25 Outubro 2016
De Ésquilo à mecânica quântica: o novo livro do teólogo italiano Vito Mancuso (Il coraggio di essere liberi) investiga, entre classicismo e ciência, o mais humano dos conceitos: a liberdade.
O jornal La Repubblica, 22-10-2016, publicou um trecho da obra. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O conceito de liberdade nasceu na Grécia, em âmbito político. Uma das primeiras testemunhas sobre o assunto não provém da filosofia, mas da literatura, precisamente do mais antigo dos trágicos, Ésquilo, na sua obra "Os persas".
Em Susa, capital do império, a rainha Atossa, esposa do imperador anterior, e mãe do novo imperador, Xerxes, espera, tomada por maus presságios, o retorno da expedição militar do filho contra a Grécia e, para vencer a espera enervante, pede notícias sobre os inimigos: se eles têm um exército forte, se possuem riquezas, se são bons com o arco. Por fim, faz a pergunta crucial: "Quem é o seu chefe?". É-lhe dada a seguinte resposta: "Orgulham-se de não serem escravos de homem algum, súditos de ninguém". Com essas palavras de Ésquilo que remontam a 472 a.C., inagura-se, no Ocidente, o conceito de liberdade.
Mas Ésquilo, nas suas obras, apresenta, na maioria das vezes, uma concepção de mundo oposta, isto é, sob a insígnia da necessidade: por exemplo, nos "Persas", ele diz que Ate (a filha de Zeus que personifica a cegueira que leva ao erro) "empurra o mortal para dentro da rede bem apertada"; ou que a "necessidade obriga os mortais a suportarem infortúnios"; ou ainda "quem iniciou todo esse desastre foi a vingança divina que não perdoa, ou um demônio malvado vindo sabe-se lá de onde"; no "Agamenon", ele menciona "os poderes divinos que, prepotentes, governam o sacro leme do cosmos"; nas "Coéforas", ele escreve que "devemos venerar o poder divino que o céu governa".
Para Ésquilo, portanto, os seres humanos não são livres no sentido de independentes dos poderes superiores, mas, ao contrário, estão sujeitos a potências maiores às quais devem prestar contas, a um "jugo de necessidade" que sempre julga e, muitas vezes, também determina o seu agir.
No entanto, ele declara que o seu povo não quis se submeter ao poder muito superior do império persa que pretendia se impor em nome da cega necessidade da força e, quanto à constituição política, descreve os gregos como homens livres, "súditos de ninguém", além de estar consciente do fato de que o dever de se submeter a potências maiores não priva os seres humanos do mérito quando agem bem e da culpa quando agem mal, como aparece, nos "Persas", a partir da diferença entre o sábio imperador Dario e o tolo filho Xerxes.
O jugo da necessidade, portanto, não impede a responsabilidade pessoal, a possibilidade de responder às circunstâncias em primeira pessoa de um modo ou de outro, isto é, não impede a liberdade. A contradição detectada em Ésquilo manifesta a clássica oposição entre necessidade e liberdade, tão antiga quanto o pensamento e resumível nesta alternativa: o mundo é um processo necessário e lógico e, consequentemente, também desprovido de liberdade; o mundo é um processo livre e criativo e, consequentemente, também desprovido de um desígnio lógico e sensato. Os filósofos se dividem entre aqueles que atribuem o primado à necessidade e ao sentido, e aqueles que atribuem à liberdade e ao absurdo.
As coisas, aliás, se complicam ainda mais se levarmos em consideração a física contemporânea. Aqui, os grandes físicos, que por natureza também devem ser um pouco filósofos, assim como os grandes filósofos devem ser um pouco físicos, se dividem: ao campo da necessidade, pertence Einstein com a teoria da relatividade; ao campo da liberdade, pertence Bohr com a mecânica quântica.
A teoria da relatividade diz respeito ao espaço-tempo, à energia e à gravitação, às estrelas e às galáxias; a mecânica quântica diz respeito ao comportamento dos átomos e das partículas subatômicas. A primeira reina no infinitamente grande; a segunda, no infinitamente pequeno.
Provavelmente, foi observando tudo isso que um dos principais protagonistas da mecânica quântica, o físico dinamarquês Niels Bohr, chegou a afirmar com grande sabedoria e lucidez: "Existem dois tipos de verdade: as verdades simples, em que os opostos são claramente absurdos, e as verdades profundas, reconhecíveis pelo fato de que o oposto é, por sua vez, uma profunda verdade". Encontramo-nos, portanto, diante não de duas vias, da qual uma é verdadeira e a outra é falsa, mas de uma condição estrutural da mente em sua relação com o ser.
E, assim como a mecânica quântica e a teoria da relatividade, embora não sendo conciliáveis entre si, são ambas verdadeiras no sentido de que ambas descrevem adequadamente a realidade, assim também, do mesmo modo, os conceitos de liberdade e de necessidade, embora não sendo teoricamente conciliáveis entre si, interpretam ambos uma dimensão da realidade de modo verdadeiro.
Emerge aí a exigência de uma perspectiva de pensamento que saiba captar tal dupla razão, sabendo sustentar, ao mesmo tempo, tanto a sensatez e a logicidade do ser, porque, como afirmava Einstein: "Deus não joga dados com o mundo", quanto a contingência e a falta de um desígnio linear, porque, como afirmava Heráclito: "O tempo é uma criança que brinca, movendo dados".
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O enigma da liberdade. Artigo de Vito Mancuso - Instituto Humanitas Unisinos - IHU