20 Junho 2018
Mais de 600 religiosos e leigos da Igreja Metodista Unida assinaram uma queixa de denominação contra o membro da Igreja Metodista, Secretário de Justiça americano Jeff Sessions. Os signatários condenam o papel de Sessions na política de "tolerância zero" da administração Trump em separar crianças de seus pais ao longo da fronteira EUA-México. As acusações incluem abuso infantil, imoralidade, discriminação racial e "divulgação de doutrinas que contrariam as normas da doutrina da Igreja Metodista Unida."
A reportagem é de Jack Jenkins e Emily McFarlan Miller, publicada por Religion News Service, 19-06-2018. A tradução é de Victor D. Thiesen.
A denúncia foi enviada para duas igrejas em 18 de junho. A primeira no Alabama, local de origem de Sessions. E, a outra em Washington, D.C., a qual o advogado chefe do governo dos EUA é afiliado atualmente.
"Nós, signatários leigos e religiosos da Igreja Metodista Unida, emitimos uma queixa formal contra o membro leigo da Igreja Jefferson Beauregard Sessions", diz a carta, que foi fornecida ao serviço de notícias de religião.
"Por um lado estamos reticentes em trazer uma queixa formal contra um leigo. Por outro, a combinação única de tremendo poder político e social do Sr. Sessions, seu papel de liderança como professor da escola dominical e ex-delegado da Conferência Geral, e o impacto grave e em curso de certas ações públicas, profissionais suas, faz com que nós, enquanto seus irmãos de denominação Metodista Unida, tenhamos algum grau de responsabilidade."
Dave Wright, ordenado da Igreja e capelão da Universidade de Puget Sound, é o principal autor da carta. Ele disse que espera que a denúncia resulte em conversas pastorais entre Sessions e líderes da Igreja.
"O resultado ideal é que pastores na liderança da Igreja que o conhecem conversem com ele, e que nessas conversas ele seja desafiado a pensar sobre o nível de dano que está causando. E, quem sabe, ele tenha uma mudança de coração — que é sobre o quanto Metodista você consegue ser”, disse Wright.
Das quatro, as três primeiras acusações contra Sessions— abuso de crianças, imoralidade e discriminação racial — fazem referência a política de fronteira. A última, diz respeito a divulgação de doutrinas contra a Igreja Metodista. Sessions tentou defender a separação de famílias durante um discurso na quinta-feira, no qual ele reprova "amigos da Igreja" que criticaram a política, insistindo que sua aplicação é bíblica, citando, inclusive, Romanos 13.
David F. Watson, decano acadêmico e professor de Novo Testamento no Seminário Teológico Unido, chamou a denúncia de "um desenvolvimento extraordinário."
É "muito incomum" que uma queixa seja feita contra um leigo da Igreja Metodista Unida, disse Watson. Na história recente, vários professores notam que a maioria das queixas foi feita contra membros do clero que tenham realizado um casamento entre, ou até mesmo casado com uma pessoa do mesmo sexo. A segunda maior denominação protestante do país tem sido envolvida pelo debate sobre a inclusão de seus membros LGBT.
John Feagins, ordenado Metodista que ensina política de igreja para pastores, disse que a carta põe em marcha um processo que permite a um pastor ou superintendente distrital a resolver o problema com o acusado pastoral, possivelmente por um processo que envolve um mediador, que os Metodistas chamam de "conciliador”. O conciliador só incide sobre "reparar qualquer dano às pessoas e comunidades, alcançar a verdadeira responsabilidade e trazendo cura para todas as partes", de acordo com o Livro de Disciplina.
A carta conclui: "Estamos ansiosos para entrar em processo de conciliação com Sr. Sessions, pois buscamos com ele a jornada em direção a reconciliação e vida de fé ao Evangelho."
Se nenhuma resolução for alcançada, o caso pode ir a um Comitê de investigação ou, eventualmente, um julgamento de Igreja. No pior cenário, o tribunal poderia remover dele a qualidade de membro, mas o livro de regras da denominação também indica menores punições. Isso poderia incluir coisas como perder a capacidade de exercer funções de delegado ou ensinar na escola dominical.
Feagins observou que a exclusão da afiliação de Sessions não seria o mesmo que uma excomunhão, coisa que não existe na Igreja Metodista Unida.
"O objetivo de um processo como este não é a expulsão de alguém, mas a resolução do conflito — isso é muito importante, porque essas coisas são sobre a relação de uma pessoa para com a Igreja", disse Feagins.
Sessions não respondeu publicamente a denúncia.
Nenhum político Metodista foi acusado de forma semelhante na história recente — pelo menos não em uma carta "desta natureza", disse Kenneth J. Collins, professor no Seminário Teológico Asbury, apontando para o grande número de pessoas que assinaram a denúncia contra Sessions. O ex-presidente George W Bush e a ex-primeira-dama Laura Bush são Metodistas, assim como a antiga Secretária de estado e candidata presidencial democrata Hillary Clinton.
Laura Bush e Hillary Clinton também falaram nesta semana contra a política de fronteiras defendida pelo procurador-geral.
"Eu acho que muitas pessoas de uma variedade de posições teológicas estão muito preocupadas com o que está acontecendo em relação à separação das famílias", disse Watson. "É realmente extraordinário para um funcionário público e leigo ser tratado desta forma. Contudo, não me surpreende dado a natureza do que se passa."
A carta observou que muitas pessoas da Igreja Metodista Unida têm se pronunciado contra a política e a defesa de Sessions.
No início deste mês, bispo Kenneth H. Carter, presidente do Conselho de Bispos, assinou uma instrução juntamente com proeminentes líderes de fé intimando a administração Trump a interromper a separação de famílias.
A rev. Susan Henry-Crowe, secretária-geral do Conselho da denominação para Igreja e Sociedade, divulgou um comunicado na sexta-feira enfatizando os princípios sociais da Igreja Metodista Unida. Henry-Crowe chamou a utilização das escrituras por parte de Sessions de uma "violação chocante do espírito do Evangelho".
A reverenda assinou, junto com o bispo David Graves, que lidera a Conferência da cidade natal do procurador-geral, um comunicado na segunda-feira pedindo aos legisladores que reunissem as famílias.
Os signatários da denúncia contra Sessions — todos religiosos e leigos, mas nenhum bispo — disseram que as "ações e o mal que [Sessions] está causando para imigrantes, migrantes, refugiados e asilados, leva sua Igreja a se dirigir diretamente a ele como uma parte da nossa comunidade."
"Enquanto outros indivíduos e áreas do governo federal estão implicados neste processo, o Sr. Sessions, particularmente, — enquanto membro Metodista de longa data e em uma posição tremendamente poderosa e pública — se encontro no domínio de nossa responsabilidade, sua Igreja", continua. "Ele é nosso, e nós somos seus. Como sua denominação, temos obrigação ética de falar ousadamente quando um dos nossos membros está envolvido em danos significativos no cenário mundial."
A queixa é apenas a mais recente em um dilúvio de resistências baseadas na fé contra a política de separar famílias ao longo da fronteira.
O presidente da Conferência dos Bispos Católicos dos EUA emitiu um comunicado na semana passada condenando a política, e bispos individuais sugeriram enviar uma delegação para a fronteira, a fim de protestar contra tribunais e instituindo "sanções canônicas" para Católicos executores das políticas. Naquela mesma semana, a Convenção Batista do Sul também aprovou uma resolução em sua Convenção, pedindo uma reforma da política de imigração que mantenha "a prioridade da unidade familiar".
Uma gama de outras denominações cristãs como a Igreja Presbiteriana (EUA), a Igreja Episcopal e a Igreja Evangélica Luterana na América também emitiram declarações ou tiveram cartas assinadas pelos seus líderes criticando a política. Da mesma forma, numerosos grupos não-cristãos, tais como Islamic Society of North America, a União do Judaísmo Reformado e líderes budistas externaram suas preocupações.
Só os Metodistas, no entanto, podem ameaçar o procurador-geral com disciplina espiritual, bem como opróbrio. Ted A. Campbell, professor de história da Igreja na Perkins School of Theology da Southern Methodist University, disse que se lembrava de apenas uma recorrência da sanção aplicada a um membro leigo. Na década de 1970, relata, um membro de uma igreja "fundamentalista" se juntou uma pequena congregação Metodista Unida no Tennessee, com a intenção de converter seus membros para suas crenças.
"Aparentemente, o cara era tão desagradável que não conseguiam se livrar dele, então eles buscaram essa parte do Livro da Disciplina e levaram o processo de julgamento de um membro da Igreja adiante, e ele foi sancionado" disse ele.
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EUA. Mais de 600 Metodistas assinam queixa contra o Secretário de Justiça Jeff Sessions que defende a 'tolerância zero' de Trump - Instituto Humanitas Unisinos - IHU