09 Novembro 2019
“Para evitar ser rotulados como alarmistas ou partidaristas, os cientistas tendem a endossar posições de consenso que são inevitavelmente o denominador comum entre diagnósticos distintos da crise. Esse consenso acaba subestimando a gravidade da situação”, escreve César Rodríguez Garavito, advogado e sociólogo colombiano, defensor dos direitos humanos, em artigo publicado por El Espectador, 08-11-2019. A tradução é do Cepat.
Alguns leitores me perguntaram por que estou insistindo na crise climática nesta coluna. Agradeço a observação e, no momento, tenho duas respostas.
A primeira é que o aquecimento global não é um problema como outro qualquer. É o problema que envolve todos os demais. Como David Wallace-Wells escreveu em A terra inabitável, “a mudança climática não é mais um desafio para um planeta que já sofre guerras, desigualdades indecentes e muitas outras. É o cenário em que todos esses desafios devem ser enfrentados - uma esfera total que literalmente contém todos os problemas futuros e todas as soluções possíveis para eles”.
Isso não significa que esses outros desafios não sejam importantes e urgentes. Mas, as manifestações recentes da crise climática - os incêndios na Amazônia e na Califórnia, os furacões mais frequentes e vorazes do Caribe, a migração massiva de camponeses arruinados pelo aumento da temperatura na América Central – tornam presente que aquilo que antes costumávamos chamar “ambiente” não é apenas o “meio” dos dramas humanos, mas uma parte integral deles, sem o qual não podem ser resolvidos. De tal modo que não é possível pensar a política, a economia, a cultura, os direitos e outras criações humanas sem levar em consideração suas condições de possibilidades climáticas e ecológica em geral.
A segunda razão para discutir sobre o assunto é que continua recebendo pouca atenção em comparação com a escalada e urgência do desafio. Apesar de projetos louváveis de meios de comunicação como The Guardian, a crise climática tende a ser abordada como um assunto a mais, confinado nas seções ambientais das notícias. Embora os especialistas se pronunciem em termos cada vez mais categóricos - como fizeram, esta semana, 11.000 pesquisadores que declararam a existência de uma emergência climática -, o tom dominante nos meios de comunicação e os relatórios científicos mais influentes tendem a ser muito mais complacentes do que exige a dimensão e a urgência do problema.
Há razões profissionais que explicam, mas não justificam, essa complacência. Para evitar ser rotulados como alarmistas ou partidaristas, os cientistas tendem a endossar posições de consenso que são inevitavelmente o denominador comum entre diagnósticos distintos da crise. Esse consenso acaba subestimando a gravidade da situação, como mostram os cientistas Dale Jamieson, Michael Oppenheimer e Naomi Oreskes, em um livro recente. Uma aversão profissional semelhante leva os jornalistas a escrever sobre os cenários menos catastróficos, em vez de se concentrar nos mais prováveis, como mostrou Wallace-Wells.
Enquanto a crise climática for tratada como um problema a mais, e os profissionais da ciência e da comunicação continuarem subestimando-a, será necessário escrever e falar o máximo possível sobre ela. A isso estarei dedicado.
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A crise climática é mais grave e urgente do que dizem os meios de comunicação e os cientistas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU