13 Setembro 2019
Publicamos aqui o comentário do monge italiano Enzo Bianchi, fundador da Comunidade de Bose, sobre o Evangelho deste 24º Domingo do Tempo Comum, 15 de setembro (Lucas 15,1-32). A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A passagem evangélica deste domingo é muito longa: de fato, ela contém as três parábolas da misericórdia que Lucas reagrupa no 15º capítulo do seu evangelho. Já tendo comentado no tempo quaresmal (IV domingo) a parábola dos dois filhos (Lc 15,11-32), reflitamos hoje sobre as duas parábolas gêmeas proferidas por Jesus para justificar o seu comportamento criticado por escribas e fariseus.
Sim, porque Jesus, durante a sua viagem para Jerusalém, continua ensinando, registrando, porém, reações, contestações e, mais frequentemente, murmurações por parte daqueles que, professando-se religiosos e querendo ser guardiões da Lei, não conseguem aceitar o seu estilo e sentem o dever de recriminar contra ele.
Nós também, que nos dizemos discípulos e discípulas de Jesus, porém, podemos não acolher a boa notícia contida nessas parábolas. Talvez não contestemos o seu comportamento em relação aos pecadores, mas pensamos que o filho perdido e a ovelha perdida são os outros, os pecadores: não nós, que nos consideramos frágeis, sim, mas pecadores, realmente não!
Mas a boa notícia – como atesta Paulo – é que “Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores, dos quais eu sou o primeiro” (1Tm 1,15). Somos, talvez, como aqueles fariseus que viam o pecado grave apenas nos outros?
O contexto desse ensinamento de Jesus em parábolas é constituído pelos comportamentos em relação a ele, diante do seu agir e do seu pregar. Publicanos e pecadores se sentem atraídos por Jesus e vão ao seu encontro para escutá-lo, enquanto os pretensos justos, os observadores escrupulosos da Lei, denunciam com um certo desprezo: “Este homem acolhe os pecadores e come com eles!”.
O tema dessa contestação é significativo: a comunhão que se instaura à mesa, comendo juntos, compartilhando a mesma comida. Sobre esse assunto – não esqueçamos – a Igreja nascente pôs em jogo a sua fidelidade a Jesus, teve que escolher entre o que ele havia ensinado e o que vinha da venerável tradição: era preciso escolher se aceitava se aproximar de pessoas impuras e se deixar aproximar por elas até o ponto de ir à mesa delas e de acolhê-las na própria mesa, ou recusar a comunhão da mesa com homens e mulheres marcados pelo pecado ou pela impureza devida ao pertencimento aos gentios (gojim; cf. At 10).
Com maior razão, deviam ser evitados os pecadores manifestos, publicamente declarados como tais e conhecidos por todos, porque não era lícito estabelecer a comunhão entre puros e impuros, entre justos e pecadores, entre filhos de Israel e pagãos.
Nos Evangelhos, Jesus frequentemente está à mesa, convidado por amigos ou mesmo por fariseus e por pecadores, e ninguém jamais foi excluído da sua mesa. Comer juntos à mesa era para Jesus um evento repleto de significado, uma possibilidade fecunda de comunhão, de conversão, de reconciliação: a multiplicação dos pães no deserto mostra isso (cf. Lc 9,10-17 e par.), sinal profético de um banquete nupcial ao qual todos serão chamados e ninguém será excluído. Jesus quer ir ao encontro dos pecadores lá onde eles estão e deixar que os pecadores o alcancem onde ele está, porque estava consciente de que a sua santidade, ao entrar em contato com o pecado, aniquilava-o e operava o perdão de toda a culpa.
De fato, algo pode acontecer à mesa: através da comunhão do alimento e de uma comunhão não só de palavras, mas de pensamentos e de sentimentos, o Espírito de conversão e o Espírito de renovação podem agir. Precisamente por isso, Jesus não permaneceu no deserto como o seu mestre, João Batista, mas optou por entrar nas cidades e nos vilarejos, nas casas das pessoas, para se sentar à mesa com os homens e as mulheres, justos e pecadores, que encontrava no seu caminho de anunciador do Reino.
A sua liberdade, o fato de apertar as mãos de pessoas “perdidas” de acordo com a Lei, o fato de se colocar ao lado de pessoas perdidas, descartadas e condenadas pela opinião pública escandalizava! Sim, a misericórdia infinita de Deus escandaliza os humanos mais do que a sua justiça! Os homens religiosos não podiam tolerar o comportamento e as palavras de Jesus, que nunca julgavam quem estava em condição de pecado e, embora condenando o mal e o próprio pecado, anunciavam também o perdão e a reconciliação gratuita com Deus.
Jesus, portanto, deve responder à murmuração: “Isso é demais!”. E, para explicar e revelar a verdadeira intenção subjacente ao fato de ele viver sentado à mesa dos pecadores, ele apresenta algumas parábolas. A primeira começa com uma pergunta: “Se um de vós tem cem ovelhas e perde uma, não deixa as noventa e nove no deserto, e vai atrás daquela que se perdeu, até encontrá-la?”. Às vezes, uma ovelha que, junto com as outras, forma o rebanho e pasta guiada pelo pastor se perde, fica sozinha, cai em um penhasco, sem poder mais alcançar as outras. É uma ovelha perdida que só pode conhecer a morte por obra de feras selvagens, das feridas ou da fome. Então, o pastor deixa as outros 99 no deserto e vai procurá-la com grande cuidado, até encontrá-la.
Por que o pastor faz isso, por que se esforça por uma ovelha, quando tem outras 99? O evangelho apócrifo de Tomé relata essa parábola com um acréscimo significativo: “A ovelha maior se perdeu” (dito 107), quase como que justificando a busca por parte do pastor de uma ovelha mais preciosa, portanto mais amada. Segundo Lucas, porém, esta é a boa notícia: o pastor não tem preferências, mas, ao contrário, ama todas as ovelhas pessoalmente, porque conhece a voz e o nome de cada uma (cf. Jo 10,3-4,14) e, aos seus olhos, cada ovelha tem um valor único e inestimável!
Essa ovelha, portanto, é simplesmente uma ovelha pertencente ao pastor que se perdeu e vai rumo à morte: isso leva o pastor a procurá-la! Quando se ama, não se seguem os cálculos da aritmética! O pastor não se contenta em esperar que a ovelha retorne, mas vai à sua busca, porque cada ovelha, se for amada, deve ser procurada.
Como não pensar aqui na estrofe do Dies irae: “Quaerens me sedisti lassus”; “Senhor, procurando-me, sentaste-te exausto”? Sim, o pastor da parábola é Deus, que continua pensando em quem se perdeu, em quem o abandonou por escolha ou por erro e não fica em paz enquanto a ovelha amada não retorna à sua intimidade. E assim Deus “abandona” as outras ovelhas para salvar aquela perdida...
Em vez disso, nós conhecemos pastores que não têm esse estilo indicado por Jesus. Eles também têm 100 ovelhas, mas quando uma delas se perde, atacados pelo medo, eles avisam as outras: “Cuidado, fiquem no redil, porque há lobos lá fora, os inimigos do rebanho. Eu as protejo ficando aqui com vocês, mas não repitam o erro da ovelha que se perdeu!”. E, assim, no dia seguinte, outra ovelha se perde, mas eles repetem as mesmas advertências e permanecem na guarda do redil. Depois, outra vai embora, depois outra ainda... mas o pastor, que quer proteger as ovelhas, não vai procurá-las. Assim, ele permanece pastor de uma ovelha, enquanto as outras 99 foram embora, perdidas porque o pastor estava com medo, porque tinha ciúmes do seu rebanho, porque não tinha coragem nem audácia.
O pastor da parábola de Jesus, em vez disso, procura, procura e não se rende até encontrar a ovelha perdida. Então, carrega-a sobre as costas, para lhe evitar o cansaço e aplacar a sua angústia pela solidão, leve-a para casa e chama os amigos e os vizinhos para fazer festa: “Alegrai-vos comigo! Encontrei a minha ovelha que estava perdida”. Essa festa é profecia, sinal da festa que ocorre no céu, porque Deus também se alegra quando uma pessoa perdida é encontrada, um morto volta à vida, um pecador se converte. E atenção: se converte porque Deus o procura, encontra-o, carrega-o sobre as costas e leva-o para casa. A ovelha permanece passiva, é a ação de salvação de Deus, sempre gratuita e previdente, que a salva!
Depois, segue-se uma parábola paralela, em que Jesus fala de uma mulher que tem dez moedas e perde uma. Então, o que ela faz? Ocupa-se, acende a lâmpada, varre a casa e procura cuidadosamente, até encontrar a moeda que pensava que estava perdida para sempre. Depois, chama as amigas e as vizinhas e faz festa com eles.
Aqui não há um animal que tem relações com o pastor, mas apenas uma pequena moeda. Para entender bem a parábola, porém, é preciso captar onde está a sua ênfase, ou seja, na alegria do reencontro por parte da mulher, evento no qual está inscrita a dinâmica pascal: o perdido foi reencontrado, o morto foi ressuscitado.
Em suma, Deus está sempre em busca do pecador, não é um Deus dos justos, dos puros, que ama apenas aqueles que lhe respondem coerentemente. Deus sabe que, na verdade, todos os seres humanos são pecadores, de um modo ou de outro, e então tenta fazer com que todos e cada um sintam seu amor fiel e nunca merecido. Ele nos dá esse amor, ele o oferece a nós, mas, se não sentirmos a necessidade de um Deus que nos torne justos, se não soubermos ou não quisermos saber que somos pecadores, então impedimos que Deus venha nos procurar.
O apóstolo João nos revela: “O amor consiste nisto: não somos nós que amamos a Deus, mas foi ele quem nos amou primeiro” (cf. 1Jo 4,10.19). Portanto, rezemos para discernir Aquele que, “procurando-nos, sentou-se exausto” e não pensemos no rebanho, porque todos, mais cedo ou mais tarde na vida, somos ovelhas perdidas!
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''Este homem acolhe os pecadores e come com eles'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU