10 Junho 2020
Diante da paralisia da instituição eclesial, é legítimo perguntar-se quais são as prioridades do Comité de la Jupe: pressionar a instituição, batendo às portas dos bispados? Envolver-se em uma reflexão de natureza mais espiritual? Ou ambos? Françoise Caclin abre o debate, explicando suas escolhas.
O artigo é de Françoise Caclin, publicado por Comité de la Jupe, 07-06-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eu fui educada na religião católica. A Igreja me transmitiu uma espiritualidade e uma palavra que me nutriam e a que sempre volto com grande prazer. Como algumas mães, a Igreja Católica também tem seu lado negativo e devo dizer que derramei lágrimas de raiva batendo contra a sua mediocridade e, vamos dizê-lo, contra seus crimes. Quanto tempo levará para a Igreja aceitar que as mulheres tenham o mesmo papel dos homens na instituição? Para que acolha sem discriminação os homossexuais, os divorciados e todos os outros que não têm seus documentos de bons católicos? 50 anos, 100 anos, 1000 anos? Em última análise, isso não importa.
Pouco importa, porque hoje temos apenas 10 anos para fazer frente a uma necessidade realmente urgente de sobrevivência. Os cenários dos pesquisadores indicam que é inevitável o aquecimento da temperatura média do globo em 2°C devido ao acúmulo de gases de efeito estufa na atmosfera. Se nada for feito nos próximos 10 anos, não teremos apenas um aumento de 2°C, mas de 5°C, se não mais. Um aumento de 5° não significa que usaremos camisetas por mais dois meses por ano, e os blusões por dois meses a menos.
Um aumento de 5° significa: aumento do nível do mar que causará centenas de milhões de refugiados, áreas inteiras do sudeste da Ásia, atualmente muito povoadas, totalmente inabitáveis, a multiplicação de fenômenos climáticos extremos, furacões, ondas de calor, secas em algumas áreas, inundações violentas em outras; temperaturas de 45° e mais no verão nas nossas latitudes. Todos ficaremos confinados durante todo o verão, não por causa do vírus, mas por causa do calor.
A isso soma-se o fato de que nossas sociedades modernas se tornam menos resistentes devido à destruição dos ecossistemas. A epidemia de Covid-19 não se deve às tradições culinárias e folclóricas chinesas, mas à destruição do habitat natural do vírus, os animais silvestres. Esse já havia sido o caso do HIV, do Ebola e haverá outros. E que agricultura será possível quando não houver mais insetos para garantir a polinização, nem microrganismos no solo para garantir sua fertilidade? O colapso da biodiversidade é um problema pelo menos tão sério quanto o aquecimento climático e também põe em risco nossa sobrevivência. E esses não são problemas que podemos deixar para as gerações futuras, pedindo-lhes que nos perdoem. Quando as gerações futuras estarão diante das consequências de nossas ações, será tarde demais para agir.
Assim, em 15 a 20 anos, quando meus netos me perguntarem o que eu fiz, não creio que eles vão querer saber por que desisti de lutar pelo acesso das mulheres a cargos de responsabilidade na Igreja. O que eles vão me perguntar será: vó, como era a primavera? O que é uma abelha?
Nós somos a primeira geração que sabe. Nós somos a última geração que pode agir. Prefiro transmitir aos meus netos um planeta habitável e uma igreja onde é impossível viver do que o contrário. Porque em um planeta habitável, haverá a possibilidade de reformar a Igreja. Mas não o contrário.
Mas, vocês me dirão, precisamos de espiritualidade. Sim, mil vezes sim, a espiritualidade faz parte da solução. A espiritualidade nos une em um objetivo comum, positivo para nós mesmos, para nossos irmãos e nossas irmãs humanos, próximos e distantes, e para o planeta. A espiritualidade, e mais ainda a espiritualidade feminina, nos nutrirá e nos acompanhará nas necessárias e profundas transformações sociais que devemos enfrentar agora.
É por isso que convido vocês a deixar de lado as críticas, as reclamações e as reivindicações contra uma Igreja de respiração curta. Vocês querem um ambiente inclusivo, acolhedor e aberto a todos? Construam. Vocês têm os talentos necessários, o saber, o carisma, a criatividade. Celebrem, meditem, ensinem, orem, vocês precisam de padres para fazer isso? Deem-nos a alegria, a esperança, o amor e a sabedoria para ter força para fazer um mundo melhor.
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Por que não é mais a minha luta. Num planeta habitável, haverá a possibilidade de reformar a Igreja. Mas não o contrário - Instituto Humanitas Unisinos - IHU