17 Março 2021
Ontem tive a oportunidade de assistir novamente ao excelente filme "A teoria de tudo" que relata o encontro entre Stephen Hawking e Jane Wilde. Ele, o grande gênio da física cósmica, formulador da Teoria do Big Bang, segundo a qual o Universo começou de uma singularidade, ou seja, dito de uma forma simples, de um marco zero do espaço-tempo, a partir das conclusões da Teoria Geral da Relatividade, de Albert Einstein. Por sua vez, Jane, uma jovem mulher de fé e caráter admiráveis, rocha fundamental no edifício existencial de vida do casal após o agravamento da raríssima doença degenerativa de Stephen que os conduziu ao fim do casamento, passados 30 anos de convivência, escreve Alexandre de Aragão de Alburquerque, arte-educador (UFPE), especialista em Democracia Participativa (UFMG) e mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE).
Contudo, as descobertas do infinitamente pequeno pelo cientista alemão Max Planck – o quantum – forçaram Hawking a rever os seus pressupostos astrofísicos do infinitamente grande, levando-o a refletir sobre o Princípio da Incerteza, formulado por outro cientista alemão, Werner Heisenberg, em 1926, contrariando a certeza determinística apregoada pela teoria da gravitação de Newton. Para o cientista francês Marquês de Laplace, no início do século XIX, o determinismo seria capaz até de governar todo comportamento humano. Todavia, com Heisenberg, o princípio da incerteza passa a ser uma propriedade fundamental e inevitável do mundo. Esse princípio marcou o fim do sonho de um mundo ideal, totalmente previsível e determinado.
Um dos pontos altos da semana passada foi a densa entrevista de um dos maiores quadros do Partido dos Trabalhadores, o ex-deputado federal José Genoíno ao jornalista Luís Nassif, no dia 11/03. Um ponto luminoso. Destaca-se o trecho no qual o entrevistado reflete sobre lições obtidas a partir de ilusões sofridas ao longo de sua militância.
A primeira lição situa-se na compreensão de que a democracia não é algo dado, como se uma vez alcançada não se precisaria mais lutar pela sua manutenção e avanço. Pelo contrário, por ser um sistema que privilegia a pluralidade de pensamento e a diversidade cultural, a democracia dá valor à imprevisibilidade dos encontros entre contraditórios, cabendo justamente à ação política civilizar os conflitos no âmbito da esfera pública por meio de regras e valores capazes de produzir sínteses racionais, justas e responsáveis.
Sua segunda lição é retirada da ilusão de que a elite capitalista e suas frações de classe seriam democráticas, ou seja, teriam naturalmente uma abertura para uma redistribuição de renda e riqueza. Ledo engano. Só há redistribuição de renda e riqueza por meio da contínua luta social e política, pela conquista e garantia de direitos.
A terceira arapuca resultou da ilusão de que a grande mídia corporativa, encabeçada pela Rede Globo, desempenharia um jornalismo correto e fiel à verdade dos fatos. Mas diante do ocorrido com a manipulação da verdade e condenação pública e prévia de biografias inocentes, desde o período do Mensalão até o esterco da Lava Jato, a lição assimilada por ele é da necessidade de um confronto direto com esse sistema corporativo midiático, seja por um amplo fortalecimento de diversos canais de comunicação social via blogs, sites, rádios comunitárias etc., como também por uma legislação que garanta direitos de resposta imediata aos cidadãos, no exato tempo usado por eventuais acusações levianas e mentirosas por parte desses grupos empresariais midiáticos.
Por fim, iludiu-se ao imaginar que militares teriam um compromisso nacionalista e democrático. Mas revendo a postura histórica das forças armadas brasileiras, concluiu que a esquerda não pode ter essa ilusão. Os militares brasileiros, em sua maioria, seguem a cartilha que rezam os Estados Unidos, agravada recentemente com a entrada das “teses” olavistas nos quartéis. Conforme Genoíno, o Golpe de 2016, articulado por Villa Boas e demais generais, demonstra, a exemplo de 1964, cabalmente uma submissão ideológica e pragmática desse segmento aos ditames estadunidenses. Portanto, é preciso uma clara redefinição garantidora do papel das Forças Armadas como instrumento de defesa externa e não de política. A política cabe aos políticos. Todos os militares que por ventura queiram ingressar na política precisam em primeiro lugar deixar a farda, em seguida fazer uma quarentena, para somente depois filiarem-se a um partido político e partir para a disputa pelo voto popular.
Fato simbólico recente do poder intimidador da Arma, em 2018, foi o do twitter do general Villas Bôas ameaçando o Supremo Tribunal Federal (STF) pela rejeição do Habeas Corpus impetrado pela defesa do Presidente Lula. Outro episódio não menos importante, divulgado de forma muito discreta pela imprensa corporativa, trata-se do acolhimento por Dias Tofolli do nome indicado pelo general Villas Bôas para fazer parte da assessoria da presidência daquela Corte. O indicado foi o general Fernando Azevedo e Silva, com vínculos estreitos com Mourão e Bolsonaro, configurando a presença militar no Supremo. Após eleito, Jair Bolsonaro confirmou o nome de Azevedo para o cargo de Ministro da Defesa. Quem o substituiu na assessoria do STF foi outro general, Joaquim Silva e Luna.
A semana passada demarcou uma singularidade. A democracia do Brasil começou a ter um novo início, um Big Bang, a partir da devolução dos direitos políticos do Presidente Lula, retirados de forma tirânica e ilegal pelo sistema de justiça brasileiro, desde a 13ª Vara Federal de Curitiba, sob o comando de Moro (codinome Russo), passando pelo TRF-4 e chegando às instâncias superiores. Mesmo com um monstruoso atraso de inexplicáveis 05 anos, na segunda-feira 08 de março, o ministro Edson Fachin sentenciou pela incompetência da Vara de Curitiba em julgar os processos imputados ao Presidente Lula. No dia seguinte, os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski professaram dois contundentes votos pela suspeição do ex-juiz Moro (codinome Russo) em toda a sua atuação criminosa à frente da Lava Jato. No dia 10, quarta-feira, o Presidente Lula chancelou em um discurso histórico de 03 horas de duração a retomada do caminho de nossa democracia. E na quinta-feira, o nobre advogado Cristiano Zanin, entrevistado pelo jornalista Juca Kfouri (TVT), e o ex-deputado federal José Genoíno, em conversa com Luís Nassif (GGN), selaram magistralmente a forma e o conteúdo desse Big Bang. Mas o Fantástico, da Rede Globo, do dia 14, nada noticiou sobre esse evento singular de nossa democracia. Omitiu rigorosamente TUDO. Engoliu os fatos em seu buraco negro editorial.
É importante deixar bem registrado que em 06 de março de 2016, na semana em que tiranicamente o Presidente Lula foi conduzido de forma coercitiva para depoimento em Congonhas, o programa jornalístico Fantástico dedicou 13 (treze minutos) sobre aqueles fatos, segundo sua perspectiva empresarial golpista. E no programa do dia 08 de abril de 2018, um dia após a prisão ilegal do Presidente Lula, foram 17 minutos e 27 segundos dedicados à narrativa condenatória do eminente líder político brasileiro. Mas ontem, 15/03/2021, o Fantástico escondeu tudo da opinião pública, particularmente dos seus fiéis telespectadores, os importantíssimos fatos ocorridos para a democracia brasileira. Cafajestismo jornalístico, cachorrismo editorial, mau-caratismo ético, desrespeito com o público.
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O buraco negro do Fantástico. Artigo de Alexandre Aragão de Alburqueque - Instituto Humanitas Unisinos - IHU