14 Julho 2020
“A convergência descolonizadora entre Palestina e Wallmapu, mais que uma opção, é uma necessidade no Chile, pois são processos que devem ser sempre articulados a partir de uma perspectiva focada no respeito aos Direitos Humanos e também aos Direitos da Mãe Terra, já que nos dois casos o etnocídio e o terricídio estão presentes historicamente”, escreve Andrés Kogan Valderrama, sociólogo, em artigo publicado por OPLAS, 10-07-2020. A tradução é do Cepat.
Na medida em que cresce a rejeição internacional devido à eventual anexação de 30% da Cisjordânia pelo Estado de Israel, através de resoluções de diferentes governos do mundo e de diferentes organizações da sociedade civil, condenando o aprofundamento de uma política colonial de assentamentos na Palestina, é surpreendente que o Senado do Chile também tenha se somado, considerando o desprezo total que o Estado chileno tem tido historicamente com o povo mapuche.
Um desprezo total do Estado do Chile em relação a diferentes povos indígenas, entre eles o mapuche, evidenciado pela ausência de qualquer tipo de reconhecimento constitucional de sua existência. Em outras palavras, em termos concretos, isso nos torna um país profundamente racista institucionalmente, o que deve nos deixar muito mal posicionados diante da chamada comunidade internacional, assim como Israel.
Por isso, é impressionante, portanto, que senadores da direita pinochetista do Chile, como Iván Moreira, Jacqueline Van Rysselberghe e Ena Von Baer tenham assinado, por um lado, uma resolução exigindo sanções concretas do governo de Sebastián Piñera ao Estado de Israel, mas que, ao mesmo tempo, sejam negacionistas fervorosos da colonização do território mapuche, em Wallmapu.
Uma colonização do Estado do Chile que, com a ocupação de Wallmampu, mal denominada “pacificação de Araucanía” (1881-1883), concretizou um genocídio que custou a vida de 50.000 a 70.000 pessoas mapuche, e foi o início de um processo de apropriação de terras muito semelhante ao feito pelo Estado de Israel com a Nakba, uma vez que nos dois casos inferiorizaram e negaram a essas pessoas sua condição de seres humanos.
Isso somou o processo extrativo de ambos os casos, sendo que tanto na Palestina como em Wallmapu houve uma apropriação de bens comuns, como a água, pelos dois Estados, como aconteceu com a empresa israelense de água Mekorot, no território palestino ocupado, e também com o negócio florestal no Chile, pelos grupos econômicos Angelini (Celulosa Arauco) e Matte (Celulosa CMPC).
Pode-se dizer que a condenação de Israel por parte dos parlamentares chilenos de direita corresponde ao fato de que o Chile é o país com a maior população de origem palestina fora do mundo árabe (500.000 pessoas), mas não se entende seu apoio quando foi o próprio Estado de Israel que vendeu armas ao governo de Augusto Pinochet para assassinar milhares de pessoas, durante a ditadura, e que continuou a recebê-las e usá-las democraticamente para militarizar Wallmapu.
Uma situação semelhante de comunicadores e megaempresários de origem palestina no Chile, como são os casos de Sergio “Checho” Hirane (apresentador da Rádio Agricultura) e de Álvaro Sahie (proprietário da Copesa), que se somaram à condenação de Israel, enquanto nos meios de comunicação concentrados dos quais fazem parte, dedicam-se a estigmatizar, criminalizar e construir a ideia de um mapuche terrorista.
Por último, o caso mais notável e grave de todos é do sacerdote católico de origem palestina Raúl Hasbún, conhecido publicamente por seu apoio direto e incondicional à ditadura de Pinochet, sendo cúmplice direto de crimes contra a humanidade, mas que também se somou à condenação do Estado de Israel, mostrando uma total inconsistência do ponto de vista dos Direitos Humanos.
Portanto, torna-se evidente que as críticas de todos eles corresponde meramente a uma demanda nacionalista pela causa palestina, a partir das mesmas bases coloniais do Estado de Israel. Em outras palavras, todos eles se situam a partir de um nacionalismo moderno monocultural e estadocêntrico, que apenas procura negar o diferente e a pluralidade de maneiras de ver o mundo, do mesmo modo que faz o sionismo.
E é por isso que a convergência descolonizadora entre Palestina e Wallmapu, mais que uma opção, é uma necessidade no Chile, pois são processos que devem ser sempre articulados a partir de uma perspectiva focada no respeito aos Direitos Humanos e também aos Direitos da Mãe Terra, já que nos dois casos o etnocídio e o terricídio estão presentes historicamente.
Felizmente, existe um tremendo trabalho de pensamento crítico, tanto palestino como mapuche, que nos dão luzes de como abordar os dois processos. As contribuições de pessoas como Rodrigo Karmy, Lina Meruane, Kamal Cumsille, Mauricio Amar, Daniela Catrileo, Moira Millan, Sergio Caniuqueo, Claudio Alvarado Lincopi e Fernando Pairican são apenas alguns nomes de olhares entrelaçados por seu caráter anticolonial, antipatriarcal e anticapitalista, muito necessários para o mundo nestes tempos de crise civilizatória.
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Palestina e Wallmapu: uma luta comum pelo território - Instituto Humanitas Unisinos - IHU