22 Dezembro 2021
O município de São Félix do Xingu enfrenta muitas dificuldades na questão do desmatamento e queimadas, porém ainda é guardiã de uma rica biodiversidade.
A reportagem é de Nicole Matos, publicado por Amazonia.org, 17-12-2021.
A voadeira, embarcação utilizada no transporte fluvial, parou no meio do Rio Xingu, Pará, por falta de gasolina, para alguns pode até dar um pouco de medo uma situação como essas acontecer, já eu acredito no destino. Naquele momento eu pude sentir uma paz inexplicável. Além das ondas do rio batendo na voadeira, o silêncio reinava, me senti privilegiada por estar admirando aquela obra de arte preciosa que tem o poder de renovar a alma.
Quando se escuta o nome da cidade de “São Félix do Xingu”, localizada no estado do Pará, geralmente vem acompanhado de alguma notícia sobre degradação ambiental. O município, que tem menos de 60 anos, é o sexto mais extenso do Brasil, com 84 mil quilômetros quadrados e é o primeiro em produção de cabeça de gados, cerca de 2,4 milhões, isso poderia ser algo positivo se não viesse acompanhado do desmatamento, São Félix foi o terceiro município que mais desmatou a Amazônia em 2021 e o que mais emitiu gases de efeito estufa em 2018.
Para o Secretário do Meio Ambiente e Mineração (Semmas), Sérgio Benedetti, a cidade de “São Félix do Xingu é um celeiro de oportunidades, é uma cidade muito rica em termos de biodiversidade”, um de seus objetivos frente a secretaria é mudar a visão negativa de SFX.
“Meio ambiente quando a gente não ouve falar é porque está tudo bem. A gente vai ouvir falar quando começa a dar problema, né? O principal objetivo é mudar a visão que São Félix do Xingu tem no Brasil e no mundo. Tem muita gente lutando junto comigo pra transformar essa cidade e fazer com que apareça amanhã ou depois na mídia como um município que era muito degradador do meio ambiente e gerador de gás do efeito estufa, enfim, que a gente mude esse panorama e comece a apresentar as coisas boas que a gente tem aqui também”, afirma o secretário.
O Secretário da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Semagri), Marlos Peterle, relata que os produtores da cidade sofrem com essa visão negativa, muitas vezes eles passam por muitos problemas que dificultam a regularização de suas propriedades e de produção para fonte de renda.
A regularização fundiária ainda é um tema complexo. Recentemente a Medida Provisória nº 910 entrou em destaque por alterar o marco legal, logo em seguida transformada no Projeto de Lei nº 2633/2020. Essas mudanças constantes no marco legal são um incentivo à grilagem e ao desmatamento ilegal e acabam prejudicando os pequenos agricultores. Nesse caso, o secretário da agricultura é responsável tanto por ações de política fundiária como por ações de regularização ambiental dentro do Código Florestal, tendo a oportunidade de promover a integração destas políticas de forma estratégica.
“A agricultura é a fonte de renda do município e às vezes esbarramos na burocracia para ajudar e fazer nosso papel de fomentar e trazer para o agricultor uma melhor fonte de renda, uma melhor forma de trabalhar dentro do cunho ambiental. Falta um olhar de importância para que possamos realmente ser um alicerce para o agricultor e tentar desmistificar essa questão do desmatamento e mostrar a potencialidade do nosso município. Temos produção de cacau, uma bovinocultura, corte e leite, muito forte, tem a questão da piscicultura e a fruticultura, principalmente para produção de polpas que estão vindo com força e que merecem ser reconhecidas.”
Também em busca de solucionar uma das questões negativas de São Félix do Xingu, a Amigos da Terra – Amazônia Brasileira em parceria com a Frigol e com a Semmas, desenvolve na região o Projeto Fogo – Ações para Diminuição das Queimadas, que tem como objetivo conscientizar a população local os perigos e o tamanho do impacto que as queimadas intencionais podem casar para a biodiversidade local.
A coordenadora do projeto, Luciane Simões, afirma que a intenção é tirar São Felix dos primeiros lugares do ranking de municípios que mais queimam no estado do Pará. “O que queremos é transformar SFX em um case de sucesso. É hora de tirar esse demérito do município e o próximo ano nos colocará à prova disso”.
Ainda durante a minha viagem consigo perceber a vontade dos moradores de reverter a situação da cidade, seja o dono do hotel indicando os principais pontos da cidade e fazendo questão de mostrar que a parte dele, ele está fazendo, ou a cozinheira do restaurante ao indicar o melhor prato do cardápio que particularmente te conquistam, a vendedora de loja que vende artesanato indígena, todos desejam uma São Félix melhor.
Nas primeiras semanas deste mês, a Secretaria do Meio Ambiente em parceria com a Fundação Nacional do Índio (Funai) pôs em prática o Projeto Quelônios, uma ação realizada em uma área da Reserva Indígena Kayapó, que devolveu ao Rio Xingu cerca de 4 mil filhotes de tracajás (Podocnemis unifilis).
Voluntários do projeto que tem como objetivo aumentar a população de tracajás no Rio Xingu, coletam os ovos durante o período de desova dos animais, esses ovos levam cerca de 45 dias para nascer os filhotes, que até atingirem condições de sobreviver no meio ambiente ficam sob cuidados de técnicos da SEMMAS e da população indígena da região.
O tracajá é uma espécie típica das bacias do norte da América do Sul, principalmente nas regiões da Amazônia Legal, podendo chegar a medir até 45 centímetros com peso de 8 quilos e já é considerada uma espécie vulnerável (VU/IUCN) por conta da captura predatória.
Um dos principais pontos turísticos da região no verão é a Praia do Porco, que é banhada pelos encontros dos rios Fresco e Xingu e, durante o mês de julho o balneário reúne mais de 50 mil veranistas, incluindo moradores da região, de cidades vizinhas, turistas de estados próximos e até de outros países. Logo após este período o volume do Rio Xingu sobe e a praia fica debaixo d’água.
Durante a temporada deste ano, o secretário da Semmas, fez um trabalho de revitalização da praia. “Nós fizemos a distribuição de várias placas de identificação, fizemos reuniões com o pessoal que trabalha vendendo os seus produtos na beira da praia, colocamos lixeiras junto com a secretaria de turismo. Fizemos um trabalho de acordo com o que era cabível no momento da pandemia. Tem um projeto muito maior, muito mais robusto, que buscaremos implementar em 2022, se a pandemia estiver sob controle. Mas esse ano já deu um resultado que repercutiu positivamente entre os frequentadores”, destaca Sérgio Benedetti.
Realmente o elogio está presente entre a população que aguarda a próxima temporada do verão para tomar sol, se divertir e dar um mergulho nas águas do Rio Xingu.
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As duas faces da cidade de São Félix do Xingu, no Pará - Instituto Humanitas Unisinos - IHU