09 Mai 2017
A África, sob a atenção de muitos por causa da viagem que, há 10 dias, o papa fez ao Egito, está propondo ao mundo distraído outro evento que, tendo ocorrido há um século, apresenta hoje a conta para a Alemanha e, idealmente, a toda a Europa colonialista: o genocídio dos Herero.
A reportagem é de Luigi Sandri, publicada no jornal Trentino, 08-05-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O pano de fundo: as potências europeias, no fim do século XIX, considerando ter o pleno direito moral, dividiram a África entre si. Naquele contexto, Berlim assumiu, dentre outras coisas, o protetorado da Namíbia, isto é, a África do Sudoeste, um território tão vasto quanto quase três Itálias, encravado entre a Angola e a África do Sul, em grande parte desértico e pouco povoado.
Em 1904, os Herero – a maior etnia autóctone, à qual, depois, se associou a dos Nama – começaram a se rebelar contra os alemães invasores, que os tratavam duramente também na extração de diamantes: e devastaram algumas colônias, matando centenas de pessoas.
A reação das tropas de ocupação, lideradas pelo tenente-general Lothar von Trotha, foi muito dura: derrubado, na batalha, o “exército” dos nativos, os sobreviventes foram expulsos para regiões inacessíveis, onde muitos morreram de fome. Os alemães envenenaram os poços que forneciam água para os autóctones. Era morto quem se atrevesse a sair das áreas reservadas para os nativos. Outros foram usados como escravos ou como cobaias humanas em experiências médicas.
Depois de décadas de esquecimento, há cerca de 40 anos, foram missionários luteranos alemães que reabriram aquelas páginas terríveis, começando a se fazer perguntas autocríticas, porque, no início do século XX, as suas missões, embora não diretamente envolvidas na repressão dos Herero, colocaram-se, de fato, ao lado dos seus irmãos colonialistas.
E agora, no fim de abril, a própria Igreja Evangélica na Alemanha (EKD) proferiu um “mea culpa” solene: “Confessamos hoje expressamente a nossa culpa para com o povo namíbio e diante de Deus. Do fundo dos nossos corações, pedimos aos descendentes das vítimas e a todos aqueles que sofreram com o papel colonial da Alemanha o perdão pelo mal cometido”.
E a bispa Petra Bosse-Huber comentou: “A nossa declaração não apagará as injustiças sofridas pelos Herero. No entanto, expressa o nosso compromisso para que o genocídio seja reconhecido como tal”.
E não: nesta quarta-feira, inicia em Windhoek, capital da Namíbia, a Assembleia Luterana Mundial, que mais uma vez se defrontará com a tragédia de um século atrás. Remorsos unicamente eclesiais? “Nada disso! De fato – diz um diplomata no Cairo – o próprio governo de Angela Merkel está tratando agora com o governo namíbio para estabelecer ressarcimentos concretos por aquilo que muitos historiadores consideram o primeiro genocídio do século XX. Geralmente, considera-se que esse ‘primado’ seja dos armênios, que, com o Império Otomano, foram exterminados a partir de 1915. Talvez, porém, devêssemos dizer que, no século passado, o primeiro genocídio foi o sofrido pelos Herero por obra dos alemães, na Namíbia, nos anos 1904 a 1907.”
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Genocídio na Namíbia: o "mea culpa" dos luteranos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU