13 Janeiro 2021
Sindicalistas criticam postura da empresa, mas afirmam que decisão de sair do país reflete ausência de um projeto para a economia brasileira.
Assembleia em Camaçari na manhã desta terça: resultado de 'guerra fiscal', fábrica da Ford na Bahia completaria 20 anos em outubro. Foto: Divulgação/RBA
A reportagem é publicada por Rede Brasil Atual - RBA, 12-01-2021.
Então governador do Rio Grande do Sul, em 1999 Olívio Dutra considerou inaceitáveis os termos negociados por seu antecessor, Antônio Britto, para instalação de fábricas da Ford e da GM no estado. Ele considerava que as empresas se isentavam não só de impostos, mas de riscos, que ficavam todos com o governo. Com a GM, houve acordo, e a montadora inaugurou a fábrica de Gravataí em 20 de julho de 2000.
Já a Ford rumou do Sul para o Nordeste, atraído por um mar de incentivos – incluindo uma medida provisória do então presidente Fernando Henrique Cardoso – e montou fábrica em Camaçari, na região metropolitana de Salvador. Os 20 anos da unidade seriam comemorados no próximo 12 de outubro. Mas a empresa, que em 2019 já havia fechado a fábrica de São Bernardo, anunciou ontem o fim de sua produção no Brasil. Hoje pela manhã, o Sindicato dos Metalúrgicos de Camaçari realizou assembleia para discutir o que fazer diante dessa decisão. Tentar resistir ou negociar uma “indenização justa”.
Nota de protesto divulgada pela CTB e pela Federação Interestadual de Metalúrgicos e Metalúrgicas do Brasil (Fitmetal) faz referência a esse processo de incentivos, de difícil mensuração. “As justificativas usadas pela direção da Ford não levam em conta os bilionários recursos que a montadora recebeu, na forma de renúncia fiscal, em especial no complexo de Camaçari”, afirmam as entidades. “Ainda que governos como os de Michel Temer e Jair Bolsonaro não tenham investido à altura na indústria, levantamento da Receita Federal estima que os incentivos para a Ford, entre 1999 e 2020, foram de aproximadamente R$ 20 bilhões”, acrescentam.
Segundo os dirigentes, além dos trabalhadores, “os mais afetados com a acelerada desindustrialização do País”, uma saída para crises como essa precisa envolver poder público (instâncias federal, estadual e municipal) e empresários de diversos setores. Ainda ontem, o governo da Bahia anunciou a formação de um grupo de trabalho para discutir o futuro da fábrica de Camaçari e a manutenção dos empregos, que podem chegar a 12 mil, entre diretos e os chamados sistemistas. Ou a até 50 mil, considerando a cadeia produtiva.
Para o IndustriALL Brasil, formado por sindicatos da CUT e da Força Sindical, a ação da Ford “é conseqüência da completa ausência de um projeto de retomada da economia brasileira, que contemple a reindustrialização do país”. Se é verdade que por um lado a empresa se beneficiou e agora “foge” do Brasil, por outro o “governo despreparado e inepto de Bolsonaro e Guedes finge ignorar a importância da indústria como motor do desenvolvimento nacional, não apresenta qualquer estratégia para a atuação do setor no Brasil e condena o país a uma rota de desindustrialização e desinvestimento, como vínhamos alertando há tempos”.
A entidade lembra que os sindicatos não só alertaram, como apresentaram propostas, caso do Inovar-Auto. “É incontestável a desconfiança interna e internacional e o descrédito quanto aos rumos da economia brasileira com este governo que aí está; não se toma uma decisão empresarial como essa sem considerar a total incapacidade do governo Bolsonaro”, afirmam, em nota, dirigentes da CUT e da Força (leia íntegra no final do texto).
“No momento em que a indústria automobilística global passa por uma das mais intensas ondas de transformação, orientada pela eletrificação e pela conectividade, assistimos à criminosa omissão, e até boicote, do subserviente governo brasileiro à indústria, com consequências nefastas para a classe trabalhadora, ante um presidente incapaz de conduzir qualquer diálogo sobre a inserção do país no cenário que se configura rapidamente.”
“É lamentável que Bolsonaro, em especial, se cale e se omita diante de mais um retrocesso para a indústria brasileira. Mas, infelizmente, é cada vez menos surpreendente que uma empresa do porte da Ford prefira manter seus negócios em países de economia de menor porte, como a Argentina e o Uruguai, transferido para lá empregos qualificados e decentes”, afirmam, por sua vez, os presidentes da CTB, Adilson Araújo, e da FitMetal, Marcelino da Rocha.
Para o presidente da UGT, Ricardo Patah, uma “mistura de ignorância e obscurantismo” tornou o Brasil um “pária” mundial. “Pelo menos 5 mil pessoas vão perder o emprego. Mas o desastre econômico é muito maior. A centenária empresa – que nos últimos cinco anos pegou R$ 7,5 bilhões em subsídios, segundo o governo – vai prejudicar o comércio, em geral, e os usuários de seus produtos”, afirmou.
“Os estados atingidos – São Paulo, Bahia e Ceará – não terão força para fazer nada”, acrescenta o sindicalista. “A tragédia social no Brasil vai aumentar, com mais desemprego e o crescimento da informalidade. O caos social virá com o fim do auxílio emergencial, já valendo a partir deste mês.”
Confira a nota da IndustriALL.
Ford foge do Brasil e de Bolsonaro e deixa rastro de desemprego
BRASIL SEM RUMO, SEM INDÚSTRIA, SEM EMPREGO, SEM GOVERNO, SEM FUTURO
O anuncio de fechamento de todas as fábricas da Ford no Brasil (a planta de SBC já havia sido fechada, em 2019) confirma as piores previsões e avisos do movimento sindical sobre os rumos da economia nacional. Novamente de forma unilateral, a Ford informa que irá encerrar suas atividades no país, com o fechamento das plantas de Camaçari-BA, Taubaté-SP e Horizonte-CE. A ação da empresa global é conseqüência da completa ausência de um projeto de retomada da economia brasileira, que contemple a reindustrialização do país.
O governo despreparado e inepto de Bolsonaro e Guedes finge ignorar a importância da indústria como motor do desenvolvimento nacional, não apresenta qualquer estratégia para a atuação da indústria no Brasil e condena o país a uma rota de desindustrialização e desinvestimento, como vínhamos alertando há tempos. Não só alertamos como fizemos propostas, como o Inovar-Auto.
É incontestável a desconfiança interna e internacional e o descrédito quanto aos rumos da economia brasileira com este governo que aí está; não se toma uma decisão empresarial como essa sem considerar a total incapacidade do governo Bolsonaro.
No momento em que a indústria automobilística global passa por uma das mais intensas ondas de transformação, orientada pela eletrificação e pela conectividade, assistimos à criminosa omissão, e até boicote, do subserviente governo brasileiro à indústria, com consequências nefastas para a classe trabalhadora, ante um presidente incapaz de conduzir qualquer diálogo sobre a inserção do país no cenário que se configura rapidamente.
A Ford “foge” do Brasil deixando um rastro de desemprego e desamparo, após ter se valido durante muitos anos de benefícios e isenções tributárias dos regimes automotivos vigentes desde 2001, e que definiram a instalação da empresa em Camaçari, bem como a permanência das suas atividades no Ceará.
A decisão da empresa significa cerca de 50 mil empregos na cadeia produtiva em torno das três plantas desativadas, mas a ausência de compromisso e respeito aos trabalhadores e à sociedade por parte da Ford não é surpresa.
A tragédia é ainda evidentemente maior considerando o conjunto de plantas fechadas ou com anúncio de fechamento desde 2019, e o impacto sobre os diferentes setores da indústria brasileira, que rebaixam nossa posição econômica no cenário global de forma acelerada e dramática.
O desgoverno afunda ainda mais nossa população no roteiro de precarização, desemprego, desalento e pobreza. O desastre na condução da economia se casa e se completa, tragicamente, com a crise sanitária.
Reverter esse descaminho é mais do que urgente. É nossa luta.
Toda solidariedade aos trabalhadores/as e famílias afetados.
Estamos juntos nessa luta!!!!!!!!
Aroaldo Oliveira da Silva, presidente da INDUSTRIALL Brasil
Paulo Cayres, presidente da CNM-CUT Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT
Miguel Torres, presidente da CNTM-Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos da Forca Sindical e da Força
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Ford ‘foge’ do Brasil após se beneficiar, mas decisão também mostra ‘total incapacidade do governo’ - Instituto Humanitas Unisinos - IHU