11 Dezembro 2017
O cardeal da Suécia elogiou a decisão do Papa Francisco de conceder maior autoridade às conferências locais dos bispos em relação a como a Igreja Católica traduz seus textos litúrgicos, dizendo que o Vaticano nem sempre tem os recursos ou a capacidade de compreender as várias línguas do mundo.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 08-12-2017. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
O cardeal de Estocolmo, Anders Arborelius, que foi nomeado como o primeiro cardeal da Suécia por Francisco, em junho, disse em uma entrevista ao NCR, no dia 6 de dezembro, que o Vaticano "tem que confiar" nos bispos locais, que entendem melhor as línguas das suas regiões.
"Para nós, é algo muito evidente, porque não há ninguém [na] Santa Sé que entende sueco", disse o cardeal. "É importante que as conferências episcopais possam ter mais voz nesta questão porque... conhecem as línguas que são usadas".
"Claro, tem que haver uma conexão muito profunda com a Santa Sé em todas estas questões", ele disse. "Mas eu acho que [Francisco] fez muito bem em promover as igrejas locais e as conferências episcopais".
Durante a entrevista, Arborelius respondeu a uma pergunta sobre a carta apostólica de Francisco, Magnum Principium, de setembro, (emitindo motu proprio, ou por iniciativa própria), na qual o Papa passou maior responsabilidade sobre as traduções litúrgicas católicas do Vaticano para as conferências episcopais locais.
Na entrevista de meia hora, na Basílica de Santa Maria dos Anjos e dos Mártires, em Roma, nova igreja titular do cardeal, ele também falou sobre sua prioridade de ouvir os leigos, sobre a recepção à exortação apostólico do Papa, Amoris Laetitia, na Suécia e por que ele acha que Francisco o nomeou cardeal.
Na área das traduções litúrgicas, o novo cardeal também abordou a recente notícia de que a Igreja Evangélica Luterana da Suécia passou a incentivar os clérigos a não utilizar a linguagem de gênero em suas liturgias.
A Igreja da Suécia é a maior denominação cristã do país, com cerca de 6,1 milhões de membros, de uma população de aproximadamente 10 milhões no país. Há cerca de 150.000 católicos na Suécia.
Ao ser perguntado sobre o que a Igreja Católica pode aprender com a decisão dos luteranos, o cardeal disse: "É importante dizer que temos que ser fiéis à linguagem da Bíblia... mas também para explicar às pessoas que o mistério de Deus está acima da diferença entre homem e mulher".
Segundo ele, o objetivo é "encontrar um equilíbrio entre o mistério de Deus e a linguagem da Bíblia e a tradição".
"O próprio Jesus fala sobre seu pai como Senhor e Deus", disse. "Temos de ser fiéis ao que Jesus [disse] e explicá-lo, claro".
Falando sobre Amoris Laetitia, que exortou os bispos e sacerdotes a não avaliar o estatuto familiar das pessoas com base em regulamentos canônicos rígidos, Arborelius disse que o documento não tem atraído grande atenção na Suécia.
"Estou surpreso que tão poucas pessoas tenham reagido", disse ele, que lidera a única diocese católica da Suécia desde 1998. "Realmente, não houve nenhum pedido de maiores explicações sobre a situação".
Referenciando o trabalho dos tribunais canônicos da diocese de Estocolmo, que determinam se os casamentos podem ser anulados na igreja, Arborelius disse que entende que a mensagem do Papa em Amoris Laetitia seja sobre avaliar cada caso em particular e não aplicar sempre as mesmas normas gerais.
"Há tantas questões diferentes, e temos de olhar para cada caso como um caso único, exclusivo", disse o cardeal. "Então é muito difícil estabelecer regras gerais".
"Acho que se nós entendemos a mensagem do Papa, significa que temos de olhar para cada caso com os olhos de Cristo", disse, perguntando: ''Como o Senhor teria resolvido este problema neste caso?”
"Claro, temos muita ajuda da tradição, do direito canônico", afirmou. "Mas é uma situação pastoral que também é muito diferente e única."
Ele relembrou o trabalho de seus tribunais canônicos no contexto da demografia da Igreja Católica, na Suécia, que inclui muitos convertidos de outras religiões e também muitos refugiados católicos, que têm sido parte da contínua migração do Oriente Médio para a Europa.
Em 2015, no auge da crise da imigração, autoridades suecas disseram ter aceitado mais de 160.000 refugiados que saíram da Síria, do Afeganistão e do Iraque.
O cardeal disse que seus tribunais muitas vezes encontram casos de convertidos que foram casados antes de se tornar católicos e querem ter clareza sobre a união anterior, não católica, bem como casos de refugiados que tinham casamentos arranjados em seus países de origem.
"Metade dos casos em nossos tribunais são de pessoas do Oriente Médio, porque muitos casamentos lá eram arranjados entre as famílias", comentou. "E quando eles vêm para a Suécia, a posição da mulher é totalmente diferente."
"Vivemos em uma situação muito, muito mista, na qual há tantos tipos diferentes de casos e problemas que é muito difícil estabelecer regras gerais", disse. "Temos que apenas tentar ajudar as pessoas a resolverem as coisas."
Arborelius também abordou a reação a uma sugestão que ele tinha feito em uma entrevista ao NCR, em junho, de que Francisco ponderasse sobre a criação de um órgão consultivo especial de mulheres semelhante ao Colégio dos Cardeais para dar mais oportunidade para a liderança feminina na igreja.
O cardeal disse que tinha recebido feedback negativo a essa ideia. "Algumas mulheres eram contra", ele disse. "Elas disseram: 'Nós temos que estar no mesmo nível'."
"Algumas pessoas dizem que é bom, mas algumas mulheres dizem que temos que ser iguais com os homens, temos de ter um grupo misto de pessoas, não só mulheres", disse Arborelius. "É uma questão [para ser] discutida."
Questionado sobre o discurso que Francisco proferiu aos novos bispos de todo o mundo em setembro, quando o Papa disse aos prelados para ouvir os leigos e consultá-los sobre a liderança de suas dioceses, Arborelius respondeu: "Nos nossos países, é muito natural, porque vivemos em uma sociedade muito democrática e depende-se muito da ajuda dos leigos."
"É importante ouvir as... pessoas", disse o cardeal. "E muito do meu tempo é dedicado a falar com todos os tipos de leigos".
"Claro, não posso satisfazer todos os desejos deles, mas é importante apenas ouvir as pessoas, acredito", observou. "Porque muitas pessoas sentem que não há ninguém que escute. Não se pode fazê-las felizes, mas pode-se tentar descobrir o que é bom."
Arborelius disse que ainda não sabe por que Francisco o escolheu como um dos cinco prelados que se tornaram cardeais no consistório de 28 de junho. Mas disse que recebeu uma visita, há algumas semanas, de uma pessoa da Argentina que disse que o Papa disse para eles transmitirem uma mensagem.
"Ele mandou uma pessoa da Argentina para falar comigo sobre a nova evangelização", disse o cardeal, sugerindo que a escolha de Francisco "tem algo a ver com a sociedade secularizada da Suécia — que a Igreja ainda exista lá, que continue crescendo, mesmo nesse contexto."
"Eu acho que poderia haver alguma razão por que a Suécia é considerada um dos países mais secularizados do mundo," disse Arborelius. "E ainda assim, a Igreja Católica nos países nórdicos é uma das poucas partes da Europa onde a igreja está crescendo".
O cardeal expressou satisfação com sua igreja titular, a Basílica de Santa Maria dos Anjos e dos Mártires, uma igreja do século XVI projetada por Michelangelo que incorpora as grandes ruínas das Termas de Diocleciano, do século III.
O último cardeal que teve esta como sua igreja titular foi o cardeal de Baltimore, William Keeler, que morreu em março. A longa fila de cardeais que estiveram nesta posição inclui, também, o Cardeal de Mantiveram do século XVII, Federico Borromeo, irmão de São Carlos Borromeo.
Arborelius observou que enquanto a paróquia, localizada na Piazza della Repubblica, em Roma, é a antiga igreja oficial da Itália e ainda é usada para funerais de Estado, também tem ministérios sociais ativos para os carentes.
Depois de conhecer os funcionários e voluntários da paróquia no dia de 5 de dezembro, "Ficamos muito admirados", ele disse. "Primeiro, achamos que é uma obra de arte esplêndida, maravilhosa. E é. Mas ao mesmo tempo eles têm este trabalho muito bom pelos pobres."
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Cardeal Arborelius, da Suécia, elogia reforma litúrgica na tradução - Instituto Humanitas Unisinos - IHU