29 Julho 2022
A reportagem é de Sara Villén-Pérez, Luisa F. Anaya-Valenzuela, Denis Conrado da Cruz e Philip M. Fearnside, publicada por Amazônia Real, 27-07-2022.
Compilamos informações sobre 90 grupos indígenas isolados registrados em terras indígenas da Amazônia Legal brasileira, de acordo com um estudo do Instituto Socioambiental (ISA) [1] que inclui todos os registros da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e alguns registros derivados de pesquisas independentes do ISA.
A base de dados resultante incluiu:
(1) o nome do grupo isolado;
(2) a terra ou terras indígenas em que se encontra o grupo; e
(3) se há algum impacto relatado de garimpos afetando a área.
Também foi incluída uma classificação dos grupos isolados em três categorias com base no nível de conhecimento sobre eles:
i ) registros“sob informação” são aqueles que foram registrados pela Coordenação Geral de Povos Indígenas Isolados e Recentemente Contatados da FUNAI (CGIIRC/FUNAI) mas carece de qualquer estudo adicional;
ii) registros “em estudo” são aqueles registrados pela FUNAI que possuem evidências mais fortes de veracidade, mas ainda carecem de estudo sistemático; e
iii) registros “confirmados” são aqueles verificados pela FUNAI por meio de sobrevoos, expedições de campo ou outros meios [1, 2] . Excluímos deste estudo 32 grupos indígenas isolados cujos territórios estão na Amazônia Legal brasileira, mas fora dos limites das terras indígenas oficiais e estão localizados em unidades de conservação (27 registros) ou fora de qualquer unidade de conservação (5 registros). Por fim, consideramos que uma terra indígena possui atividade de mineração ilegal se Ricardo & Gongora [1] relatarem que a atividade afeta algum dos grupos indígenas isolados registrados na terra indígena em questão.
Combinamos este banco de dados com um banco de dados espacializados de todas as terras indígenas brasileiras obtido da FUNAI (ver Material Suplementar Figura S-1). Esse banco de dados inclui informações sobre a Coordenação Regional da FUNAI responsável por cada terra indígena e sobre a fase do processo de demarcação da terra indígena (ou seja, “em estudo”, “delimitada”, “declarada”, “homologada” ou “regularizada”).
Os 90 registros de grupos indígenas isolados incluem quatro registros que correspondem a dois grupos onde o mesmo grupo foi notificado em duas terras indígenas diferentes. Estes foram considerados grupos independentes para todas as análises realizadas em nível de terra indígena.
Obtivemos informações espacializadas sobre solicitações de mineração relatadas à Agência Nacional de Mineração [3] até 28 de agosto de 2020. Portanto, obtivemos informações adicionais sobre as operações de mineração que ainda não estão ativas, mas estão em fase de planejamento (ver [4]) para uma interpretação das diferentes fases do sistema de licenciamento brasileiro). Fizemos uma distinção entre
(1) solicitações de “pesquisa” (prospecção mineral), que buscam permissão para investigar o interesse minerário de uma área; e
(2) solicitações de “operação”, que estão solicitando permissão para a lavra. Essas fases são consecutivas, portanto, espera-se que um empreendimento primeiro investigue o potencial da área e depois solicite uma licença de operação.
Demonstrou-se que, com o licenciamento em áreas protegidas brasileiras, a maioria das mineradoras inicia suas operações em até oito anos [4]. Essas solicitações de mineração podem, portanto, ser consideradas como representando a mineração planejada para um futuro próximo.
As solicitações de mineração localizadas fora das terras indígenas foram descartadas, assim como os polígonos de solicitação de mineração localizados dentro das terras indígenas, mas menores que 1 ha. Quando um pedido de mineração afetava várias terras indígenas, era considerado um pedido separado em cada terra. Encontramos sobreposição espacial entre solicitações de mineração, bem como entre solicitações de mineração e projetos de mineração que já estão em operação (ver [4]). As sobreposições foram corrigidas para evitar superestimar a extensão da área afetada. Em primeiro lugar, foi descartada a área de solicitações de pesquisa que sobrepõem áreas com mineração operativa, presumindo que novas solicitações não avançarão em localidades que já estão sendo exploradas. Em segundo lugar, quando dois pedidos de mineração se sobrepunham, o da fase de licenciamento anterior era eliminado (ou seja, os pedidos de operação prevaleceram sobre os pedidos de pesquisa) ou qualquer um dos dois nos casos em que ambos os pedidos estavam na mesma fase. A correção de sobreposição afetou apenas as estimativas da extensão aérea das solicitações de mineração; nenhuma correção foi aplicada na avaliação do número de solicitações.
Estudamos 55 terras indígenas na Amazônia Legal brasileira nas quais um ou mais grupos indígenas isolados foram identificados. Para cada terra indígena, obtivemos o número de solicitações de lavra nas fases de pesquisa e licenciamento de operação e a área que seria ocupada por essas atividades. Também calculamos o tamanho de cada terra indígena. Os limites dos polígonos que representam as solicitações de lavra delimitam a área em que se pretende estabelecer a operação de lavra. Esta área não inclui nenhum desenvolvimento associado, como infraestrutura de transporte, urbanização ou processamento mineral. O número de solicitações em uma terra indígena é altamente correlacionado com sua área total de impacto (veja os resultados abaixo), então, para simplificar, focamos nos resultados para o número de solicitações.
Testamos a relação entre o número de pedidos de mineração em terras indígenas e a presença ou ausência de povos indígenas isolados, controlando o tamanho da terra indígena. A amostra para esta análise foram todas as 386 terras indígenas da Amazônia Legal brasileira. O número de solicitações de mineração em todas as terras indígenas segue uma distribuição binomial negativa, com média = 12,31, variância = 5256 e parâmetro teta = 0,098 (erro padrão = 0,010). Desenvolvemos um modelo linear generalizado (GLM) especificando a função log link. A matriz de covariância da estimativa os coeficientes foram produzidos por meio de um método que leva em consideração o efeito dos pontos de alavancagem e a heterocedasticidade dos resíduos [5]; especificamente, usamos o vcovHC função no pacote sanduíche no software R, definindo o tipo “HC4m”. O valor do fator de inflação de variância generalizada (GVIF) foi de 1,0004 para todas as variáveis preditoras.
Também testamos a relação entre o número de pedidos de mineração em terras indígenas e o número de grupos isolados, o nível de conhecimento sobre grupos isolados e a presença de atividade de mineração ilegal, controlando o tamanho da terra indígena. Neste caso, o tamanho da amostra foi de 55 terras indígenas na Amazônia Legal brasileira com relatos de grupos indígenas isolados.
O nível de conhecimento dos grupos isolados foi um fator ordenado com três níveis, considerando que Confirmado > Em Estudo > Sob Informação. O nível atribuído a cada terra indígena foi o mais alto nível de conhecimento para os grupos isolados naquela terra. O número de solicitações de mineração nessas terras indígenas segue uma distribuição binomial negativa, com média = 66,3, variância = 32.569 e parâmetro teta = 0,169 (erro padrão = 0,040). Desenvolvemos um modelo linear generalizado e especificamos a função de ligação logarítmica.
A matriz de covariância das estimativas dos coeficientes foi produzida usando o mesmo método da análise de presença ou ausência descrita anteriormente. Os valores de GVIF foram 2,59, 1,29, 1,37 e 2,62 para o número de grupos isolados, o nível de conhecimento dos grupos isolados, a presença de atividade de mineração ilegal e o tamanho da terra indígena, respectivamente. Usamos ArcGIS versão 10.1 [6] e R Software versão 3.6.2 [7] para processamento e análise do banco de dados. [8]
[1] Ricardo, F. P., Gongora, M. F. (2019) Cercos e resistências. Povos indígenas isolados na Amazônia Brasileira. Instituto Socioambiental, São Paulo, SP.
[2] FUNAI (Fundação Nacional do Índio) (2021) Fundação Nacional do Índio.
[3] ANM (Agência Nacional de Mineração) (2021) Geoinformação Mineral.
[4] Villén-Pérez, S., Mendes, P., Nobrega, C., Cortes, L. G., De Marco, P. (2018) Mining code changes undermine biodiversity conservation in Brazil. Environmental Conservation 45(1): 96-99.
[5] Cribari-Neto F., da Silva W. B. (2011) A New Heteroskedasticity-Consistent Covariance Matrix Estimator for the Linear Regression Model. Advances in Statistical Analysis 95(2): 129-146.
[6] ESRI (Environmental Systems Research Institute) (2012) ArcGIS 10.1. Environmental Systems Research Institute, Redlands, Califórnia, EUA.
[7] R Core Team (2019) R: A language and environment for statistical computing. R Foundation for Statistical Computing, Vienna, Aústria.
[8] Este texto é traduzido de: Villén-Pérez, S., L.F. Anaya-Valenzuela, D.C. da Cruz & P.M. Fearnside. 2022. Mining threatens isolated indigenous peoples in the Brazilian Amazon. Global Environmental Change 72: art. 102398.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Mineração ameaça povos indígenas isolados: 4 - Métodos de pesquisa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU