09 Fevereiro 2017
O arcebispo de Brisbane, na Austrália, Dom Mark Coleridge, disse não acreditar que o celibato seja um fator causador dos abusos sexuais dentro da Igreja Católica.
A reportagem é de Christopher Knaus, publicada por The Guardian, 08-02-2017. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Coleridge também falou que pouco sabe sobre quantos bispos estão quebrando os votos de celibato e crê que ele, na qualidade de bispo, não tem o direito de perguntar-lhes sobre a vida sexual que levam.
“A relação entre um bispo e um sacerdote, ou de um bispo com qualquer outro ser humano, é uma relação muito delicada”, disse.
“Há certas coisas que eu não tenho o direito de saber. Tento imaginar como isso seria na prática, como eu iria descobrir os detalhes da vida sexual de um padre?”
Nesta quarta-feira, a questão do celibato surgiu novamente diante da Comissão Real que analisa as respostas institucionais dadas a casos de abuso, na medida em que os investigadores tentam entender as causas culturais que permitiram a ocorrência de abusos sexuais e o seu acobertamento numa escala tão grande.
A Comissão Real ouviu a opinião de especialistas nesta quarta-feira pela manhã, incluindo o professor de direito da Universidade de Sydney Patrick Parkinson.
Parkinson disse acreditar que a combinação do celibato com o isolamento emocional entre o clero é um fator causador dos casos de abuso sexual infantil.
“A combinação do celibato obrigatório (...) junto com o isolamento emocional de estar numa posição de responsabilidade pastoral é, penso eu, um fator causador”, disse Parkinson.
“Penso que isso explica alguns dos números chocantes que temos visto, explica o risco aumentado, que eu acho que ainda existe, o risco aumentado de pedofilia na comunidade católica, em comparação com o risco geral (...) da população como um todo”.
Mas Coleridge, que antes fora arcebispo de Canberra e Goulburn, disse que não acha que o celibato, por si, seja um fator causador. Falou que a questão sobre se isso é um fator agravante ainda “está sob debate”.
O prelado disse que a ideia de que os humanos não poderiam existir sem a atividade sexual é equivocada. Esta atividade não é, disse ele, como a alimentação ou a água. Ele também descordou de que o celibato deixa o clero emocionalmente isolado.
“O celibato conduz a uma espécie de vida solitária, mas estar solitário não tem a ver com estar na solidão”, disse o religioso. “Eu vivo uma vida celibatária há 50 anos (...) e não posso dizer que tenho sido atormentado pela solidão. Tive de aprender a viver uma vida solitária criativa, certamente, mas isso pode ser um tipo de enriquecimento”.
A Comissão Real ouviu o testemunho na terça-feira dado pelo padre americano e ex-canonista para o Vaticano, o Pe. Thomas Doyle, que disse acreditar que a metade de todos os padres não conseguem se manter-se fiéis ao voto celibatário.
Perguntado sobre o tema, Coleridge disse que não faz ideia de quantos padres dentro de sua diocese eram celibatos. Disse que os números apresentados por Doyle podem ser exatos, mas que não era função de um bispo perguntar sobre a atividade sexual dos padres.
Isso levou ao presidente da Comissão, Peter McClellan, a perguntar para Coleridge se, dada a posição que ocupa como bispo, ele deveria saber tais coisas.
Coleridge respondeu: “Vossa dignidade, não posso saber dos detalhes do comportamento sexual do clero com o qual trabalho, como eu poderia saber algo assim?”
“Não tenho o direito de chegar a um padre que não é um funcionário meu e dizer: ‘Desculpa, o senhor está mantendo alguma relação sexual?’”
Perguntaram a Coleridge sobre se ele recorreria às autoridades civis, caso fosse confrontado com provas de abuso sexual. O prelado disse que sim, e que acredita que outros bispos, “à luz do que estamos aprendendo”, fariam o mesmo.
Também no painel esteve o presidente da “Catholics for Renewal”, Peter Johnstone, cujo grupo há tempos vem criticando a maneira como a crise de pedofilia na Igreja é tratada.
Johnstone afirmou que o Direito Canônico deve ser mudado para criar um requisito “sem ambiguidades” para os padres reportarem casos de abuso sexual. Disse que é “muito triste” que os governos, via programas de informação obrigatórios, tenham de considerar a promulgação de leis para tornar crime a prática de não relatar casos de abuso.
“É muito triste que tenhamos de falar sobre requisitos criminais para fazer com que a Igreja de fato relate [os casos às autoridades]”, disse Johnstone.
A Comissão Real está igualmente considerando a falta de representação feminina em papéis de comando dentro da Igreja.
Johnstone falou que “qualquer pessoa que entenda o desafio de comandar uma entidade” sabe que o equilíbrio de gênero é essencial.
“As mulheres formam a metade da população e deveriam estar envolvidas na boa governança, e qualquer líder sensível em toda a sociedade sabe que, na verdade, é assim que se lidera”, disse ele.
Coleridge disse que trabalhou com muitas mulheres em sua diocese que estiveram em postos de influência.
“Trabalhei muito próximo de, e tomei decisões com, um grupo maior de mulheres e homens, nenhuma dessas pessoas eram ordenadas”, disse.
A audiência continua ainda esta semana.
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Austrália - Arcebispo diz que o celibato do clero não é causa de pedofilia na Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU