20 Novembro 2017
O ELEITOR VOLÚVEL NO FACEBOOK
Comecei a perceber que a interface do Facebook torna praticamente invisível uma operação bastante simples: a curtida em um post de uma página. Você, por exemplo, já deve ter curtido um ou outro post de político. E ninguém foi avisado disso. Sem a ação do "big brother", qualquer pessoa se encoraja a dar aquele like maroto em post de candidato a presidência.
Somado a isso, percebi um outro fenômeno. Em página de presidenciável, quem manda nela é o convertido (o militante). Ele comenta, ele compartilha, ele curte.
Então fiz uma pequena operação metodológica. Extrai todos os posts de candidatos à presidência em 2018, datados de 01 a 06 de novembro de 2017. Identifiquei cada um dos usuários. E exclui da planilha os convertidos, ou seja, aqueles que curtiram posts de apenas um candidato.
Sobraram os indecisos, ou os volúveis, como bem me chamou atenção Jose Roberto de Toledo - aqueles que curtiram posts de ao menos dois candidatos.
Pronto. Era o que eu precisava para responder a uma questão simples: o volúvel está preferencialmente entre quais candidatos?
Eis os números. As pessoas geraram 811.776 likes em 153 posts das páginas de oito candidatos. Esses likes foram realizados por 453.483 usuários únicos. E destes 15.133 pessoas deram likes em posts de mais de um candidato.
Resultado:
- Quem também curte posts de Lula, tende a curtir mais Ciro Gomes.
- Quem também curte posts de Bolsonaro, tende a curtir mais Álvaro Dias.
- Quem também curte posts de Marina, tende a curtir mais Bolsonaro.
Claro. Isso é apenas um recorte temporal (os seis primeiros dias de novembro). Mas já abre uma boa discussão.
ATUALIZAÇÃO: penso que a proximidade de eleitores pode ser motivada pelo conteúdo de posts daquela semana. Por exemplo: um post sobre Sérgio Moro pode fazer com que um eleitor fique entre Marina e Bolsonaro, evitando Lula. Isso implica dizer que é necessário outra frente de trabalho, que é a análise do conteúdo das postagens. Então, dando um spoiler, já iniciamos no Labic a modelagem de tópicos eleitorais, o que vai ajudar muito a compreensão deste e de outros fenômenos.
PS: Bolsonaro só perdeu em engajamento de likes/dia no dia 6 (para Álvaro Dias).
PS2: A quantidade de pessoas dando likes em Bolsonaro, Lula e Marina, respectivamente, foram: 295.233; 34.273; 6.929.
Número de likes em posts por dia.
Número de usuários que também dão like em posts de Bolsonaro e dos demais candidatos.
Número de usuários que também dão like em posts de Bolsonaro e dos demais candidatos.
Número de usuários que também dão like em posts de Marina e dos demais candidatos.
Parece até que ele nunca foi presidente e que, quando podia, não fez absolutamente nada para mudar a regressividade de nosso sistema tributário. E agora - só agora - vem falar que rico tem que pagar mais imposto (sem nem especificar o que faria para isso).
Uma das coisas mais irritantes na posição do PT hoje em dia é querer nos fazer esquecer que o partido presidiu o Brasil por 12 anos.
Houve no Rio de Janeiro, no dia 17 de junho de 2013, um acontecimento chamado Batalha da ALERJ. Foi um movimento espontâneo, sem liderança de nenhuma organização política específica. As pessoas iam aderindo conforme viam a coisa acontecer. Um momento de insurreição popular (que, inclusive, ganhou da polícia).
Independente da avaliação que cada um faça desse evento e das manifestações de 2013, vocês acham possível fazer manifestações na ALERJ depois disso? Acho que não. A não ser que fosse para levar flores para os deputados. Como está todo mundo com muita raiva, sobretudo diante da situação do RJ (com servidores sem receber salário!), melhor pensar urgente em se manifestar em outro local. Ontem senti - pela primeira vez em muito tempo - que as pessoas querem ir pra rua contra Picciani e sua turma. E - pela primeira vez em muito tempo - eram pessoas de espectros políticos distintos. É uma janela que vai se fechar rapidamente, se não conseguirmos agir noutro local e num formato distinto do de ontem.
Está na hora de voltar a pensar grande sobre o Brasil, pessoal, para que possamos recuperar o fôlego. Temos muitos pontos de partida.
Há algum tempo, Carlos Lessa me pediu que revisitasse sucintamente as obras de Giberto Freyre, Sérgio Buarque, Caio Prado, Celso Furtado e Darcy Ribeiro à luz do Brasil contemporâneo. Escrevi então "Uma certa ideia de Brasil", publicado na Enciclopédia de Brasilidade, que não teve circulação comercial. Está no link.
Abraços,
Cesar Benjamin
Hoje completa um ano da publicação de "A terra treme" (AnnaBlume), co-organizado com Márcio Pereira, onde publico "O 18 de Brumário brasileiro", um ensaio de 60 páginas sobre o período da restauração, entre as jornadas de junho de 2013 e o impeachment de agosto de 2016. Aquela foi uma tentativa parcial e fragmentária, na contracorrente, de inserir-se na multiplicidade de interpretações do Brasil recente. Fico perplexo como esse campo da história do presente está congestionado por um tipo de doxa esquerdo-universitária, a de que existiria uma investida neoliberal, um avanço das direitas e um desmantelamento dos direitos sociais e coletivos, que é responsável pela crise em que vivemos e que, portanto, nos compeliria às trincheiras e frentes amplas.
Recordar é viver:
1) Quem quebrou o país foi o governo progressista. Depois da reeleição, em 2015, quando já tinha ciência que a economia estava no brejo, chegou a reconhecer os erros e pediu socorro aos neoliberais, chamando-os para o governo, a fim de realizar o ajuste. A distância entre as promessas de guinada à esquerda e a realidade conduziu as esquerdas a encampar as guerras culturais, ou seja, deslocaram a guinada à esquerda apenas ao plano simbólico de uma retórica radical, mas sem subjetividade incorporada que não suas próprias fileiras, cada vez mais autocentradas, gregárias e comprazidas em pertencer a uma casta de pessoas de bem, politicamente corretas. Isto provocou acrobacias argumentativas, por exemplo, vestindo Dilma de heroína da resistência, ela, uma gerente autoritária e unidimensional, que acelerou o solapamento das bases políticas, econômicas e sociais do governo e terminou derrubada pelos próprios aliados, por sua incompetência total. O discurso do golpe é uma matriz irresponsável de relatos e narrativas que impossibilita qualquer construção para além dos cercadinhos e puxadinhos do próprio progressismo derrotado. O resultado é que a derrota deles se torna o derrotismo de todo mundo que compartilha do mesmo espectro político-ideológico, uma crise existencial que carrega a subjetividade de neuroses e paranoias paralisantes. O tal golpe no máximo foi um peteleco, pois foram removidos do governo como lacaios de que os senhores não precisam mais: xô, fora.
2) Vivemos hoje a continuação desse ajuste, agora imposto como solução única. A falta de imaginação da esquerda, diante de uma situação política em aberto e uma sociedade bastante mobilizada e conectada, denota sua incapacidade de libertar-se de Lula e do PT, e empurra o potencial de articular projetos de mudança e transformação para longe de seus símbolos, discursos e engrenagens organizativas. Uma repercussão dessa situação pode ser encontrada nas municipais do Rio de Janeiro em 2016, quando o candidato do PSOL, Marcelo Freixo, tinha legitimidade histórica e respaldo popular (27% dos votos na eleição anterior) para se colocar como alternativa à coalizão mafiosa que comandava os negócios da cidade. Preferiu derreter abraçado no petismo moribundo, encampando a narrativa do golpe e permitindo que um candidato que era aliado de Lula e ex-ministro de Dilma, o oponente Crivella, um falso outsider que costumava estagnar na faixa de 20-25% dos votos, ocupasse o campo da ruptura antipolítica e da formulação de outra atitude diante da crise. Erro estratégico porém consciente, o que mostra como há uma esquerda que só se sente confortável nos ombros de Lula e do PT, contente em sua síndrome de grilo falante. O efeito disso no campo do pensamento é a atitude de vigilante intelectual, aquele que se presta ao trabalho de denúncia das lógicas da dominação e das manobras escusas do poder, quase por dever moral, como se estivesse constantemente nos alertando dos perigos que ele desmarcara. O paroxismo dessa atitude é o patrulheiro ideológico que vai preferir fazer o mais fácil: denunciar e desmascarar os vizinhos, com o que se compraz de sua própria moral superior, um bem em si mesmo.
3) O governo Dilma não caiu por suas virtudes, mas por seus erros e defeitos em todos os âmbitos que se queira olhar. O primeiro ajuste econômico, na realidade, foi em 2011, com a desoneração fiscal de centenas de bilhões de reais para as campeãs nacionais, entre outras benesses, as mesmas empresas que refinanciavam o sistema político através do Petrolão e outros propinodutos, num círculo vicioso institucionalizado como projeto político. O longo Junho de 2013, cuja máxima intensidade foi também onde mais intolerável era a coalizão PT-PMDB, no Rio de Janeiro, foi uma resposta afirmativa a essa crise, em meio a um ciclo global de lutas que já se afastava dos velhos quadradinhos da luta partidária e ideológica entre esquerda e direita.
4) Finalmente, o governo Dilma não errou porque se viu constrangido a alianças e estratégias dadas pela direita pertencente à coalizão. Ao contrário, o ano de 2011 foi o de maior margem de manobra, em termos de excedentes orçamentários e apoio político e social. O principal erro foi justamente no que o governo resolveu determinar como direção geral estratégica: o neodesenvolvimentismo à brasileira, um tremendo programa de saque da riqueza social. Um desenvolvimentismo que turbinou as políticas de megabarragens, megaeventos, remoção de pobres, grandes obras superfaturadas, operações de choque de ordem, empreendimentos faraônicos que não tiveram sequer estudos técnicos de demanda e viabilidade, aparelhamento generalizado e artérias alargadas para a corrupção sistêmica.
É preciso, sim, um dia esquecer tudo isso. Exatamente porque *não* estamos esquecendo, porque ainda sobrevive no Brasil enquanto gangrena político-existencial, que é preciso novamente lembrar. Lembrar é remontar às forças e afetos que se atualizam em nós e assim preparar a amplitude da liberdade criativa, dizia o filósofo Henri Bergson. Não dá pra passar a borracha no passado recente, quando é o que ainda nos tensiona e interpela. Esquecimento que importa é sempre ativo e sustentado.
Quando você pensa que já viu tudo...
Um certo Tavares Vandal me acusa de colonizado e racista, porque a rede pública está ensinando mais crianças a ler partituras musicais, que são uma criação do que ele chama de Europa branca.
O curioso é que ele me xinga em português, que também é uma criação da Europa branca e foi trazido para cá pelo colonizador.
Que tal me xingar em banto ou em tupi-guarani, seu Tavares?
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