Por: André Martins | 10 Setembro 2020
A destruição da floresta amazônica segue em ritmo acelerado desde a chegada de Bolsonaro ao poder. Duas atividades centrais do plano econômico do governo, a mineração e o agronegócio, têm contribuído para esse fenômeno. Mineradores, agricultores e grileiros têm tido “liberdade” para desmatar a floresta amazônica ilegalmente, causando enormes impactos ambientais.
A reportagem é de André Martins, estagiário do Curso de Jornalismo da Unisinos.
As ilegalidades recorrentes na floresta e as atitudes negativas do governo em conter de alguma maneira essas atividades têm aberto os olhos não só de ativistas, comunidades indígenas interessadas em defender a floresta, mas também de grandes países. 600 cientistas europeus pediram que a União Europeia aproveite negociações comerciais com o Brasil para pressionar Bolsonaro e reforçar a luta contra o desmatamento.
Dados de satélites mostram que a taxa de desmatamento da Amazônia cresceu 34% nos últimos 12 meses em comparação com o mesmo período do ano anterior, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Os dados ainda indicam que o desmatamento ilegal na Amazônia é altíssimo, a ponto de que os desmatamentos legais sejam a exceção da regra.
O agronegócio é peça chave para o desmatamento ilegal e é visto também como o grande vilão da Amazônia. Em 2019, 36% dos focos de incêndio na floresta foram causados por manejo agropecuário, seguidos de 34% de áreas recém-desmatadas e 30% de incêndios florestais, explica a gestora ambiental Cristiane Mazzetti, da Campanha Amazônia do Greenpeace. O incêndio, aliás, é um dos meios mais utilizados pelos agricultores na devastação da floresta, além da utilização de grandes tratores para derrubar árvores maiores. Os criminosos também usam o fogo, que pode limpar totalmente a área, se alastrar e atingir outras partes da floresta, onde árvores morrem e emitem carbono, causando um desequilíbrio na biodiversidade.
Entre todas as atividades que causam desmatamento, a agropecuária certamente é a mais desnecessária, menos rentável e a mais arriscada. Em reportagem publicada no site do IHU, o agrônomo Gerd Sparovek, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, e coordenador do Laboratório de Planejamento de Uso do Solo e Conservação (Geolab), afirma que no Brasil existem “áreas abertas suficientes para atender à demanda esperada de produtos agropecuários do país pelos próximos 50 anos, pelo menos”. Porém, o Brasil é responsável pela perda de 1/3 das florestas do mundo todo, segundo um relatório do Global Forest Watch (GFW). Os dados mostram que o desmatamento ocorre desde para fins de agricultura até os incêndios nas matas para exploração de madeira.
“Hoje o Brasil é muito ligado ao desmatamento e isso afeta a imagem do País como um todo. Como o agronegócio é fortemente exportador, ele também é afetado negativamente em sua imagem”, diz o pesquisador Marcos Fava Neves, professor titular do Departamento de Administração da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP, especialista em agronegócio, em reportagem publicada na página do IHU.
O garimpo é um problema tão sério quanto o agronegócio na devastação da Amazônia. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), durante a pandemia, 73% da atividade irregular de garimpo foi realizada em locais que deveriam ser protegidos (unidades de conservação e terras indígenas). Cerca de 1.925,8 hectares da terra yanomami já foram degradadas pelo garimpo ilegal. Segundo Carol Marçal, da campanha Amazônia do Greenpeace Brasil, em reportagem publicada no site do IHU, os garimpeiros, além de destruírem as terras dos índios, podem, durante a pandemia, transmitir a COVID-19 para a comunidade indígena, causando uma maior catástrofe na região. “O garimpo é um determinante vetor de destruição de áreas que, por lei, deveriam ser de proteção da floresta e de seus povos na Amazônia. Considerando que os garimpeiros são potenciais transmissores da Covid-19 para os indígenas, se medidas urgentes não forem tomadas, a realidade será catastrófica na região”, afirma.
Apesar do crescente desmatamento em terras indígenas, Nurit Bensusan, especialista da ONG Instituto Socioambiental (ISA), disse, em entrevista à IHU On-Line, que os índios são os grandes protetores da floresta amazônica. “Eles conservam a integridade das terras em que vivem e tentam, e frequentemente conseguem, evitar que entrem madeireiros, garimpeiros, grileiros... e, como sabemos que a maior ameaça às espécies é a deterioração de seu meio ambiente, o papel que desempenham é crucial”, relata. Nurit afirma também que as áreas que não são protegidas por povos indígenas sofrem mais desmatamento.
A pandemia também vem afetando o preço do ouro que atingiu o valor mais alto dos últimos 30 anos. Segundo o Greenpeace, o índice oficial de exportação de minério na região do Pará aumentou 418,5% entre janeiro e julho. Entidades afirmam que o preço do ouro é um dos fatores que fez aumentar o garimpo ilegal na região. O estado do Pará concentra 91% de toda a área desmatada por garimpo na Amazônia.
Ao que tudo indica, o governo Bolsonaro não se mostra preocupado com o aumento do número de garimpos ilegais em reservas, na medida em que o ministro Paulo Guedes assinou a flexibilização do licenciamento ambiental para projetos de mineração. Além disso, ele acena positivamente para a criação da Política de Apoio ao Licenciamento Ambiental para a produção de minerais estratégicos – Pró-Mineral Estratégicos, que visa articular ações entre órgãos públicos no sentido de priorizar os esforços do governo para implantar projetos de produção de minerais para o desenvolvimento do país, no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI).
A Igreja tem uma importante voz no combate dos desmatamentos ilegais em terras indígenas que ocorrem na Amazônia, como o sistema de Informação da Realidade Eclesial da Pan-Amazônia (SIREPAM), criado pela Rede Eclesial Pan-Amazônia (Repam), que serve para potencializar denúncias da situação enfrentada pelos povos indígenas na Amazônia e mapear a região da floresta. Em entrevista publicada na página do IHU, Susana Soto, secretária executiva da REPAM-Brasil, afirma que “conhecer o ser e estar na Amazônia como Igreja favorece uma ação pastoral conjunta desde os gritos do território”. Segundo ela, o Papa Francisco tem importante papel na proteção da Amazônia. “Ele fez ecoar os gritos da Amazônia e de seus povos para todo o mundo”, diz.
O padre Dário Bossi, coordenador do Rede Igrejas e Mineração, também é uma importante voz no trabalho em defesa da Amazônia e comenta, em entrevista dada à IHU On-Line, que a Rede busca responder aos desafios dos impactos e violações dos direitos socioambientais provocados pelas atividades mineiras. “Frente ao grande conflito, você pode escolher onde se colocar: junto à empresa, em posição neutra ou ao lado das vítimas. Esse último é, em nossa opinião, onde a Igreja deve estar. Isso não significa ignorar o diálogo, mas devemos interpretar o problema da mineração a partir do ponto de vista das vítimas, que são as comunidades, mas também é a Mãe Terra que, como diz o Papa Francisco, é talvez a vítima maior nessas situações”, assegura.
Para continuar dando visibilidade às comunidades que vivem na Amazônia, o Instituto Humanitas Unisinos – IHU promove a palestra “Amazônia. A devastação da floresta pelo agronegócio e mineração”, com o intuito de promover o debate sobre o difícil momento passado na região, considerando o grande aumento de desmatamento das áreas e o descaso do governo com a situação. Participam do debate a Profa. Dra. Nurit Bensusan e o Pe. Dário Bossi. A atividade ocorre nesta quinta-feira, 10-09-2020, às 17h30, de forma on-line pela plataforma Teams, e também será transmitida ao vivo pelo YouTube. Clique aqui para obter mais informações.
Imagem: IHU
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A Amazônia nas mãos do agronegócio e do garimpo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU