30 Agosto 2022
O cardeal Mario Grech disse que incluirá novamente os católicos comuns e não será apenas uma reunião de bispos.
A reportagem é de Christopher Lamb, publicada por The Tablet, 27-08-2022. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Os católicos foram novamente chamados a fazer ouvir suas vozes durante a segunda fase do Sínodo mundial, que um cardeal descreveu como um momento sem precedentes na vida da Igreja.
O sínodo para “uma Igreja sinodal”, um ambicioso processo de renovação de dois anos destinado a mapear o futuro do catolicismo, foi lançado pelo Papa Francisco em outubro passado e provavelmente ficará como o legado duradouro de seu pontificado. Os detalhes da segunda fase “continental” foram anunciados em 26 de agosto no Vaticano, quando cardeais de todo o mundo se reuniram em Roma para discutir as reformas de Francisco do governo central da Igreja.
As primeiras descobertas do sínodo viram os membros da Igreja pedirem repetidamente o fim do clericalismo (o controle da Igreja por uma pequena elite – ordenada ou leiga), juntamente com papéis mais visíveis para as mulheres e maior inclusão de grupos marginalizados, como católicos LGBTQIA+. Para muitos, o sínodo representa a primeira vez que eles foram convidados a participar de um processo de consulta da Igreja.
O cardeal Jean-Claude Hollerich, o relator ou coordenador do sínodo 2021-2023, disse em uma entrevista coletiva no Vaticano em 27 de agosto que um “diálogo eclesial sem precedentes na história da Igreja” havia começado com mais de 100 conferências episcopais, de um total global de 114, que enviaram relatórios à Santa Sé.
O prelado de Luxemburgo acrescentou que um projeto realizado por influenciadores de mídia social obteve 110 mil respostas e alcançou cerca de 20 milhões de pessoas. Ordens religiosas e departamentos do Vaticano também realizaram processos sinodais.
Citando o testemunho do padre Michael Ryan, pároco da Catedral de St. James, em Seattle, o cardeal disse aos jornalistas que “que eu saiba, um esforço desse tipo e dessa escala nunca foi empreendido pela Igreja – nem mesmo em seus primeiros dias em que os números eram modestos”.
O prelado maltês, cardeal Mario Grech, que lidera o escritório sinodal da Santa Sé, disse a repórteres que a próxima fase do processo sinodal incluirá novamente católicos comuns e não é apenas uma reunião de bispos. Ele explicou que um documento sintetizando o material que as igrejas locais enviaram seria elaborado e divulgado até o final de outubro ou início de novembro.
O cardeal explicou que este texto seria então enviado às Igrejas locais para posterior discussão e reflexão, sendo solicitado a cada bispo “que leve o documento ao conhecimento de sua Igreja [local]”. O objetivo, explicou, era que o documento voltasse ao local onde “foi realizada a consulta” e que fosse adequadamente recebido pelos fiéis comuns.
Então, de janeiro a março de 2023, o discernimento continuará por meio de assembleias regionais envolvendo bispos, padres, diáconos e religiosos e católicos leigos.
A assembleia europeia acontecerá na República Tcheca de 5 a 12 de fevereiro de 2023, enquanto a reunião africana ocorrerá em Adis Abeba, Etiópia, de 1 a 7 de março de 2023. A Igreja da América Central e da América Latina está planejando cinco eventos diferentes em El Salvador (13 a 17 de fevereiro de 2023), República Dominicana (20 a 24 de fevereiro de 2023), Equador (27 de fevereiro a 3 de março de 2023) e Brasil (6 a 10 de março de 2023). Essas assembleias são uma chance de aprofundar a escuta e o discernimento do processo sinodal e demonstrar que o sínodo foi concebido como um processo contínuo e não como uma ocorrência pontual.
A fase continental será concluída em 31 de março de 2023, com as submissões das assembleias alimentando a redação do documento de trabalho final para a assembleia dos bispos no Vaticano para outubro daquele ano. A terceira parte do Sínodo será conhecida como a fase “universal”.
Embora o processo sinodal tenha sido descrito como a tentativa de renovação católica mais ambiciosa em décadas, está enfrentando resistência de uma minoria bem organizada que afirma que o processo é uma tentativa secreta de derrubar certos ensinamentos da Igreja. Seções da mídia católica estão amplificando a voz dos céticos do sínodo, enquanto alguns clérigos conservadores, muitas vezes mais jovens, estão resistindo silenciosamente ao processo.
Alguns também questionaram a legitimidade do sínodo, alegando que apenas um número relativamente pequeno de católicos participou.
No entanto, os números que participam do sínodo representam um aumento maciço em comparação com quantos crentes comuns contribuíram para os sínodos nas últimas décadas. A irmã Nathalie Becquart, funcionária do alto-escalão do escritório do Sínodo, destacou que países como Ucrânia e Nicarágua conseguiram realizar sessões de escuta, apesar das guerras e conflitos internos.
Em vez de ficar obcecado com os números, os organizadores insistem que o processo é uma tentativa de implementar a visão do Concílio Vaticano II da Igreja como o “Povo de Deus” e visa recuperar a prática de sínodos e concílios que ocorreram na Igreja primitiva e que as igrejas orientais continuam. O sínodo, enfatizam os organizadores, é um processo espiritual onde pessoas, padres e bispos procuram discernir a vontade do Espírito Santo.
Durante a coletiva de imprensa, o cardeal Grech enfatizou a “circularidade” do processo sinodal e alertou contra “colocar uma Igreja Popular contra uma Igreja hierárquica”. Quando perguntado se estava preocupado com os interesses políticos “sequestrando” o sínodo, Grech respondeu que somente o Espírito Santo poderia sequestrar o processo.
Ressaltou que o sínodo mostrou uma “Igreja viva, necessitada de autenticidade, cura” e que “anseia cada vez mais ser uma comunidade que celebra e proclama a alegria do Evangelho, aprendendo a caminhar e discernir juntos”.
Quando pressionado sobre se o sínodo levaria a uma mudança no ensino da Igreja sobre a homossexualidade, o cardeal Hollerich disse que não era a favor de mudar nenhuma doutrina, mas queria uma “Igreja onde realmente todos possam se sentir bem-vindos”. No passado, Hollerich havia sugerido que o ensino precisava ser revisto.
“Se fecharmos a porta às pessoas, levamos algumas pessoas ao desespero, e isso é algo que não queremos”, acrescentou. “Não tenho agenda pessoal para o sínodo. Tenho uma missão concreta... de ouvir e servir”.
O cardeal admitiu, no entanto, que a Igreja ainda estava aprendendo a se tornar sinodal.
“O processo de escuta e discernimento certamente não foi perfeito”, disse ele. “Também estamos aprendendo com nossos erros”.
O Vaticano também anunciou os encarregados de redigir o documento para a próxima fase do sínodo, que será aprovado pelo escritório sinodal em Roma. O grupo de redação é composto por especialistas de todo o mundo. Inclui a irmã Birgit Weiler, missionária que trabalha na Amazônia, o jesuíta Paul Beré, teólogo de Burkina Faso, dom Tim Costelloe, arcebispo de Perth, Austrália, e Austen Ivereigh, jornalista e comentarista católico.
De sua parte, Francisco insistiu que a sinodalidade deve se tornar a norma.
“A Igreja é sinodal, ou não é Igreja”, disse o Papa a um grupo de jesuítas no Canadá no mês passado. “É por isso que chegamos a um Sínodo sobre Sinodalidade, para reiterar isso”.
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Processo sinodal ‘sem precedentes’ avança para a próxima fase - Instituto Humanitas Unisinos - IHU