15 Mai 2019
Dois dias após oito ex-ministros do Meio Ambiente lançarem um manifesto acusando o atual ministro de desmonte da política ambiental que foi sendo construída nos últimos 40 anos, o ministro Ricardo Salles disse para o Estadão que pretende rever, na verdade, os últimos 80 anos. O titular da pasta ambiental informou que revisará todas as 334 unidades de conservação federais, desde o Parque Nacional de Itatiaia, criado em 1934, ao Refúgio da Vida Silvestre da Ararinha Azul, uma das últimas unidades criadas pelo governo federal, em 2018. Em entrevista ao repórter André Borges, o ministro afirmou que as unidades foram feitas “sem critério técnico” e que um grupo de estudo está sendo montado no Ministério para rever as unidades. O objetivo é recategorizar algumas, mudar traçados de outras e até extinguir. O pacotão de revisão deverá ser lançado já no segundo semestre.
((o))eco entrou em contato com a assessoria de imprensa do Ministério para saber a composição desse grupo de trabalho, já que não há criação de nenhum colegiado formal no Diário Oficial da União. Até o fechamento desta matéria, não recebeu resposta.
A reportagem é de Daniele Bragança, publicada por ((o))eco, 10-05-2019.
A principal mudança da política de revisão deverá ser na lei que rege o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, de 2000. A lei do SNUC determina que criação de unidades de conservação é atribuição do Executivo, mas o mesmo ato que a cria, um decreto, não pode ser usado para diminuir ou extinguir uma unidade de conservação. Essa é a principal pedra no sapato do governo para mudar o foco da política de conservação. Ucs só podem ser extintas por projeto de lei, ou seja, pelo crivo do Congresso Nacional.
A lei do SNUC também separa as unidades em duas grandes categorias: a de proteção integral, que não permite o uso direto de recursos, e a de uso sustentável, que permite.
Em tese, agricultura, pecuária, mineração, pesca e extrativismo não poderiam ocorrer dentro de unidades de proteção integral. E são essas as bases dos atuais conflitos fundiárias, que o governo pretende resolver, acabando com o sistema de proteção.
“A proposta pelo ministro vai na contramão dos interesses mundiais. O Brasil, como signatário da CDB e das Metas de Aichi, assumiu o compromisso de proteger pelo menos 17% de cada um de seus biomas até 2020. Nos últimos anos foram construídos uma série de mecanismo para resolver a situação de regularização fundiária das Ucs do Brasil: como o fundo de compensação ambiental e a compensação da reserva legal. A proposta do Salles é um prêmio ao crime e a incompetência: premia criminosos, desmatadores ilegais e grileiros que historicamente têm invadido e desmatado áreas de Ucs e “resolve” de forma vergonhosa a incompetência do próprio MMA, que ao invés de arregaçar as mangas e se utilizar desses e outros mecanismos sérios e técnicos para resolver as questões fundiárias, estruturar as Ucs e fazer valer a lei, prefere condenar a nossa maior riqueza, leiloando-a a preço de banana”, afirma Angela Kuczach, diretora da Rede Pró-UCs. “Ao contrário do que diz o ministro, o Brasil é um dos países que mais investe em estudos técnicos e científicos para a criação das Ucs. Maria Tereza Jorge Pádua usou a teoria dos refúgios do pleistoceno para criar Ucs na Amazônia em pleno regime militar. Duvido que ele saiba o que é isso. Os mapas das áreas prioritárias, que capciosamente Salles retirou do ar, é uma das metodologias mais robustas para avaliação de prioridades em conservação”, explicou Angela, em entrevista por telefone.
O que será revisto. (Reprodução: CNUC/MMA)
Na terça-feira (07), o presidente Jair Bolsonaro afirmou à Luciana Gimenez que o governo estuda revogar o decreto de criação da Estação Ecológica de Tamoios, na Baía de Guanabara, onde foi multado pelo Ibama em 2012, por pescar. Objetivo seria abrir a área ao turismo e a pesca subaquática. A categoria Estação Ecológica é uma das mais restritivas dentro do SNUC e só permite estudos científicos.
Além de Tamoios, o governo já havia sinalizado que iria rever o Parque Nacional Lagoa do Peixe, no Rio Grande do Sul, o transformando em APA, a categoria mais branda de unidade de conservação dentro do SNUC. O Parque Nacional dos Campos Gerais, no Paraná, e a Floresta Nacional do Jamanxim, no Pará, também estão sendo estudados.
Das 334 unidades de conservação federais, 149 são de proteção integral, sendo a maioria parques nacionais (74) – que permitem ecoturismo, seguido de reservas biológicas (31), estações ecológicas (30), refúgio da vida silvestre (9) e monumentos naturais (5).
Das 185 de uso sustentável, 67 são florestas nacionais (Flonas) – que permitem a exploração de madeiras e produtos não-madeireiros por meio de licitação e contratos, 66 reservas extrativistas (Resex), 37 áreas de proteção ambiental (APA), 13 área de relevante interesse ecológico (ARIE) e 2 reservas do desenvolvimento sustentável (RDS).
A diferença entre todas as 12 categorias de Unidades de Conservação podem ser vistas neste link do Dicionário Ambiental – O que são Unidades de Conservação.
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Ricardo Salles quer rever todas as Unidades de Conservação federais do país e mudar SNUC - Instituto Humanitas Unisinos - IHU