26 Março 2019
Não foi só uma greve pelo clima no último dia 15 de março. Na mesma data já estava programado há algum tempo - como todo ano na segunda sexta-feira de março, no final da Semana Internacional do Cérebro - o UniStem Day, a Jornada dedicada ao conhecimento das células-tronco.
A reportagem é de Maria Teresa Pontara Pederiva, publicada por Settimana News, 20-03-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Nos principais países europeus, os responsáveis tentaram coordenar as duas iniciativas (horários, número de participantes, etc.), enquanto na Itália havia ainda mais um problema: lidar com a contínua redução de fundos destinados à pesquisa que não encontra solução (nos últimos 10 anos uma queda de mais de 20%). Para exemplificar: em 2016, a Itália investiu 21,6 bilhões de euros em pesquisas públicas e privadas, o Reino Unido investiu 33, a França 50 e a Alemanha 92.
Em julho, um relatório da CNR revelou como a Itália gasta em pesquisa, o 1,3% do PIB, um número que coloca o país em 12º lugar entre os países europeus, precedido inclusive pela República Tcheca e Eslovênia, enquanto está aumentando a contribuição italiana para publicações científicas, as citações e os pedidos de patentes.
Para a reflexão da Jornada dirigida aos estudantes do ensino secundário, as universidades italianas tiveram que recorrer a soluções internas ou não muito distantes, como em Trento, onde participaram pesquisadores do CIBIO (Centro Interdepartamental de Biologia Integrada) e da Universidade de Bozen-Bolzano, reduzindo adequadamente o tempo das palestras para permitir que os alunos participassem das manifestações pelo clima, altamente recomendadas também por muitas famílias do Trentino (muitos pais foram vistos acompanhando os filhos menores nas manifestações).
Um evento importante que não deve ser subestimado, o UniStem Day, que este ano chegou à sua 11ª edição, como lembrou nas mídias Elena Cattaneo, uma das principais mulheres cientistas italianas, senadora vitalícia e promotora da iniciativa da Universidade de Milão: uma "longa e fascinante viagem da pesquisa sobre as células-tronco" como mostrava o vídeo inicial compartilhado entre os 99 institutos de pesquisa em todo o mundo. Um evento para conhecer mais a situação atual a partir da própria voz daqueles que todos os dias trabalham na área, em uma pesquisa séria, conscienciosa e acima de tudo que quer ser transparente (deveria provocar uma reflexão a defesa a partir "do interno", de centenas e centenas de biólogos de todo o mundo ocidental, contra a publicação, pela metade, dos resultados do experimento que aconteceu na China em duas gêmeas.
"Células-tronco entre esperança e realidade" era a manchete que nós usamos dois anos atrás nesse mesmo portal, quando já tinha sido desmascarado o engodo do Stamina Method e com o objetivo de evocar o quanto a desinformação pode provocar confusão. Especialmente hoje, na época das fake news habilmente confeccionadas (de fato, estão se intensificando os cursos de atualização para jornalistas, inclusive sobre notícias científicas, como aquele organizado em 21 de março pela Ordem do Trentino-Alto Adige).
Apenas para lembrar do que estamos falando: existem diferentes tipos de células-tronco, mesmo que a opinião pública pareça se concentrar apenas nas embrionárias. As células "totipotentes", ou seja, aquelas que podem se especializar em todos os tipos celulares, são o oócito fecundado (zigoto) e os blastômeros, as células da mórula (embrião de 2-4 dias de desenvolvimento), que darão origem ao indivíduo inteiro e à placenta. Já com pouco mais de uma semana de vida, a parte mais interna dos blastocistos é ocupada por células-tronco "pluripotentes" que se diferenciarão nos folhetos e em todos os tipos de células do organismo.
Depois, há as células-tronco "multipotentes", que ainda são encontradas no indivíduo adulto, mas que têm uma capacidade "reduzida", pois só podem dar origem a um número limitado de tipos celulares relacionadas ao tecido em que são encontradas (na medula óssea existem células-tronco hematopoiéticas que darão origem a todas as células do sangue e às células mesenquimais que se diferenciarão em células ósseas e cartilaginosas).
E, por fim, existem as IPS, as células-tronco “reprogramadas” porque pluripotentes por indução (descobertas em 2006 pelo japonês Yamanaka e pelo inglês Gurdon, ambos vencedores do prêmio Nobel em 2012), graças a uma técnica que permite evitar o uso de embriões.
Por que é tão importante falar sobre células-tronco? Porque estamos no campo da pesquisa biomédica, portanto, orientada a tratar patologias que até agora são gravemente incapacitantes ou letais, comentava Simona Casarosa, professora associada a Trento.
Foi significativa a intervenção de Anna Cereseto, diretora do Laboratório de Virologia Molecular no CIBIO em Trento, onde foi aperfeiçoada, em colaboração com as universidades de Modena, Edimburgo e Leuven, a técnica EvoCas9, uma variante do CRISPR/Cas9 (descoberto e apresentado em 2010 por Emmanuelle Charpentier e por Jennifer Doudna), uma técnica comparável a uma "tesoura molecular" que permite cortar o DNA no ponto desejado e, posteriormente, inserir, remover ou modificar a sequência do genoma de interesse.
O Human Gencode, o genoma humano, contém 19.950 genes, mas só hoje podemos finalmente falar de uma "terapia gênica". Usando células-tronco hematopoiéticas, retiradas da medula óssea, é possível tratar os chamados Bubble Boys, aquelas crianças e jovens que sofrem de imunodeficiência congênita e que são obrigados a viver em um ambiente estéril, por serem desprovidos de qualquer defesa imunológica, mesmo contra os micróbios mais comuns (são bem conhecidas aquelas tristes imagens que os representam dentro de grandes bolhas de plástico).
Outros usos são o tratamento da anemia falciforme ou da degeneração da retina ou o HIV, enquanto estão em curso ensaios clínicos para combater a doença de Alzheimer.
O ponto de partida comum é a não-imutabilidade do DNA: o genoma humano não é unívoco, como muitos ainda acreditam, mas muda e pode se modificar ou "corrigir". Considerar o DNA fixo e imutável (quantas vezes lemos ou ouvimos expressões, resultado da desinformação, do tipo "está escrito no DNA"?) demonstra hoje - mais de 60 anos após a descoberta de Watson e Crik - uma falta de conhecimento dos dados científicos: o DNA é "líquido" e nós mesmos somos um mosaico de genes sujeitos a mutações diárias.
Sempre através das células-tronco estão sendo construídos Organoids, ou seja, pequenos cérebros, pâncreas, mamas, próstatas: órgãos in vitro, de tamanho reduzido. Luca Tiberi, pesquisador do CIBIO, explicou para que servem, enfatizando em especial o desafio que os biólogos estão enfrentando: a reimplantação dos organoides, por exemplo, no intestino, eventualmente reduzido devido a perdas de tecido por operações de remoção de câncer. Sem esquecer a pesquisa em curso para combater a microcefalia produzida pelo vírus Zyka através do uso de organoides de cérebro.
Mas ainda mais concreto é o propósito da Clean Meat ou Coltured Meat, ou seja, a produção de carne Animal Free, portanto em laboratório. Como lembrava Stefano Biressi, pesquisador da Telethon que trabalha no CIBIO para pesquisa sobre tecido muscular, 18% do efeito estufa, de acordo com a FAO, é atribuível à cadeia produtiva da carne, também responsável por um desmatamento acentuado, alto consumo de água, bem como do sofrimento animal, muitas vezes pouco considerado.
Uma das soluções poderia ser justamente a Carne Limpa, cuja produção, por exemplo, consome apenas 324 galões de água por quilo de carne, em comparação com os 1.799 consumidos pela criação tradicional. É claro que não se pode ter ilusões e a produção em grande escala - para resolver, por exemplo, o grave problema da fome no mundo - ainda está longe. Mas ainda assim trata-se de um setor que tem despertado o interesse de tantas pessoas sensíveis ao meio ambiente/criação, ao sofrimento animal ou que pretendem promover uma maior justiça no mundo, dividido em dois entre ricos e pobres (e há também quem pense em uma possibilidade de alimentação para viagens espaciais). Estados Unidos, China, Índia, Holanda e Israel abrigam centros de pesquisa nessa direção, cujos desenvolvimentos são esperados para os próximos anos.
Enquanto isso, os experimentos em tecido muscular produzidos em laboratório continuam sendo direcionados, na Itália, para o tratamento de lesões causadas por acidentes rodoviários graves, de trabalho ou devido a catástrofes: a partir de células-tronco pluripotentes ou IPS pode ser esperada uma quantidade infinita de tecido. E já começaram os ensaios clínicos para o tratamento de grandes queimaduras ou da distrofia muscular.
Se as notícias sobre o uso de células-tronco não eram realmente uma novidade absoluta, pelo menos para os 250 participantes, a maioria estudantes de escolas científicas e seus professores de ciências, despertou muito interesse a intervenção da jurista do Trentino Marta Tomasi, pesquisadora em Direito Constitucional e Público na Libera Universidade de Bolzano.
“O direito é ‘lento’”, explicou Tomasi que, com grande honestidade intelectual, reconheceu como, para um não-especialista, é extremamente “complicado” entender o que está fazendo a ciência. Quase como dizer que dissertar sobre células-tronco, intervenções no genoma, organoides, alimentos in vitro, bem como sobre física ou inteligência artificial, pode ser pior do que escalar uma montanha cheia de armadilhas desconhecidas e o risco de expressar afirmações distantes da realidade é mais que evidente.
O direito se baseia nos artigos 9, 32 e 33 da Constituição, mas seria necessário pelo menos um diploma em biologia ou outras ciências para dizer algo digno de nota. Uma afirmação longe de ser óbvia quando se olha em volta e vemos quem escreve ou disserta sobre ciência a partir da leitura de algum livro ou algo assim (nos EUA não é raro encontrar textos escritos por quem perdeu o emprego e ... decide se virar como pode).
Nos Estados Unidos - onde é mais fácil que existam pessoas competentes em áreas bem distintas devido à própria estrutura universitária (por exemplo, Al Gore, enquanto estudava Direito, prestava provas de ecologia) - atualmente está se debatendo sobre quais entes seriam melhor indicados para avaliar a segurança da Clean Meat: departamento de saúde, agricultura ou comércio?
Cereseto, a esse respeito, acrescentava mais um motivo de reflexão: o CRISPR é definido como OGM pelo Tribunal Europeu de Justiça, enquanto não é assim nos EUA, onde reconhecem que não se trata da introdução de uma "nova" sequência, mas - como é de fato - apenas de uma modificação de nucleotídeos.
Mesmo assim, esse é um problema que Tomasi definiu como "gigantesco" porque o biodireito deveria falar apenas apoiando-se em dados científicos bem compreendidos, deixando de lado resultados grotescos e inadmissíveis, aliás bastante difundidos na mídia (mas isso deveria ser igualmente verdadeiro para a bioética onde um teólogo moral como Monsenhor Golser por muito tempo se consultava com os colegas da informática antes de "balbuciar" algumas palavras, como ele dizia sorrindo).
Portanto, é necessário avaliar bem o que está sendo feito nos laboratórios e nas clínicas universitárias, mas sem a pretensão de bloquear o caminho da ciência, especialmente quando se está "de fora" e sem primeiro entender bem aquilo sobre o que se pretende falar. Como dizer: a terapia celular é interessante, mas primeiro devemos avaliar cuidadosamente o risco carcinogênico ... o que significa desenvolver uma série de estratégias para avaliar primeiro a segurança do que a eficácia. E nisso é certo vigiar e fazer perguntas aos cientistas.
Porque "não a pesquisa é um problema para a humanidade - concluiu Biressi com referência à situação italiana cada vez mais grave - mas um mundo sem pesquisa, isso sim seria um problema".
No mesmo comprimento de onda, o vídeo exibido na conclusão como aconteceu em todos os outros eventos concomitantes no nível europeu. "O futuro é hoje", dizia o título, e logo havia imagens comentadas por expressões como "like", "share", "follow" (curtir, compartilhar, seguir) para concluir, com o olhar dirigido para Greta Thunberg e à sua ação em defesa do clima, com um "Free to engage". Porque mesmo a pesquisa, como a defesa do planeta, está nas mãos dos mais jovens, certamente mais sensíveis (basta pensar sobre o que aconteceu e ainda acontece nas decisões políticas na nossa casa) de muitos adultos. E, apesar do paternalismo, principalmente, local (sim, justamente aqueles que se declaravam preocupados com a baixa taxa de natalidade) que emergem dos tantos comentários lidos ou ouvidos nestes últimos dias, a esperança é que sejam precisamente os jovens a assumir a situação. Antes que seja tarde demais.
Resta o alerta manifestado por Greta no final do ano passado na Conferência das Nações Unidas em Katowice, COP 24, dirigindo-se aos representantes dos Estados: "Em 2078 eu vou celebrar meu 75º aniversário." Se eu tiver filhos, eles provavelmente passarão o dia comigo e talvez me façam perguntas sobre vocês. Talvez eles me perguntem por que vocês não fizeram nada quando ainda havia tempo para agir ... Vocês dizem que amam os seus filhos, mas estão roubando o futuro deles ... Vocês não têm mais desculpa e nós temos pouco tempo”.
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A situação atual das células-tronco na perspectiva do planeta - Instituto Humanitas Unisinos - IHU