“Trump não gosta dos acordos”. Entrevista com Alberto Arroyo Picard

Foto: Departamento de Estado | Fotos Públicas

Mais Lidos

  • Alessandra Korap (1985), mais conhecida como Alessandra Munduruku, a mais influente ativista indígena do Brasil, reclama da falta de disposição do presidente brasileiro Lula da Silva em ouvir.

    “O avanço do capitalismo está nos matando”. Entrevista com Alessandra Munduruku, liderança indígena por trás dos protestos na COP30

    LER MAIS
  • Dilexi Te: a crise da autorreferencialidade da Igreja e a opção pelos pobres. Artigo de Jung Mo Sung

    LER MAIS
  • Às leitoras e aos leitores

    LER MAIS

Revista ihu on-line

O veneno automático e infinito do ódio e suas atualizações no século XXI

Edição: 557

Leia mais

Um caleidoscópio chamado Rio Grande do Sul

Edição: 556

Leia mais

Entre códigos e consciência: desafios da IA

Edição: 555

Leia mais

01 Dezembro 2018

“Acredito que Trump busca impor regras informais na economia mundial em benefício dos Estados Unidos. Não gosta dos acordos porque, enfim, são compromissos e prefere atuar ao modo antigo. Isto parece que seria antiglobalização, mas eu não acredito que realmente seja. O que ele quer é por outra via impor suas regras”, explica ao Página/12 Alberto Arroyo Picard, pesquisador da Universidade Autónoma Metropolitana do México e integrante da Convergência México Melhor sem TLC. A metros da sede da contra-cúpula dos povos, no Congresso Nacional, o especialista oferece alguns detalhes do novo NAFTA entre Estados Unidos, Canadá e México, que os presidentes Trump, Justin Trudeau e Enrique Peña Nieto assinarão, hoje pela manhã, antes do início da cúpula do G-20.

A entrevista é publicada por Página/12, 30-11-2018. A tradução é do Cepat.

Eis a entrevista.

A partir da situação política nos Estados Unidos e em vários países europeus, especialistas começam a conceber a possibilidade de um retrocesso nas condições de expansão na globalização. Acredita que estas tensões estarão mais ou menos solapadas nesta cúpula do G-20?

Acredito que na agenda do G-20 pontualmente o tema comercial não será tratado porque a presidência de Donald Trump implica um risco. Irão buscar chegar a ma declaração geral, muito vaga, se é que conseguem. Em geral, vejo que a situação é complicada porque há uma crise do modelo global. Sob estas regras, é muito pouca gente que é favorecida e a enorme maioria é prejudicada. E os países começam a se preocupar com isto. Há uma perda praticamente total da capacidade de intervir na economia e de impulsionar um projeto como país e começa a haver cada vez mais oposição, porque os efeitos esperados foram puro discurso, não houve realidade. Cada vez fica mais evidente que o capitalismo precisa de regulação, precisa que os Estados intervenham e que regulem e equilibrem interesses. Isto se vê em vários países centrais, ainda que aqueles que não querem saber de nada são as empresas globalizadas, essa é a tensão.

Donald Trump representa essa oposição?

O motor da economia dos Estados Unidos é o mercado interno e isso implica poder de compra dos trabalhadores. Mas, o modelo vigente empobreceu os estadunidenses. Trump tem como tarefa conseguir fortalecer a economia nacional porque nenhum império pode funcionar se não for com poder econômico. Então, há um esforço de reconstruir o poderio da economia norte-americana para recuperar seu poder, que hoje está mais baseado em sua capacidade tecnológica e na militar. Em termos mais gerais, é possível dizer que os Estados, que tinham o papel de procurar manter o sistema atual, hoje, têm que enfrentar temas complexos em nível interno, não só pela queda do mercado interno, mas também pela política, porque finalmente as eleições são a nível nacional e estão perdendo a legitimidade.

Por outro lado, Trump é um autoritário insuportável, muitos o chamam de fascista, talvez fosse o caso de discutir o termo, mas que é um autoritário, não há dúvidas. Acredito que Trump busca impor regras informais na economia mundial em benefício dos Estados Unidos. Não gosta dos acordos porque, enfim, são compromissos e prefere atuar ao modo antigo. Isto parece que seria antiglobalização, mas eu não acredito que realmente seja. O que ele quer é por outra via impor suas regras.

Mas, as negociações por acordos seguem em pé.

Porque o conjunto da grande burguesia globalizada, sim, quer regras. E quer regras porque quer se proteger diante da eventualidade de governos de esquerda, progressistas, que busquem privilegiar a economia nacional sobre as regras internacionais. Querem poder processar você, levá-lo ao Ciadi, etc.

Para além da óbvia importância para o México, o que considera que implica em nível regional e global o novo NAFTA?

Sempre dissemos que o NAFTA era o modelo para a multidão de tratados que surgiram depois. Mas, na realidade, pouco a pouco se foi vendo que era apenas o piso, porque todos os novos tratados tiveram coisas piores ainda. O novo NAFTA não é melhor que o anterior, mas, ao contrário, é pior. O NAFTA foi o exemplo para todos os tratados que foram assinados nos anos 1990 e acredito que o novo acordo também terá uma incidência importante, sobretudo em temas nos quais a opinião pública não costuma prestar tanta atenção como propriedade intelectual. É que os acordos comerciais são muito pouco de comércio. O novo NAFTA tem 30 capítulos e só 5 ou 6 são estritamente comerciais. O restante tem a ver com um marco legal para a economia em seu conjunto. Na realidade os tratados consistem em um marco legal supranacional para limitar a capacidade de cada Estado de intervir na economia. Além disso, o comércio já está muito desregulado na Organização Mundial de Comércio (OMC), as taxações já são muito baixas, não há muito mais para baixar. Mas, não acontece o mesmo com os temas de investimentos e de propriedade intelectual.

Leia mais