12 Novembro 2021
"Não são apenas migrantes e refugiados, mas pessoas que são utilizadas por um regime governamental. Traficados para fins políticos e usados como escudo humano na tentativa de obter ganhos políticos e desestabilizar a situação na fronteira da UE. Essa ação é chamada de ataque híbrido, porque usa armas não tradicionais (tráfico de pessoas, desinformação e outros meios) para atacar a integridade das fronteiras de outros países”. Esta é a forte denúncia lançada por D. Gintaras Linas Grušas, arcebispo de Vilnius e novo presidente do Conselho das Conferências Episcopais da Europa, sobre o que está acontecendo na fronteira entre a Bielo-Rússia e a Polônia, onde milhares de migrantes se aglomeraram. “Trata-se - acrescenta – de uma nova forma de tráfico de seres humanos”, utilizada “não para ganho financeiro pessoal, mas para ganhos políticos na tentativa de preservar um regime autoritário”.
“É com grande tristeza que vemos essas imagens e o sofrimento que as pessoas estão passando. Famílias com crianças presas na fronteira. Mas também é muito importante entender o que está por trás dessas imagens. Eles não são apenas migrantes e refugiados, mas pessoas que são usadas por um regime governamental”. Usa palavras claras e diretas, Mons. Gintaras Linas Grušas, arcebispo de Vilnius e novo presidente do Conselho das Conferências Episcopais da Europa, para descrever e denunciar o que realmente está acontecendo na fronteira entre Bielo-Rússia e Polônia, onde cerca de 4.000 migrantes se reuniram em campos perto de Kuznica, fugindo principalmente da Síria e Iraque.
E acrescenta: “São traficados para fins políticos e usados como escudos humanos na tentativa de obter ganhos políticos e desestabilizar a situação na fronteira da UE. Essa ação é chamada de ataque híbrido, porque utiliza armas não tradicionais (tráfico de pessoas, desinformação e outros meios) para atacar a integridade das fronteiras de outros países”.
Divisa entre Polônia, Bielorrússia e Lituânia (Imagem: Google Maps)
A entrevista é de Chiara Biagione, publicada por Agência SIR, 11-11-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Quem são as pessoas que cruzam essa rota para a Europa?
Pude falar com alguns dos refugiados. Muitos estão tentando escapar de situações horríveis em seus países de origem. Muitos viram os horrores da guerra, até mesmo seus familiares mortos diante de seus próprios olhos. Alguns também fogem da perseguição por motivos religiosos. Outros procuram uma vida melhor. Outros ainda são estudantes de várias nações africanas a quem foi dada a oportunidade de estudar na Bielo-Rússia.
Quando o regime de Lukashenko decidiu tomar essa medida para criar uma crise de fronteira com a União Europeia, elevou o aluguel dos dormitórios para esses estudantes estrangeiros a tal ponto que eles não puderam mais pagar. Nessa altura, deram-lhe a opção de regressar ao seu país ou "ir para a UE".
O que acontece nesse ponto?
Diante de tal escolha, decidem ir para a UE, sem entender a posição em que são colocados. O governo os leva até a fronteira e os atravessa. Nesse ponto, quem é parado por tentar cruzar a fronteira ilegalmente é mandado de volta, mas não pode voltar para Minsk nem para qualquer outro lugar. É detido na fronteira por funcionários bielorrussos que estão armados e usam cães para impedir que as pessoas fujam e se coloquem em segurança. Além disso, o governo bielorrusso está organizando voos para Minsk, oferecendo às pessoas a promessa de uma oportunidade de entrar na União Europeia. Muitas pessoas, sem saber que estão sendo manipuladas, mordem a isca na esperança de um futuro melhor.
Por que usar migrantes?
Tudo é coordenado pelas autoridades bielorrussas para ter uma posição negocial com a União Europeia, para eliminar as sanções que foram impostas pelas ações anteriores do regime. Os próprios bielorrussos testemunham que os migrantes que chegam à Bielorrússia como turistas são recolhidos pelos guardas de fronteira das cidades bielorrussas e levados para a fronteira com a União Europeia. Trata-se de uma nova forma de tráfico de pessoas, que é um crime reconhecido internacionalmente, mas nesse caso não para ganho financeiro pessoal, mas para ganhos políticos na tentativa de preservar um regime autoritário.
Mapa da Bielorrússia (Imagem: Google Maps)
Você quer lançar um apelo para os líderes políticos?
Para entender a possibilidade de fazer um apelo aos líderes políticos, é preciso lembrar a situação na Bielo-Rússia. Na Bielo-Rússia, muitas pessoas inocentes são torturadas, perseguidas e presas. Isso está acontecendo nas fronteiras da Europa e com pessoas que lutam pelos valores e as liberdades ocidentais. O regime de Lukashenko tomou sua própria população como refém e está usando refugiados como reféns e escudos humanos. A Caritas e outras organizações humanitárias na Lituânia estão trabalhando com o governo não apenas para fornecer assistência àqueles que cruzaram a fronteira e atualmente são hóspedes em centros de migrantes, mas também na preparação de pacotes de assistência que podem ser dados aos que permanecem presos na fronteira.
Qual é a maneira certa de abordar o problema?
Em primeiro lugar, é de extrema importância ajudar as pessoas na migração. Os fundos foram levantados na Lituânia para ajudar os migrantes, tanto por meio das paróquias quanto diretamente da Caritas. Mas a situação é muito mais complexa do que uma simples questão migratória ou de refugiados, e exige que a comunidade política internacional tome medidas para acabar com essa ação militar não convencional e essa forma de tráfico ilegal de pessoas para ganho político. O tempo da misericórdia é agora. A solidariedade dos cristãos com os necessitados é da maior importância. Para ajudar quem está nos centros de migração e na fronteira, mas também e muito mais para ajudar quem está preso nas redes dessa nova forma de tráfico de seres humanos.
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“Os migrantes são usados como escudos humanos. É um ataque híbrido à integridade das fronteiras”, constata arcebispo de Vilnius - Instituto Humanitas Unisinos - IHU