29 Março 2022
Sem participação dos sindicatos, empregados terão que “negociar” em posição de fragilidade com os empregadores os critérios das novas modalidades de trabalho remoto, alerta o Dieese.
A reportagem é publicada por Rede Brasil Atual - RBA, 28-03-2022.
O governo Bolsonaro editou na última sexta-feira (25) a Medida Provisória (MP) 1.108 que regulamenta o trabalho híbrido (presencial e home office). A MP também institui a modalidade do trabalho por produção ou tarefa, sem controle da jornada de trabalho. Conjuntamente, o governo publicou também a MP 1.109, que cria o Programa Emergencial do Emprego e da Renda em casos de calamidade pública. Esta permite a adoção de teletrabalho, antecipação de férias e feriados, estabelecimento de um regime diferenciado de banco de horas e suspensão do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), nestas situações e não apenas em âmbito federal, mas também nos estados e municípios.
Para o diretor técnico do Dieese, Fausto Augusto Junior, alterações desse tipo na legislação trabalhista não poderiam ser feitas através de MPs. Isso porque as mudanças não foram debatidas com a sociedade, e muito menos com os sindicatos. Além disso, a MP volta a insistir na negociação individual para definir os termos do trabalho que mistura presencial e home office.
O objetivo, segundo ele, é justamente enfraquecer ainda mais a representação coletiva dos trabalhadores, como vem ocorrendo desde a “reforma” trabalhista do governo Temer e por outras medidas do atual governo.
“A negociação individual, na prática, não é uma negociação. O que prevalece é o poder do empresário, do empregador sobre o trabalhador. Dificilmente o funcionário tem condições de fazer uma rejeição ou uma modificação, quando a empresa assim determina”, disse Fausto em entrevista a Glauco Faria, para o Jornal Brasil Atual nesta segunda-feira (28). “Nesse caso, por exemplo, do trabalha híbrido, passa muito mais por uma imposição da empresa, que decide para onde o sujeito vai, do que uma opção”.
Caberá ao empregador, por exemplo, “negociar” com o empregado os parâmetros do trabalho por tarefa. Para Fausto, não fica claro quanto tempo o trabalhador deve ficar à disposição da empresa. “Essa ideia de que o trabalhador está à disposição da empresa, e de que ele é o sujeito do processo da negociação, é algo bastante preocupante”, alertou Fausto.
Outra modificação trazida pela MP sobre trabalho em home office é que a utilização de ferramentas eletrônicas de comunicação, como o celular, fora da jornada de trabalho, deixam de contar como tempo à disposição do empregador. De acordo com Fausto, isso reacende a discussão sobre o “direito à desconexão”. Ou se deve contar esse tipo de interação como trabalho, ou o empregador deve se abster de acionar o funcionário fora da jornada acordada. “É uma questão bastante polêmica e que precisa ser olhada com mais cuidado. Já que, normalmente, é por esses mecanismos que o trabalhador hoje está conectado o tempo todo”, afirmou.
Já sobre a MP 1.109, Fausto classificou como “temerária”. Assim como ocorreu durante a pandemia, mas agora por razões como enchentes e outros desastres naturais, as três esferas de governo poderão alterar automaticamente as regras trabalhistas. “De novo, a gente insiste que muito pouco foi discutido com a sociedade. E agora foi encaminhado como medida provisória, que já tem força de lei”.
Nesse sentido, as regras que constam nas duas MPs entraram em vigor nesta segunda-feira (28). Elas têm prazo de validade de 60 dias, prorrogáveis por mais 60, para serem aprovadas no Congresso Nacional. Se não forem apreciadas nesse prazo, deixam de valer. “O ideal, para esse tipo de matéria, era ter sido encaminhado via projeto de lei, discutido com a sociedade, de maneira democrática”, frisou Fausto.
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MP de Bolsonaro sobre home office deixa trabalhador ‘na mão’ do patrão - Instituto Humanitas Unisinos - IHU