“A mudança climática rouba o futuro dos jovens”. Entrevista com Marta Bordons

Foto: Reprodução/Youtube

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16 Março 2019

Marta Bordons tem pouco mais de vinte anos, mas supre a experiência com algumas enormes doses de sonho e determinação. Enfatiza ao jornalista que, em Sevilha, não é a líder do movimento ambientalista internacional e juvenil Fridays for Future (Sexta-Feira pelo Futuro, na Espanha sob o nome de Juventude pelo Clima), mas, sim, uma de suas organizadoras.

De qualquer modo, não falta capacidade de liderança para esta estudante de tradução, interpretação e humanidades da Universidade Pablo de Olavide. Faz parte desse novo 15M impulsionado a partir das gélidas terras nórdicas e que luta por algo tão elementar como a sobrevivência.

Desde dezembro, a adolescente Greta Thunberg é conhecida para além da Suécia, onde começou uma greve semanal, às sextas-feiras, contra a mudança climática, por ter exortado aos políticos de todo o mundo, com dureza e determinação, para que atuem contra a crise do clima: “Viemos aqui para lhes fazer saber que a mudança está chegando, gostem ou não”. É no que acredita a sevilhana Marta Bordons, que se unirá neste dia 15 de março à mobilização mundial contra a mudança climática. Os olhos estão postos nos mais jovens.

A entrevista é de Alejandro Ávila, publicada por El Diario, 14-03-2019. A tradução é do Cepat.

Eis a entrevista.

O que a fez se unir ao movimento Fridays for Future?

Há bastante tempo, comecei a me preocupar com a situação climática. Estive estudando em Bonn (Alemanha) e ali parei de comer carne e peixe e passei a ser mais consciente do uso maluco que fazemos do plástico, um resíduo que permanecerá durante milhares de anos em nosso ambiente e que só usamos cinco minutos. Ao chegar a Sevilha, associei-me ao Greenpeace e aprendi o que está ocorrendo com os oceanos, os pesticidas e as abelhas, a agricultura intensiva, a pecuária industrial e o desmatamento, entre outros temas.

E o que você achou de tudo aquilo?

Considerei injustiças: uns poucos estão lucrando, enquanto destruímos o planeta. Nós não estamos nos preocupando em que os recursos voltem a ser reutilizados. Desmatamos, mas não reflorestamos, usamos energias fósseis em vez de renováveis. São coisas que me parecem muito lógicas, mas para os partidos e os responsáveis políticos não parecem importar. No Fridays for Future, para nós é muito lógico o que disse a jovem ativista sueca, Greta Thunberg: nós, jovens, precisamos de um mundo onde possamos viver e resulta incrível que os políticos não estejam se preocupando com isso. Nós, estudantes, estamos cumprindo nossa função social, ao passo que os políticos não cumprem a sua: escutar os cientistas.

A mudança climática já é uma realidade?

Ainda que na Espanha apenas os primeiros sintomas apenas começaram a chegar, a mudança climática já é uma grave realidade em outros países, onde há refugiados do clima, degelo e outros efeitos. Não sei porque estamos esperando até o último momento.

Por que é importante que sejam os jovens os que lutem contra a mudança climática?

Agora mesmo, na Espanha, somos milhares de estudantes organizando isto, temos grupos de WhatsApp e estamos usando as redes sociais para nos organizar. Não podemos mudar as leis, mas, sim, pressionar. Somos a seguinte geração, mas estão nos roubando o futuro e nossa possibilidade de viver. Preocupa-nos a crise climática porque tocará a nós enfrentá-la e viver sem recursos.

Greta Thunberg é um exemplo só para os jovens ou também para os mais velhos?

É um exemplo para todo mundo. Conseguiu fazer com que seus pais reduzissem suas viagens de avião (a mão é cantora lírica) e que comessem menos carne. Estão surgindo grupos de escritores, avós ou psicólogos pelo futuro. O movimento está influenciando adultos e queremos que os políticos não o aproveitem só para tirar foto, mas para tomar medidas reais. Chegamos a um ponto em que pensamos que os políticos não irão mudar sua maneira de pensar. Como disse Thunberg, nas Nações Unidas: ainda que me ignorem, tenho que dizer. Faremos mesmo assim.

Quais são as ferramentas que estão utilizando?

Temos o apoio de muitas associações, isso está nos ajudando muito na difusão e em nos sentir apoiados. Não queremos que nos reconheçam como de qualquer partido. Queremos ser apartidários, porque depois acontece o que acontece. Dependendo da província, somos em mais ou menos pessoas. Em Madri e Barcelona, pode haver 300 pessoas. Estamos buscando a difusão em meios de comunicação e financiamento. Queremos que o movimento continue todas as sextas-feiras, que não sejam só concentrações, mas oficinas de reciclagem, troca de roupa e que o movimento cresça mais. Que sigamos aprendendo uma maneira de existir que seja mais ecológica e que a greve de carbono não seja tão terrível.

E em Andaluzia?

Na Espanha, são 30 as províncias onde a greve foi convocada. Em Sevilha, somos 20 pessoas e, como eu dizia, contamos com o apoio de associações. É muito trabalhoso organizar uma greve em nível internacional, em apenas um mês. Acredito que esta sexta-feira irá marcar um antes e um depois.

Precisamente, a manifestação ocorre uma semana depois do 8M, que voltou a unir milhões de pessoas feministas em ruas de todo o mundo. Isso favorece vocês? Há um nexo de união entre feminismo e ambientalismo?

Pensamos que o ambientalismo tem muito a ver com o feminismo: é interseccional, igualitário e justo. Pode ser que não reciclemos aqui, mas as baterias são feitas com coltan de outros países. O ecofeminismo, que engloba o feminismo e o ambientalismo [ecologismo], busca respeitar as pessoas e não se aproveitar de ninguém. Queremos nos parecer com o feminismo, no sentido de ser justos com todo o mundo, sem marginalizar qualquer pessoa. Nós, mulheres, somos as que menos geramos pegada de carbono, mas as que mais sofremos os efeitos das mudanças climáticas.

Acredita que o movimento ambientalista precisa de uma mudança geracional?

Não sei se uma mudança, mas é necessária mais consciência na juventude. Estão chegando a nós mensagens de estudantes de institutos, interessados em saber se há uma greve em sua região, mas é complicado que os institutos se mobilizem. Não é necessário que sejam greves, mas, sim, seria bom se fizessem jornadas ou sentadas. O importante é gerar conscientização, sem importar a idade. Os cientistas são muito pessimistas, como Greta (Thunberg). Ainda que em nível científico já esteja resolvido como lutar contra a mudança climática, o ambientalismo recebe pouco apoio eleitoral.

Por quê?

Parece que as políticas só intervêm quando estamos a ponto de transbordar. É como o ebola que estava há muito tempo presente em outros países e enquanto não chegou à Espanha, nós não nos preocupamos. A mudança climática não está nos afetando tanto no momento e temo que não atuaremos nada, enquanto não tivermos nada para comer e que seja uma emergência.

Por que é importante a luta ambientalista em uma região como Andaluzia?

Em Andaluzia, a mudança climática irá afetar, por exemplo, as províncias de Cádiz, onde o nível do mar irá aumentar muito por causa do degelo, ou a margem do Rio Guadalquivir, que irá secar. Temos que nos empoderar, mostrar que nos preocupa e temos que fazer isso por puro egoísmo, por nós mesmos.

Frente à crise climática, há esperança?

Sim, os cientistas disseram que é necessário seguir com isto e que as mudanças precisam ser feitas já. Acredito que o movimento Fridays for Future se manifesta porque temos esperança em que as coisas sejam bem feitas. Não temos confiança nos políticos, mas, sim, em nós e nas pessoas sensatas.

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