07 Junho 2021
O sociólogo e filósofo francês Edgar Morin completará 100 anos no dia 8 de julho e lança um novo livro, nesta semana, na França: "Lições de um século de vida" ("Leçons d'un siècle de vie", editora Denoel). Nesta obra, que pode ser a última publicada por este pensador da transdisciplinaridade, Morin recorda etapas cruciais de sua vida, destaca os erros cometidos, a dificuldade de compreender o presente e a necessidade do exercício da autocrítica para a vida em sociedade.
A reportagem é publicada por RFI, 03-06-2021.
A edição do jornal Libération desta quinta-feira (3) publica trechos do livro de Morin. Diz que ele poderia ter escrito um ensaio para se glorificar ou uma obra repleta de conselhos para os jovens incultos de hoje. Mas, não. Morin preferiu sublinhar seus equívocos e oferecer uma boa perspectiva sobre sua abordagem transdisciplinar e humanista, expondo suas principais obsessões, que ele chama de "lições" sobre si mesmo.
"O avô de todos os franceses tem um sonho secreto: quando não estiver mais vivo, Morin espera que as pessoas consigam se amar umas às outras e a si mesmas, em vez de continuar nessa regressão ocidental marcada por neototalitarismos em gestação, principalmente na China", ressalta o Libération.
No momento em que o mundo se fecha e a questão identitária divide vários povos, Morin reflete sobre suas próprias origens. O sociólogo se apresenta como francês nascido em Paris, em uma família de origem judaica serfadita, parcialmente italiano e espanhol, definitivamente mediterrâneo, europeu do ponto de vista cultural, um cidadão do mundo e filho do planeta Terra. Mas é possível ser tudo isso ao mesmo tempo, se interroga Edgar Morin. "Não, tudo vai depender das circunstâncias e dos momentos em que uma ou outra dessas identidades venha se manifestar de forma predominante", escreve.
Numa época em que a tentação de se isolar está aumentando, ele lembra, com seu universalismo, como é difícil definir um ser humano. “Todo mundo tem a identidade de sua família, de sua aldeia ou cidade, a de sua província ou etnia, a de seu país e a maior, de seu continente. Cada um tem uma identidade complexa, ou seja, somos únicos e ao mesmo tempo plurais".
Segundo Morin, uma das grandes lições de sua vida foi deixar de acreditar na sustentabilidade do presente, na continuidade e na previsibilidade do futuro. Para o pensador, "a história humana é relativamente inteligível a posteriori, mas sempre imprevisível a priori”, como demonstraram a crise de 1929, a ascensão de Hitler e do nazismo na Alemanha, a desintegração da ex-União Soviética e o ataque às torres gêmeas do World Trade Center em Nova York. Diante dessa imprecisão do tempo presente, é fácil cometer erros políticos, adverte.
No livro, Morin identifica dois momentos de grande equívoco em sua trajetória política e intelectual. Seu pacifismo antes da Segunda Guerra Mundial, que o impediu de ver a verdadeira natureza do nazismo. Por muito tempo, ele afirma ter ficado esperando que a Alemanha, "o país mais culto da Europa", eventualmente retornasse à razão. Outro erro foi sua viagem ao que ele chama de "Stalinia" e sua longa crença no sistema soviético. "Minha estadia de seis anos no universo stalinista me educou sobre os poderes da ilusão, do erro e da mentira histórica”, acrescenta. Ele percebeu tardiamente como aquele sistema precisava de vassalos e dependia da opressão do outro para sobreviver.
"Por isso, me arrependo de meus erros e não me arrependo deles, pois eles me deram a experiência de viver em um universo de religiosos absolutistas que, como qualquer religião, tiveram seus santos, mártires e algozes”, assinala. Com a experiência de quem já experimentou a cegueira, ele sabe como é fácil se deixar levar, o que é uma boa advertência nesse momento de banalização do populismo.
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Prestes a completar 100 anos, Edgar Morin percorre os equívocos de sua vida em novo livro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU