01 Dezembro 2020
Aumento de candidaturas reflete busca de comunidades por mais representatividade e protagonismo, afirma deputada Joênia Wapichana.
A reportagem é de Bryan Araújo, publicada por Instituto Socioambiental – ISA, 27-11-2020.
Roraima é o segundo estado da Região Norte e o quarto do Brasil com maior número de candidatos indígenas eleitos. No total, dois prefeitos, três vice-prefeitos e dez vereadores foram eleitos em pelo menos quatro municípios (saiba mais). Um marco histórico nas eleições municipais de 2020 para os povos indígenas no estado.
Uiramutã, um dos três municípios que abarcam a Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol, lidera o ranking, com seis vereadores indígenas eleitos — maioria das vagas no Legislativo local. O município também elegeu para a Prefeitura uma chapa 100% indígena: Tuxaua Benisio (Rede) e Professor Jeremias (PROS) venceram com 2.066 votos, o equivalente a 42,4% dos votos válidos.
Benisio é da etnia Macuxi, agricultor e liderança da comunidade Pedra Branca, na TI Raposa Serra do Sol. Foi indicado à Prefeitura por lideranças indígenas em uma assembleia regional, em novembro de 2019. O encontro contou com representantes das etnias Wapichana, Macuxi e Ingarikó.
“A campanha foi uma costura da política de malocão. A união de madeira, estacas e palha forma o malocão”, explicou. “Se não tivéssemos nos unidos, tenho certeza que teríamos perdido. Mas então, vendo essa forma de malocão, hoje temos o resultado”, completou.
No município de Bonfim, no Leste de Roraima, fronteira com a cidade de Lethem, na Guiana, Mário Nicácio (Rede), da etnia Wapichana, foi eleito vice-prefeito. Ele já foi coordenador do Conselho Indígena de Roraima (CIR) e atualmente é vice-coordenador da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). A chapa do candidato venceu com 66,8% dos votos válidos, o correspondente a 5.261 votos.
Mário Nicácio também também teve sua candidatura aprovada em assembleia das comunidades indígenas de Bonfim. Em seu discurso de vitória, ele relembrou sua trajetória política e agradeceu o apoio e incentivo que teve de importantes lideranças indígenas de Roraima.
“Zé Adalberto e o chefe Jairo Macuxi foram os grandes idealizadores da minha participação na política, que começou em 2014, quando disputei o cargo de deputado federal. Era nosso sonho ter indígena eleito. Perdi seu Jairo em 2015, foi muito difícil, mas me mantive firme. Tentei em 2018 e novamente não deu certo, mas continuei com esperança. Perdi meu amigo Zé para o Covid-19, mas busquei forças para continuar nessa luta. Em 2020 chegou, fui eleito. Dedico essa vitória a esses mestres que, com certeza, em qualquer lugar que estejam, aplaudem a vitória indígena”, contou.
Durante toda a campanha, Tuxaua Benísio e Mário Nicácio contaram com apoio da deputada federal Joênia Wapichana (Rede), que foi a reuniões e esteve em momentos importantes do pleito em Uiramutã e Bonfim. Primeira mulher indígena eleita à Câmara dos Deputados nas eleições de 2018, Joenia avaliou positivamente o resultado das eleições no primeiro turno.
Assim como em Uiramutã, Normandia também elegeu candidatos aprovados em assembleias indígenas, comentou ela. Dr Raposo (PSD) foi eleito no município com 1.463 ou 24,3% do total de votos válidos. “Acredito que, nessas regiões, nesses municípios, as comunidades indígenas saíram vitoriosas”, analisou.
Segundo a parlamentar, o aumento de candidatos indígenas para o Legislativo e Executivo era uma demanda das comunidades por mais representatividade e protagonismo, inclusive na política partidária.
“Esse é um processo de resistência. Chamaria até de um processo de descolonização de vários preceitos que o sistema criou para tentar dizer que os indígenas eram incapazes, tutelados e excluídos. Mas nós avançamos em certas áreas de representações e protagonismo sem esquecer nossa identidade indígena e nossas raízes”, explicou.
O coordenador-geral do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Enock Taurepang, concorda que a alta no número de candidatos autodeclarados indígenas nas eleições municipais deste ano é mais um resultado das conquistas do movimento dos povos indígenas no Estado.
“Se as pessoas estão se autodeclarando como indígenas é porque elas têm orgulho de sua origem e isso significa muito para um estado preconceituoso como Roraima. Isso mostra que não temos medo do preconceito e estamos enfrentando ele frente a frente”, declarou.
Ainda segundo ele, a eleição de Joenia Wapichana serviu como exemplo para mostrar que os povos indígenas também conseguem ocupar um espaço na política partidária. “Esperamos que esse percentual aumente ainda mais nas próximas eleições. Temos nos organizado e visto a demanda e o querer das lideranças em se apropriar desses espaços que também são nossos”, afirmou.
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Movimento indígena elege 15 candidatos em Roraima - Instituto Humanitas Unisinos - IHU