22 Março 2022
"O melhor caminho para a Rússia seria aprofundar uma aliança pacífica com seus vizinhos, a China, os BRICS e o mundo. A “declaração conjunta” da Rússia e da China, no dia 7 de fevereiro de 2022, propondo uma “refundação” da ordem mundial estabelecida depois da Segunda Guerra Mundial poderia ser levada à frente em um planejamento de longo prazo para “vencer” o Ocidente pela via pacífica, avançar na democracia, na concorrência comercial e no avanço científico e tecnológico", escreve José Eustáquio Diniz Alves, demógrafo e pesquisador em Meio Ambiente, em artigo publicado por EcoDebate, 21-03-2022.
A Rússia é o maior país do mundo em termos geográficos, com 17,1 milhões de km2, mais do dobro da área do Brasil. Também é uma potência militar. Porém, tem uma dimensão bem menor em termos demográficos e econômicos.
O gráfico abaixo, da Divisão de População da ONU (projeções de 2019), mostra que a população da Rússia já vem caindo desde 1993, quando atingiu o pico populacional de 148,4 milhões de habitantes. Em 2020, a população russa era de 145,9 milhões de habitantes, representando uma queda de cerca de 3 milhões de pessoas entre 1993 e 2020. Para 2050, as projeções (realizadas antes da pandemia) apontavam para uma população de cerca de 135 milhões, e para 2100, cerca de 126 milhões de habitantes. Nota-se que a população russa em 1950 era de 103 milhões, quase o dobro da população brasileira da época.
A pirâmide por sexo e idade da Rússia de 1950 mostra de maneira clara o impacto das duas grandes Guerras Mundiais. O número de homens de 30 anos e mais é bem menor do que o número de mulheres, refletindo a sobremortalidade masculina que ocorreram nas duas guerras. O dente apresentado no grupo etário 30-35 anos reflete a queda da natalidade que ocorreu durante a 1ª Guerra Mundial. A redução do tamanho do grupo 5-9 anos reflete a redução da natalidade durante a 2ª Guerra Mundial. O aumento relativo do grupo 0-4 anos reflete uma certa recuperação da natalidade no pós-guerra (1946-50).
Já a pirâmide de sexo e idade de 2020, mostra que houve uma grande redução da natalidade na década de 1990, logo após o fim da União Soviética. Mas nos anos 2000 houve uma certa recuperação das taxas de fecundidade e houve um crescimento dos grupos etários mais jovens. Mas a natalidade deve cair na década de 2020-30 devido ao efeito da pandemia, da guerra da Ucrânia e pela diminuição da proporção de mulheres no período reprodutivo.
O gráfico abaixo, com base nos dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), mostra que o Produto Interno Bruto (PIB) da Rússia era de apenas US$ 92 bilhões em 1992 (logo depois do fim da União Soviética), enquanto o PIB brasileiro era de US$ 382 bilhões, e o da Coreia do Sul de US$ 355 bilhões. Em 2022, a Coreia do Sul passou a ter o maior PIB, com US$ 1,9 trilhão, maior do que o PIB da Rússia, com US$ 1,8 trilhão, e do Brasil, com US$ 1,6 trilhão. Estes três países possuem um PIB de cerca de 2% do PIB mundial.
Considerando a renda per capita, em preços constantes em paridade de poder de compra (ppp), os três países possuíam renda per capita abaixo de US$ 20 mil em 1992. Mas, em 2022, a Renda per capita da Coreia atingiu US$ 45 mil dólares, a Rússia US$ 28,5 mil e o Brasil somente US$ 15 mil. Assim, o Brasil é classificado como renda média baixa, a Rússia como renda média alta e a Coreia do Sul como renda alta (estando no grupo dos países ricos). O Brasil tem renda per capita abaixo da média mundial e a Rússia pouco acima. A Coreia do Sul bem acima.
Os dados acima mostram que a Rússia, a despeito de ter o território mais extenso do mundo, tem uma população que é menos de 2% da população mundial e um PIB que é cerca de 2% da economia global. Desta forma, o poderio militar russo vai muito além do peso demográfico e econômico do país. Evidentemente a Rússia tem um peso demográfico, econômico e militar muito maior do que a Ucrânia. Mas uma ação bélica da dimensão atual deve apresentar um algo custo para a Rússia. O livro “Ascensão e Queda das Grandes Potências”, de Paul Kennedy, mostra que a disjunção entre poderio militar e poderio econômico leva ao declínio dos impérios.
As projeções econômicas indicam uma queda muito grande do PIB da Rússia em 2022 em função da guerra e em função das sanções econômicas. Mas toda a fraqueza econômica e demográfica da Rússia não parece abalar Vladimir Putin, que deu um “ultimato” não só para a Ucrânia não entrar na OTAN, mas apresentou a exigência de revisão das “perdas” que lhe foram impostas depois da dissolução da União Soviética. A URSS tinha 5 milhões de quilômetros quadrados e 140 milhões de habitantes a mais do que a Rússia atual. Ou seja, a URSS tinha, em 1989, cerca de 6% da população mundial e mais de 10% do PIB global.
E como vimos, a Rússia atual tem menos de 2% da população mundial e cerca de 2% do PIB global. Os gastos militares da Rússia em 2020 foram de US$ 67 bilhões, enquanto os gastos dos EUA foram de US$ 777 bilhões. Portanto, Putin não tem condições de restabelecer o poderio da URSS e nem de se tornar um novo Stalin. No máximo poderá invadir alguns países vizinhos e provocar a morte e o deslocamento de milhões de pessoas. Além de degradar o meio ambiente.
O melhor caminho para a Rússia seria aprofundar uma aliança pacífica com seus vizinhos, a China, os BRICS e o mundo. A “declaração conjunta” da Rússia e da China, no dia 7 de fevereiro de 2022, propondo uma “refundação” da ordem mundial estabelecida depois da Segunda Guerra Mundial poderia ser levada à frente em um planejamento de longo prazo para “vencer” o Ocidente pela via pacífica, avançar na democracia, na concorrência comercial e no avanço científico e tecnológico.
O primeiro passo para superar a atual governança global e o sistema interestatal criado, fundamentalmente, pelo Ocidente depois da Segunda Guerra é promover uma desmilitarização do mundo e redirecionar os gastos militares e de guerra para a área social e ambiental. Só num mundo regido pela paz e pelo respeito do direito internacional pode haver progresso para todos.
ALVES, JED. O Brasil é o país do BRICS mais afetado pela pandemia, Ecodebate, 25/01/2021 / link aqui
ALVES, JED. A população da Rússia em 2100, Ecodebate, 05/10/2012 / link aqui
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O tamanho demográfico e econômico da Rússia. Artigo de José Eustáquio Diniz Alves - Instituto Humanitas Unisinos - IHU