30 Novembro 2018
O frei Benjamin da Santíssima Trindade desceu a Towne Avenue em Skid Row [distrito de Los Angeles conhecido pela grande quantidade de moradores de rua e pelas suas “cracolândias”], segurando em uma mão uma caixa de gelo cheia de laranjas e garrafas de água e, na outra, sacolas plásticas com sanduíches de pasta de amendoim, presunto e queijo, batatas fritas e lanches de frutas.
A reportagem é de Caitlin Yoshiko Kandil, publicada por Catholic News Service, 29-11-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Vestido com um hábito completo, um chapéu de palha e chinelos marrons, o frei Benjamin, 42 anos, junto com três outros freis, uma irmã religiosa e três voluntários, gritou: “Água gelada! Comida grátis!”, enquanto percorriam as ruas ladeadas por barracas em um calor de 32 graus.
Frei Benjamin da Santíssima Trindade oferece água a um homem em Skid Row, em Los Angeles (Foto: John McCoy/CNS/Angelus News)
Eles se moviam lentamente, tomando seu tempo para conversar com as pessoas sobre suas vidas e perguntando se precisavam de uma oração. Tyrone Tankins, que vive em Skid Row há oito meses, pediu-lhes que rezassem pela sua avó doente. Mesmo que tendo sobrevivido a um câncer e a um ferimento por arma de fogo, ele disse que é sua avó que precisa de ajuda.
“Estou preocupado com ela”, afirmou. O grupo reuniu-se em um círculo, deu as mãos a Tankins e rezou com ele.
Uma mulher pediu uma oração para que seu carro fosse consertado. Um homem pediu para que cantassem para eles.
Quando terminaram de circular pelo quarteirão, eles haviam dado toda a comida e a água, até mesmo o gelo da caixa térmica. Junto com outra equipe de freis, freiras e voluntários, que percorreram um quarteirão diferente, eles distribuíram 400 sanduíches para 200 sem-teto em uma única tarde de sábado.
“É preciso tenacidade e compaixão para fazer isso”, disse Jedobby Joriday, que mora em Skid Row e recebeu comida dos freis e irmãs em agosto. “Não é a grandeza das coisas que você faz. São as pequenas coisas, como se você respondesse a um pedido de ajuda.”
O frei Benjamin é membro da Fraternidade dos Pobres de Jesus Cristo, uma ordem religiosa fundada no Brasil com a missão de atender aos membros mais necessitados e mais marginalizados da sociedade.
Depois que o arcebispo de Los Angeles, Dom José Gomez, convidou a ordem para ir à cidade no início deste ano, um grupo de quatro frades e quatro irmãs se dirigiu a Skid Row todo fim de semana, na esperança de que sanduíches e garrafas de água grátis sejam o primeiro passo para levantar a crescente população sem-teto da cidade da pobreza e do desespero.
Ir. Açucena e frei Lucaelo, ambos do Brasil, fazem sanduíches na Igreja Santa Teresa d’Ávila, em Los Angeles, para pessoas de Skid Row (Foto: John McCoy/CNS/Angelus News)
“Estamos tentando enfrentar não apenas a situação dos sem-teto, mas também os problemas que temos como sociedade quando negligenciamos o lado espiritual”, disse o frei Benjamin, que é natural do Brasil. “Não temos ilusões de que vamos resolver isso completamente, mas é isto que precisamos redescobrir: a mensagem de Jesus.”
A ordem religiosa foi fundada em 2001 pelo padre brasileiro Gilson Sobreiro. Incomodado com a violência, a atividade das gangues, o vício das drogas e a pobreza que via em São Paulo, Sobreiro alugou uma casa onde os jovens viciados podiam viver e se recuperar.
A partir disso, a ordem se espalhou para 12 países, incluindo Paraguai, Argentina, Nicarágua, El Salvador, França e Canadá. Em 2012, os primeiros membros chegaram em Kansas City, Missouri.
“Nós vivemos pelos pobres”, disse o frei Benjamin à Angelus, a agência de notícias online da Arquidiocese de Los Angeles. “Nós sempre vamos para as piores áreas das cidades, para lugares onde você encontra mais violência, drogas, gangues, prostituição e assim por diante.”
Em Los Angeles, isso significa Skid Row, onde vivem em torno de 53.000 pessoas desabrigadas, segundo a Los Angeles Homeless Services Authority.
O Pe. Brian Nunes, padre secretário do arcebispo, disse que a decisão de convocar a ordem religiosa foi uma resposta direta à crescente crise de falta de moradia da cidade.
“Muitas pessoas estão trabalhando na questão da falta de moradia, mas o arcebispo Gomez queria ter certeza de que elas são cuidadas de uma maneira espiritual”, disse.
O frei Benjamin concordou que a espiritualidade está no centro de sua missão.
“Nós damos comida simples, mas desenvolvemos amizades”, disse ele. “Assim que eles percebem que você se importa com eles e que o que fazemos vai além da comida, eles entendem, e algo interno acontece. É como se uma força surgisse, e eles começassem a lutar por suas vidas novamente.”
Embora a ordem religiosa não seja a única a desenvolver seu ministério nas ruas de Los Angeles, ela talvez seja a mais visível.
A Ir. Maria Carlos-Valdez, membro da comunidade Esclavas de la Inmaculada Niña e vigária arquidiocesana para as religiosas, disse que grupos como os Amantes da Santa Cruz, os Missionários da Rainha do Céu, as Religiosas da Caridade e as irmãs do Abrigo do Bom Pastor também desenvolvem seu ministério com os sem-teto da cidade, mas frequentemente o fazem em trajes civis, de modo que nem sempre são reconhecidos como religiosos.
Para melhor servir aos pobres, os frades e irmãs se esforçam para viver na pobreza. Isso significa ter poucos pertences pessoais – algumas mudas de roupa e nenhum celular –, dormir no chão e comer apenas aquilo que é doado. Para arrecadar dinheiro, eles fazem terços e outros artesanatos que vendem nas paróquias locais.
“Especialmente agora, no nosso mundo, as pessoas pensam que, para ser feliz, você tem que ter, e ter, e ter”, disse a Ir. Maria Goretti da Infância Espiritual, membro da comunidade.
“Quando as pessoas olham para nós, elas se lembram de que não fomos feitos para esta terra. As pessoas pensam: ‘Ah, você não tem celular, Facebook, mídias sociais’. Mas também é bonito porque somos um sinal para pessoas que não podem viver sem internet”, disse ela. “Nós vemos a sociedade e como você não pode deixar o seu telefone. A nossa pobreza pode garantir às pessoas que você pode viver sem tantas coisas.”
Ir. Maria Goretti e Ir. Açucena recebem o agradecimento de um homem em Skid Row, em Los Angeles (Foto: John McCoy/CNS/Angelus News)
Uma vida de tanta simplicidade, enraizada na pobreza, atraiu a Ir. Maria para a ordem.
Ela encontrou a ordem pela primeira vez durante um retiro quando era adolescente no Brasil. Ela ficou impressionada com o fato de seus membros serem tão jovens e com a alegria que eles irradiavam, fazendo-a querer saber mais. Eles não tinham nenhuma posse material que ela considerava como a chave para a felicidade, mas eram alegres.
“Isso foi muito poderoso”, contou. “Para mim, aquilo que era felicidade, eles não tinham nada disso. Mas eram mais felizes do que eu com as coisas que eu tinha.”
Então, aos 15 anos, a Ir. Maria, que agora tem 25, entrou para a ordem. Ela trabalhou no Brasil, no Paraguai e em Kansas City antes de ir para Los Angeles.
Claudia Pina, voluntária de La Habra, Califórnia, prepara e distribui sanduíches com a ordem desde fevereiro. Em um sábado de agosto, ela levou seu filho de oito anos, que não apenas preparou as sacolas de comida, mas também as colocou em um carrinho perto de Skid Row. A experiência, disse ela, foi importante para a formação na fé dele.
“Isso permite que ele veja o que é ensinado na Bíblia em primeira mão e que o viva”, afirmou.
Embora a distribuição de alimentos seja a peça central do trabalho da ordem, os membros esperam fazer mais. Eventualmente, disse o frei Benjamin, eles gostariam de abrir uma casa para que os sem-teto possam morar com eles e escapar de Skid Row.
Abrir uma casa permitiria que a ordem religiosa alcançasse ainda mais pessoas, mas a Ir. Maria disse que os números não são o foco deles.
“Eu sempre lembro que o Evangelho não é como todo mundo, que diz: ‘Queremos números, queremos resultados’”, disse. “O Evangelho do Senhor diz que, quando uma pessoa se converte, o céu se alegra. Se uma pessoa pode mudar, ou se pudermos ajudar uma delas, ou, mais tarde, depois de ir lá muitas e muitas vezes, se uma delas disser: ‘Ah, talvez eu possa mudar’, e é apenas uma, então vale a pena estar lá.”
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Frades e freiras do Brasil levam comida e oração à periferia de Los Angeles - Instituto Humanitas Unisinos - IHU