18 Janeiro 2021
Conselheiro científico recém-nomeado pelo papa afirma que a pandemia do coronavírus forçou os líderes mundiais a enfrentar o “risco existencial” da crise climática.
A reportagem é de Karen McVeigh, publicada por The Guardian, 15-01-2021. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O professor Ottmar Edenhofer disse que os países ricos têm agora o dever moral de compensar os países pobres que já sofrem os impactos.
Edenhofer, diretor do instituto de pesquisa climática MCC em Berlim e do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto Climático, foi nomeado para fornecer consultoria científica à agência vaticana com foco na justiça para os refugiados, os pobres e os apátridas.
Sua nomeação segue a declaração do Papa Francisco de 2019 de uma “emergência climática” e de que não agir contra ela seria um “ato brutal de injustiça” para com os pobres e as gerações futuras. Edenhofer disse ao The Guardian que espera que a sua contribuição ajude a impulsionar as ações dos governos.
“Os extremos climáticos desencadeados pela desestabilização do nosso clima já estão impulsionando movimentos de migração em todo o mundo”, disse ele. “As secas podem fazer com que os conflitos latentes aumentem violentamente e as quebras de safra podem elevar os preços dos alimentos. Infelizmente, se o planeta continuar se aquecendo, a migração e os conflitos provavelmente aumentarão ainda mais.”
“A questão climática é fundamentalmente também uma questão de justiça. Portanto, é uma grande honra e responsabilidade fornecer aconselhamento científico à Santa Sé sobre essas importantes questões.”
Questionado sobre como os negacionistas do clima como Donald Trump e o brasileiro Jair Bolsonaro poderiam ser persuadidos a mudar, Edenhofer disse: “Acho que é impossível convencer Donald Trump. Mas outros líderes como Joe Biden e também a China estão convencidos. A China tem plena consciência de que sofrerá os impactos das mudanças climáticas no abastecimento de água, o que causará problemas enormes.”
“Proteger os cidadãos é um dos principais trabalhos dos governos, e estes não podem ignorar os riscos existenciais. Por causa da Covid, os líderes internacionais estão mais conscientes dos riscos de ‘cauda longa’, aqueles de baixa probabilidade, mas com potencial para grandes danos. E, nos países pobres, o impacto das mudanças climáticas não é uma possibilidade no futuro, mas já está sendo sentido hoje.”
Edenhofer disse que a mensagem contundente do papa sobre a crise foi importante não apenas para os católicos romanos, mas também para os cristãos evangélicos.
“Não podemos subestimar que o papa está falando basicamente por 1,3 bilhão de pessoas. Eu até diria que a mensagem que o papa envia ao mundo também é importante para os cristãos evangélicos, que têm um grande dificuldade até agora em reconhecer as mudanças climáticas como uma questão importante, porque a maioria deles vê isso como uma espécie de pauta de esquerda da Europa Ocidental. O papa deixa muito claro que não é uma questão partidária, mas é algo importante para o mundo inteiro.”
“Estou muito feliz que o papa e a Igreja Católica, como um ator global, tenham assumido a responsabilidade de cuidar dessa questão. A Igreja Católica representa um povo socialmente conservador, e é importante que a Igreja possa falar com essas pessoas.”
O economista, que foi copresidente do grupo de trabalho sobre mitigação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU de 2008 a 2015, também trabalhou com o cardeal Peter Turkson, de Gana, o homem por trás do apelo radical à ação contra as mudanças climáticas.
Seu papel, disse ele, era atualizar o Vaticano sobre os impactos científicos de tais mudanças no desenvolvimento humano.
“Justiça e paz para a migração sempre foi uma questão da Igreja Católica. Mas agora o cuidado com os bens comuns globais, incluindo leis de biodiversidade, mudanças climáticas, degradação da terra, fazem parte do desenvolvimento humano, e eu vejo isso como um passo muito, muito importante.”
Entre os temas para a discussão papal, disse ele, estarão os refugiados do clima e a compensação para os países mais pobres por parte dos países mais ricos, mais responsáveis pelas por emissões tóxicas.
“Eles [os países mais ricos] têm uma obrigação moral de reduzir as emissões e de alcançar a neutralização do carbono e, ao mesmo tempo, têm de compensar as pessoas nos países em desenvolvimento pelos danos climáticos. Não há dúvidas sobre isso.”
O Vaticano, que Edenhofer disse ter sido responsável por persuadir a Polônia a assinar o acordo climático de Paris, deve desempenhar um papel importante na cúpula do clima em Glasgow no fim deste ano.
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Conselheiro papal diz que Covid destacou o risco climático “existencial” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU