29 Mai 2017
“Com os sucessivos desastres na Cracolândia ao longo da semana, a fama de bom gestor de Dória virou pó, provocando, inclusive, a demissão de sua Secretária de Direitos Humanos que classificou a operação de "desastrosa". O manual de arrogância e violência de Dória contrasta com todas as recomendações internacionais, técnicas e médicas que são taxativas em afirmar que a questão da dependência química é uma questão de saúde pública e não uma questão policial ou criminal. O grande gestor insurgiu-se contra a prudência desse consenso do bom senso. O resultado foi a criação de várias cracolândias e de uma nova Cracolândia, ainda maior, na Praça Princesa Isabel”, constata Aldo Fornazieri, professor da Escola de Sociologia e Política, em artigo publicado por Jornal GGN, 29-05-2017.
Segundo ele, “Dória não está fundamentalmente focado em governar a cidade de São Paulo – avalia o sociólogo. Quer ser presidente. Para isso, busca criar um culto em torno de si. Quer conquistar devotos a partir da imagem de que ele é um grande gestor, um grande transformador. Faz promessas grandiosas, anuncia programas mirabolantes, zera filas, acaba com Cracolândias, faz e desfaz a cidade. A dor, o desemprego, a trágica desgraça dos drogados e dos moradores de rua, as horas perdidas no trânsito, o crescimento das mortes nas marginais, tudo se transforma em "cidade linda" sem que nada aconteça e mesmo que as condições da cidade piorem. Com esse passe de mágica, os devotos crescem, principalmente fora de São Paulo”.
Em nome do combate ao tráfico de drogas, da cidade linda e da reurbanização da região da Luz, o prefeito Dória, com o apoio do governo do Estado, desencadeou um verdadeiro pogrom na região da Cracolândia. Pogrom é um termo de origem russa nascido para designar as ações de massacres contra judeus no século XIX. Mas o termo se generalizou e designa ações violentas (assassinatos, expulsões e agressões) praticadas pelo Estado, por forças policiais ou paramilitares contra grupos sociais ou étnicos específicos. Essas ações transitam desde massacres e extermínios até a dispersão e o desalojamento geográfico desses grupos vitimizados. O nazismo usou os pogroms em larga escala. O pogrom nazista mais famoso é conhecido como "A Noite dos Cristais", ocorrido em 1938, no qual foram queimadas sinagogas, judeus assassinados, lojas saqueadas e destruídas, tudo com o beneplácito do Estado nazista.
O pogrom oficial de Dória não chegou a tanto, mas teve dispersão de uma comunidade de doentes e dependentes químicos, várias bombas, agressão policial, lojas fechadas, pessoas despejadas, derrubada de casas sobre moradores, interdição de áreas com uso de força armada, trabalhadores e crianças saindo apenas com a roupa do corpo e pessoas proibidas de entrar em suas próprias casas. Expressando a ideologia típica da elite branca dos Jardins, o prefeito Dória mostrou-se valente contra doentes e moradores de rua e, no alto da sua arrogância, decretou, por ato de vontade, o fim da Cracolândia para todo o sempre. Governar por atos de vontade e ao arrepio da lei é uma conduta típica dos totalitários de todos os tipos e do nazismo em particular.
Com os sucessivos desastres na Cracolândia ao longo da semana, a fama de bom gestor de Dória virou pó, provocando, inclusive, a demissão de sua Secretária de Direitos Humanos que classificou a operação de "desastrosa". O manual de arrogância e violência de Dória contrasta com todas as recomendações internacionais, técnicas e médicas que são taxativas em afirmar que a questão da dependência química é uma questão de saúde pública e não uma questão policial ou criminal. O grande gestor insurgiu-se contra a prudência desse consenso do bom senso. O resultado foi a criação de várias cracolândias e de uma nova Cracolândia, ainda maior, na Praça Princesa Isabel.
O outro quase consenso contra o qual Dória se insurgiu é o de que a estratégia da Guerra às Drogas fracassou. Estudos e a experiência internacional mostram que a Guerra às Drogas, até agora, proporcionou gastos de trilhões de dólares e atingiu principalmente pequenos produtores, traficantes intermediários e os consumidores. Na ação espetaculosa do prefeito contra a Cracolândia foram presos 38 traficantes e apreendidas algumas armas. O que consta é que nenhum desses presos é um grande traficante, um chefe do tráfico em São Paulo. Ou seja, os extraordinários gestores de São Paulo estão enxugando gelo.
Não satisfeito com o desastre de sua violência contra doentes indefesos, o prefeito quis ir mais longe no seu autoritarismo. Anunciou internações forçadas de dependentes químicos e buscou o respaldo na Justiça para perpetrar este ato contra a liberdade das pessoas e contra os direitos civis de doentes. Um juiz, cuja qualificação é inominável, concedeu o aval para o arbítrio, mas logo derrubado pelo desembargador Reinaldo Miluzzi. Em seu despacho o desembargador afirma que o pedido da prefeitura é "impreciso, vago e amplo e, portanto, contrasta com os princípios basilares do Estado Democrático de Direito, porque concede à municipalidade carta branca para eleger quem é a pessoa em estado de drogadição vagando pelas ruas de São Paulo". Ou seja, o desembargador compreendeu o caráter arbitrário emboscado na petição da prefeitura. Além disso, ele suspendeu o sigilo judicial do pedido, pois isto fere o mais elementar princípio democrático que é o da publicidade e transparência dos atos dos agentes públicos.
Como se sabe, o consenso médico, técnico e jurídico admite a internação compulsória em casos especiais e com medidas adequadas, sempre a partir de uma abordagem e avaliação individualizadas do dependente. Dória se insurge contra este consenso, não por conta de erro ou de não compreensão das circunstâncias, mas pelo capricho autoritário de querer fazer valer a sua vontade. Vontade que, no caso da Cracolância, mistura ideologia autoritária, rejeição aos pobres e moradores de rua, racismo, interesses econômicos, especulação imobiliária e pressa em se projetar nacionalmente em face de sua aspiração de ser candidato à presidente da República no próximo ano.
Várias das principais ações de Dória até o momento mostram que ele governa contra a cidade. No caso da Cracolândia, esta sucessão de erros, este ataque ao bom senso e à prudência, são demonstrações de desumanidade e de falta de piedade para com aqueles que precisam de ajuda em face de sua desgraça. O prefeito mandou cortar parte do programa Leve Leite, um programa suprapartidário, pois foi criado por Maluf e mantido por Pitta, Marta, Serra Kassab e Haddad. Da mesma forma, a Virada Cultural, tal como vinha sendo editada, abrigava um consenso suprapartidário, pois os últimos prefeitos, independentemente de partidos, mantinham o mesmo formato. Em sua fúria destruidora, a gestão Dória a modificou, resultando num fracasso.
No seu excesso de esperteza, o prefeito vem fazendo o seguinte: rebatiza programas de gestões anteriores como se fossem novos e paralisa os programas anteriores sem tirar do papel aqueles rebatizados. Vive mais em eventos, festividades, em viagens para Dubai, Seul, Europa e Estados Unidos para promover negócios privados enquanto abandona a cidade à sua própria sorte. Semáforos apagados, buracos nas ruas, lixo espalhado, falta de zeladoria, hospitais municipais sem remédios e leitos, trânsito cada vez mais lento é o que não falta.
Dória não está fundamentalmente focado em governar a cidade de São Paulo. Quer ser presidente. Para isso, busca criar um culto em torno de si. Quer conquistar devotos a partir da imagem de que ele é um grande gestor, um grande transformador. Faz promessas grandiosas, anuncia programas mirabolantes, zera filas, acaba com Cracolândias, faz e desfaz a cidade. A dor, o desemprego, a trágica desgraça dos drogados e dos moradores de rua, as horas perdidas no trânsito, o crescimento das mortes nas marginais, tudo se transforma em "cidade linda" sem que nada aconteça e mesmo que as condições da cidade piorem. Com esse passe de mágica, os devotos crescem, principalmente fora de São Paulo.
Dória inventa títulos entusiasmados para programas que não existem, anuncia o começo e o fim de tudo, sem que nada mude, usa palavras envernizadas para ações que não são nem explicadas e nem detalhadas. No seu manual, ensina-se que é preciso combinar promessas vagas com conceitos nebulosos mas atraentes, tudo embrulhado no entusiasmo ardente da demagogia. Se algo sair errado, Dória se retira de campo e terá sempre um secretário, um auxiliar ou um inimigo como bodes expiatórios.
Para Dória não importa a dor da família dos drogados, não importa o vazio da alma do dependente químico, não importa da desgraça do morador de rua, não importam as atribulações dos trabalhadores, não importam as angústias dos desempregados, não importam a falta do pão e do leite para as crianças. Tudo isto é coisa feita, que atrai mais desgraça. O que importa para ele é o brilho do poder pelo poder, as luzes das festas, a fama da celebridade, o arrogante conforto da riqueza. Dória é o mais lídimo representante da ideologia perversa da elite branca dos Jardins. Esta mesma ideologia que interdita diretos, hipoteca o futuro do povo e condena o Brasil a um passado eterno de iniquidades e injustiças.
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Doria: Nazismo na Cracolândia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU