disso. Eu me pergunto: não sei se hoje estamos com um coração educado para chorar de alegria quando vemos a paz. Tudo mudou. Se você não faz guerra, você não é útil! Depois há a fábrica de armas.
Este é um negócio assassino. Alguém que entende de estatísticas me disse que se você parasse de fabricar armas por um ano se resolveria toda a fome do mundo... Eu não sei se é verdade ou não. Mas fome, educação... nada, não se pode porque tem que se fazer armas. Em Gênova, há alguns anos, há três ou quatro anos, chegou um navio carregado de armas que deveriam ser transferidas para um navio maior que estava indo para a África, perto do Sul do Sudão. Os trabalhadores das docas não quiseram fazer isso, e isso lhes custou, mas disseram: "Eu não colaboro". É uma anedota, mas que nos faz sentir uma consciência de paz. O senhor falou de sua Pátria. Uma das coisas que aprendi de vocês é a capacidade de arrepender-se e pedir perdão pelos erros da guerra. E também, não apenas de pedir perdão, mas de pagar pelos erros da guerra: isto diz bem de você. É um exemplo que se deveria imitar. A guerra em si é um erro, é um erro! E nós neste momento estamos respirando este ar: se não há guerra, parece que não há vida. Um pouco confuso, mas já disse tudo o que queria dizer sobre a guerra. Mas o direito à defesa, sim, mas usá-lo quando necessário.
Sylwia Wysocka (PAP) - Santo Padre, o senhor disse: não podemos jamais justificar a violência. Tudo o que está ocorrendo na Ucrânia agora é pura violência, morte, destruição total por parte da Rússia. Nós, na Polônia, temos uma guerra tão próxima de nossas portas, com dois milhões de refugiados. Gostaria de perguntar se o senhor acha que existe uma linha vermelha além da qual não se deveria dizer: estamos abertos ao diálogo com Moscou. Porque muitos têm dificuldade de entender esta disponibilidade. E eu também gostaria de perguntar se a próxima viagem será para Kiev.
Vou responder isso, mas prefiro que as perguntas sobre a viagem sejam feitas primeiro... Acho que é sempre difícil entender o diálogo com os Estados que iniciaram a guerra, e parece que o primeiro passo foi dado de lá, daquele lado. É difícil, mas não devemos descartar isso, devemos dar a oportunidade de diálogo a todos, a todos! Porque há sempre a possibilidade de que no diálogo se possam mudar as coisas, e também oferecer outro ponto de vista, outro ponto de consideração. Não excluo o diálogo com qualquer potência, seja em guerra, que seja o agressor... às vezes o diálogo se deve fazer assim, mas se deve fazer, 'tem mau cheiro', mas tem que ser feito. Sempre um passo à frente, uma mão estendida, sempre! Porque, ao contrário, fechamos a única porta racional para a paz. Às vezes não aceitam o diálogo: que pena! Mas o diálogo deve ser sempre feito, pelo menos oferecido, e isto faz bem para quem o oferece; faz respirar.
Papa Francisco no voo de volta do Cazaquistão para Roma. Foto: Paul Harin | CNS
Loup Besmond de Senneville (La Croix) - Santidade, muito obrigado por estes dias na Ásia Central. Durante esta viagem muito se falou de valores e de ética, em particular durante o Congresso Inter-religioso foi evocada, por parte de alguns líderes religiosos, a perda do Ocidente por causa da sua degradação moral. Qual é a sua opinião sobre isto? O senhor considera que o Ocidente se encontra em um estado de perdição, ameaçado pela perda de seus valores? Refiro-me particularmente ao debate sobre a eutanásia, sobre o fim da vida, um debate que ocorreu na Itália, mas também na França e na Bélgica.
É verdade que o Ocidente, de modo geral, no momento não está no nível mais alto de exemplaridade. Não é uma criança de primeira comunhão, não realmente. O Ocidente tomou caminhos errados, pensemos por exemplo na injustiça social que existe entre nós, há países que se desenvolvem um pouco na justiça social, mas penso no meu continente, a América Latina que é Ocidente. Pensemos também no Mediterrâneo, que é Ocidente: hoje é o maior cemitério, não da Europa, mas da humanidade. Como o Ocidente se perdeu a ponto de esquecer de acolher, quando, na verdade, precisa de pessoas. Quando se pensa no inverno demográfico que temos: precisamos de pessoas: tanto na Espanha - na Espanha sobretudo - também na Itália há cidadezinhas vazias, apenas vinte velhinhas, e nada mais. Mas por que não se faz uma política ocidental onde os imigrantes sejam incluídos com o princípio de que o imigrante deve ser acolhido, acompanhado, promovido e integrado? Isto é muito importante, integrar, mas em vez disso "não", deixa-se tudo vazio. É uma falta de compreensão dos valores, considerando que o Ocidente viveu esta experiência, somos países que migraram. No meu país - que acredito sejam 49 milhões de habitantes atualmente - temos uma porcentagem de menos de um milhão de nativos, todos os outros têm raíz migrante. Todos: espanhóis, italianos, alemães, eslavos poloneses, da Ásia Menor, libaneses, todos... Ali o sangue se misturou e esta experiência nos ajudou muito. Também, por razões políticas, a situação não está boa nos países latino-americanos, mas creio que a migração deve ser levada a sério no momento, porque eleva o valor intelectual e cordial do Ocidente. Enquanto que, com este inverno demográfico, para onde estamos indo? O Ocidente está em decadência neste ponto, está decaindo, está perdido....
Pensemos no lado econômico: é muito bem feito, mas pensemos no espírito político e místico de Schuman, Adenauer, De Gasperi, esses grandes: onde estão hoje? Existem grandes políticos, mas não conseguem levar a sociedade adiante. O Ocidente precisa falar, respeitar a si mesmo, e depois há o perigo do populismo. O que acontece neste tipo de estado sociopolítico? Nascem os messias: os messias dos populismos. Estamos vendo como nascem os populismos, creio que mencionei algumas vezes aquele livro de Ginzberg, Síndrome 1933: ele conta exatamente como nasceu o populismo na Alemanha após a queda do governo de Weimar. Os populismos nascem assim: quando há um nível com poucas forças, e alguém promete o messias. Acredito que nós, ocidentais, não estamos no mais alto nível para ajudar outros povos, será que estamos em decadência? Talvez, sim, mas temos que retomar os valores, os valores da Europa, os valores dos pais fundadores que fundaram a União Europeia, os grandes. Não sei, um pouco confuso, mas acho que respondi.
Loup Besmond de Senneville (La Croix) - E sobre a eutanásia?
Matar não é humano, ponto final. Se se mata com motivação, sim... no fim mata-se cada vez mais e mais. Matar, deixemos isso para os animais.
Iacopo Scaramuzzi (La Repubblica) - Gostaria de voltar a esta última pergunta: em seus discursos, o senhor sublinhou muito a conexão entre valores, valores religiosos e a vivacidade da democracia. O que o senhor acha que falta para o nosso continente, a Europa? O que deveria aprender de outras experiências? E, se me permite, acrescentaria uma coisa: dentro de poucos dias na Itália haverá um exercício democrático, ou seja, eleições, e será formado um novo governo. Quando o senhor se encontrar com o próximo primeiro-ministro ou primeira-ministra, quais serão os seus conselhos? Na sua opinião, quais são as prioridades para a Itália, quais são suas preocupações, que riscos devem ser evitados?
Acho que já respondi sobre isso na minha última viagem. Conheci dois presidentes italianos, do mais alto nível: Giorgio Napolitano e o atual. Grandes. Mas os outros políticos eu não conheço. Na minha última viagem, perguntei a um de meus secretários quantos governos a Itália já teve neste século: vinte. Não consigo explicar. Eu não condeno nem critico, simplesmente não consigo explicar. Se os governos mudam tanto assim, há muitas perguntas a serem feitas. Porque hoje ser um político, um grande político, é um caminho difícil. Um político que se coloca em jogo pelos valores da pátria, os grandes valores, e não se coloca em jogo por interesses, pelo cargo, as mordomias... Os países, entre eles a Itália, devem procurar grandes políticos, aqueles que têm a capacidade de fazer política, o que é uma arte.
A política é uma nobre vocação. Creio que um dos Papas, não sei se Pio XII ou São Paulo VI, disse que a política é uma das mais altas formas de caridade. Temos que lutar para ajudar nossos políticos a manter o nível da alta política, não da política de baixo nível que não ajuda em nada e que, ao invés disso, empobrece o Estado. Hoje, a política nos países da Europa deveria assumir abertamente o problema, por exemplo, do inverno demográfico, o problema do desenvolvimento industrial, do desenvolvimento natural, o problema dos migrantes... A política deveria enfrentar os problemas seriamente para poder avançar. Estou falando da política em geral. Quanto à política italiana eu não entendo: somente o fato de vinte governos em vinte anos, é um pouco estranho, mas cada um tem sua própria maneira de dançar o tango... pode-se dançar de uma maneira ou de outra e a política é dançada de uma maneira ou de outra.
A Europa deve receber experiências de outras partes, algumas serão melhores, outras não servirão. Mas deve ser aberta, todos os continentes devem ser abertos à experiência dos outros.
Elise Allen (Crux) - Obrigada por estar conosco nesta noite. Ontem no Congresso o senhor falou sobre a importância da liberdade religiosa, como o senhor sabe, no mesmo dia chegou à cidade o presidente da China onde há muito tempo existe uma grande preocupação com este assunto, especialmente agora com o processo que está em andamento contra o cardeal Zen. O senhor considera o processo contra ele uma violação da liberdade religiosa?
Para entender a China precisa de um século, e nós não vivemos um século. A mentalidade chinesa é uma mentalidade rica e quando fica um pouco doente, perde sua riqueza, é capaz de cometer erros. Para entender, escolhemos o caminho do diálogo, abertos ao diálogo. Há uma comissão bilateral Vaticano-Chinesa que está indo bem, lentamente, porque o ritmo chinês é lento, eles têm uma eternidade para ir adiante: é um povo com uma paciência infinita. Partindo das experiências que tivemos em precedência: pensemos nos missionários italianos que foram para lá e foram respeitados como cientistas; pensemos também hoje, muitos sacerdotes ou crentes que foram chamados pelas universidades chinesas porque isso dá valor à cultura. Não é fácil entender a mentalidade chinesa, mas ela deve ser respeitada, eu sempre a respeito. E aqui no Vaticano há uma Comissão de diálogo que está indo bem, o cardeal Parolin a preside e no momento ele é o homem que mais sabe sobre a China e o diálogo chinês. É uma coisa lenta, mas estão sendo dados passos adiante.
Não me agrada descrever a China como antidemocrática por ser um país muito complexo... Sim, é verdade que há coisas que nos parecem antidemocráticas, isso é verdade. O cardeal Zen vai a julgamento nestes dias, se não me engano. E ele diz o que sente, e pode-se ver que ali há limitações. Mais do que qualificar, porque é difícil, não me agrada qualificar, são impressões, tento apoiar o caminho do diálogo. Com o diálogo se esclarecem muitas coisas e não apenas da Igreja, também de outros setores, por exemplo a extensão da China, os governadores das províncias são todos diferentes, há culturas muito diferentes dentro da China, é um gigante, entender a China é algo gigantesco. Mas não devemos perder a paciência, é preciso eh, é preciso muito ter paciência, mas devemos ir em frente com o diálogo, eu tento me abster de qualificá-la... mas vamos em frente.
Papa Francisco no voo de volta do Cazaquistão para Roma. Foto: Paul Harin | CNS
Elise Allen (Crux) - E o presidente Xi Jinping?
Ele estava em visita de Estado lá, mas eu não o vi.
Maria Angeles Conde Mir (Rome Reports) - Na declaração que assinaram (no Congresso, ndr), todos os líderes sublinham um apelo aos governos e organizações internacionais a fim de que sejam protegidas as pessoas perseguidas por causa de sua etnia ou religião. Infelizmente, isso é o que está acontecendo na Nicarágua. Sabemos que o senhor falou sobre isso em 21 de agosto, durante o Angelus. Mas talvez possa acrescentar algo mais para o povo católico, especialmente na Nicarágua. Depois outra coisa. Vimos isso bem nesta viagem. Gostaríamos de saber se depois dessa viagem o senhor poderá retomar a viagem à África que foi adiada, e se há outras viagens programadas.
Todas as notícias sobre a Nicarágua são claras. Há diálogo. Foi falado com o governo, há diálogo. Isso não quer dizer que se aprova tudo o que o governo faz ou que se desaprova tudo. Não. Há diálogo e é preciso resolver os problemas. Neste momento existem problemas. Espero pelo menos que as Irmãs de Madre Teresa retornem. Essas mulheres são boas revolucionárias, mas do Evangelho! Não fazem guerra contra ninguém. Na verdade, todos nós precisamos dessas mulheres. Este é um gesto que não se entende. Mas esperamos que voltem e que o diálogo possa continuar. Mas nunca parar o diálogo. Existem coisas que não são compreendidas. Colocar um núncio na fronteira é uma coisa grave diplomaticamente. O núncio é uma pessoa boa que agora foi nomeado para outro lugar. Essas coisas são difíceis de entender e até de engolir. Mas, na América Latina há de um lado ou de outro situações desse tipo.
Quanto às viagens: é difícil. O joelho ainda não se curou. É difícil, mas a próxima a farei (refere-se a um projeto de viagem ao Bahrein para novembro próximo, ndr). Depois, eu falei outro dia com o monsenhor Welby (arcebispo primaz anglicano de Cantuária, ndr) e vimos como uma possibilidade fevereiro para ir ao Sudão do Sul. Se eu for ao Sudão do Sul, também irei ao Congo. Estamos tentando. Devemos ir os três juntos: o chefe da Igreja da Escócia, monsenhor Welby e eu. Tivemos um encontro via zoom outro dia sobre isso”.
Papa Francisco em missa na catedral católica de Nursultan. Foto: Paul Haring | CNS
Alexey Gotovskiy (EWTN) - Obrigado Santo Padre por visitar nosso país. Gostaria de perguntar: para os católicos que vivem no Cazaquistão, onde o contexto é predominantemente muçulmano, como a evangelização pode ser realizada neste contexto? Há algo que o inspirou vendo os católicos no Cazaquistão?
Inspirado, não sei, mas fiquei feliz hoje na catedral ao ver os católicos tão entusiasmados, felizes, alegres. Esta é a impressão sobre os católicos cazaques. Depois, a convivência com os muçulmanos: é algo sobre o qual se está trabalhando e estamos avançando, não apenas no Cazaquistão. Pensemos em algum país do norte da África, há uma bela convivência... no Marrocos, por exemplo. No Marrocos há um diálogo bastante bom. Detenho-me no encontro religioso (o Fórum desses dias, ndr). Alguém criticava e me dizia: isso é fomentar, fazer crescer o relativismo. Nada de relativismo! Cada um expressou sua opinião, todos respeitaram a posição do outro, mas se dialoga como irmãos. Porque se não há diálogo, há ignorância ou guerra.
Melhor viver como irmãos, temos uma coisa em comum, somos todos humanos. Vivamos como humanos, bem educados: o que você pensa, eu o que penso? Vamos chegar a um acordo, vamos conversar, nos conhecer. Muitas vezes essas guerras mal-entendidas "de religião" acontecem por falta de conhecimento. E isso não é relativismo, eu não renuncio à minha fé se falo com a fé de outro, pelo contrário. Eu honro minha fé porque outro a escuta e eu escuto a dele. Fiquei muito admirado que um país tão jovem, com tantos problemas – o clima, por exemplo – foi capaz de fazer sete edições de um encontro desse tipo: um encontro mundial, com judeus, cristãos, muçulmanos, religiões orientais... Na mesa se via que todos conversavam e se ouviam com respeito. Esta é uma das coisas boas que seu país fez. Um país assim, digamos, no canto do mundo, faz uma convocação desse tipo. Essa é a impressão que me deu. Depois, a cidade é de uma beleza arquitetônica de primeira categoria, e também me impressionaram as preocupações do presidente do Senado: ele levava adiante esse encontro, mas depois encontrou um tempo para me apresentar um cantor jovem, que você deve conhecer... esse jovem aberto à cultura. Eu não esperava isso e fiquei feliz de conhecê-lo.
Papa Francisco no VII Congresso de Líderes das Religiões Mundiais e Tradicionais, setembro de 2022, Cazaquistão. Foto: Paul Haring | CNS
Rudolf Gehrig (EWTN) - Santo Padre, muitas Igrejas na Europa, como a alemã, sofrem graves perdas de fiéis, os jovens não parecem mais intencionados a ir à missa. Quanto o senhor está preocupado com essa tendência e o que quer fazer?
É em parte verdade, em parte relativo. É verdade que o espírito de secularização, do relativismo, questiona essas coisas, é verdade. O que se deve fazer, antes de tudo, é ser coerente com a própria fé. Pensemos: se você é um bispo ou um padre que não é coerente, os jovens têm olfato... e então tchau! Quando uma Igreja, seja ela qual for, em algum país ou em um setor, pensa mais no dinheiro, no desenvolvimento, nos planos pastorais e não na pastoral, e se vai para aquele lado, isso não atrai as pessoas. Quando escrevi a carta ao povo alemão dois anos atrás, houve pastores que a publicaram e a divulgaram de pessoa a pessoa. Quando o pastor está próximo do povo, ele disse: o povo deve saber o que o Papa pensa. Acredito que os pastores devem continuar indo em frente, mas se perderam o cheiro das ovelhas e as ovelhas perderam o cheiro dos pastores, não se vai adiante. Às vezes - estou falando de todos, em geral, não só da Alemanha – se pensa como renovar, como tornar a pastoral mais moderna: isso é bom, mas sempre que esteja nas mãos de um pastor.
Se a pastoral está nas mãos dos "cientistas" da pastoral, que opinam aqui e dizem o que deve ser feito lá... (não se vai adiante, ndr). Jesus fez a Igreja com pastores, não com líderes políticos. Ele fez a Igreja com gente ignorante, os doze eram um mais ignorante que o outro e a Igreja foi adiante. Por que? Pelo olfato do rebanho com o pastor e do pastor com o rebanho. Esta é a maior relação que vejo quando há uma crise num lugar, numa província... Eu me pergunto: o pastor está em contato, está próximo ao rebanho? Esse rebanho tem um pastor? O problema são os pastores. Sobre isso me permito sugerir a você a ler o comentário de Santo Agostinho sobre os pastores. Lê-se em uma hora, mas é uma das coisas mais sábias que foram escritas para os pastores e com isso você pode qualificar este ou aquele pastor. Não se trata de modernizar: certamente é preciso atualizar-se com métodos, isso é verdade, mas se falta o coração do pastor, nenhuma pastoral funciona. Nenhuma.