05 Setembro 2019
"O desafio é criar respostas para reestruturar a organização sindical, para que ela continue a ser capaz de representar os interesses dos trabalhadores diante das novas complexidades", escreve Clemente Ganz Lúcio, sociólogo, diretor técnico do DIEESE, em artigo publicado por Rádio Peão Brasil, 30-08-2019.
Eis o artigo.
Um campo de transformações de extensa complexidade vem irrompendo em todo o mundo, independente do contexto político de cada país. Avanços tecnológicos e financeirização global são os alicerces das mudanças. Empregos, ocupações, profissões, a sociedade em geral sentem e sentirão ainda mais os impactos. Na base material de um sistema produtivo em transformação, emerge um mundo do trabalho desconhecido, que obriga sindicatos a se repensarem. O futuro do sindicato depende da qualidade da resposta que a atual estrutura sindical será capaz de dar. A reestruturação dos sindicatos precisa mirar a capacidade de organizar, mobilizar e representar os trabalhadores inseridos nesse outro mundo do trabalho.
Essa transformação estrutural ocorre no contexto político e histórico-situacional da cada país, no qual Executivo, Legislativo, Judiciário e demais instituições, nos contextos econômico, social, político e cultural específicos, incidem com os respectivos projetos, propostas, iniciativas. Algumas vezes, a dinâmica do país acelera ou aprofunda as mudanças estruturais; em outras, cria resistências ou apresenta alternativas às mudanças. A complexidade da mudança estrutural do sistema produtivo e das relações laborais ganha conteúdo e dinâmica real na vida de uma nação, às vezes, de forma trágica.
É por isso que o projeto de país e de nação de um governo faz muita diferença na conformação da mudança estrutural no contexto concreto, assim como a relação entre mudança estrutural e projeto de governo molda o desenvolvimento, as possibilidades econômicas e o sistema produtivo do país. O mundo que hoje emerge das transformações adquire feições reais e os novos trabalhadores constroem nesse contexto a sua subjetividade concreta. A reestruturação para construir o sindicato do futuro deve ser resposta objetiva às mudanças concretas nesse contexto histórico presente.
No caso brasileiro, há projeto e inciativas do atual governo federal para: alterar o padrão da legislação laboral; mudar as formas de proteção do trabalho e dos trabalhadores; provocar e promover mudanças profundas na estrutura sindical; alterar o financiamento de entidades sindicais; e buscar novas mediações para a negociação coletiva e a solução dos conflitos.
Essas dimensões da complexidade situacional acima são vetores disruptivos que, ao provocar dinâmicas de mudanças radicais só no mundo do trabalho, nos empregos e ocupações, atingirão em cheio a condição de vida e a visão de mundo dos trabalhadores. No Brasil, essas complexidades estão em desenvolvimento e exigem respostas rápidas e criativas da atual organização sindical.
O desafio é criar respostas para reestruturar a organização sindical, para que ela continue a ser capaz de representar os interesses dos trabalhadores diante das novas complexidades. É crucial gerar soluções para uma estrutura que continue capaz de reunir os trabalhadores em torno da sua organização e com ela produzir unidade política que gere força social e econômica para apresentar sua agenda, seus projetos e visão de mundo, com habilidade para negociar e estabelecer compromissos que promovam ocupação de qualidade e protegida para todos e seja capaz de solucionar os conflitos.
O projeto de reestruturação sindical deve construir uma organização que represente todos os trabalhadores, inseridos no mundo do trabalho em múltiplas formas de ocupação e contratação, em relações laborais estabelecidas no sistema produtivo que está surgindo. Esse desafio exige repostas hoje, olhando para o futuro, com pés no chão e compromisso com a nossa história.
Leia mais
- Reforma Sindical e trabalhista em debate. Revista IHU On-Line, Nº. 138
- É urgente gestar o sindicato do futuro
- Sindicatos: a classe trabalhadora vai ao inferno?
- Protagonismo em um sindicato em mudança
- Uberização: a edição da velha ideia do trabalho amador. Entrevista especial com Ludmila Abílio
- Entre Vistas com Clemente Ganz Lúcio
- Eleições no Brasil: a necessidade de encarar as complexidades do pleito e os ataques à democracia. Entrevista especial com Clemente Ganz Lúcio
- Sindicatos: a classe trabalhadora vai ao inferno?
- "A MP 873 tenta acabar com o movimento sindical". Entrevista especial com Marilane Teixeira
- Sindicatos e democracia radical, união possível?
- Protagonismo em um sindicato em mudança
- MP 873 é declaração de guerra a sindicatos e afronta Constituição, afirma a CUT
- A reinvenção dos sindicatos
- Seis meses após reforma trabalhista, arrecadação de sindicatos desaba 88%
- A importância dos sindicatos
- Entenda como a reforma da Previdência aprofunda as desigualdades
- Máquinas Sapiens. Os desenvolvimentos da Inteligência Artificial
- Máquinas, inteligência artificial e o futuro do capitalismo
- Surgirá uma inteligência maior do que a humana?
- Trabalhadores e robôs, os empregos que desaparecem e assustam o mundo
- Destruição da proteção social
- Qual é o futuro do sindicalismo? Organizar quem e quantos?
- O futuro do sindicalismo: motivos que exigem uma agenda de mudanças?
FECHAR
Comunicar erro.
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
O sindicato do futuro será a resposta às complexidades - Instituto Humanitas Unisinos - IHU