02 Agosto 2016
Entre o discurso de 2009 e a realidade de 2016, há um país em que a conciliação do inconciliável já não é possível nem como construção identitária.
O artigo é de Eliane Brum, escritora, repórter e documentarista, publicado por El País, 01-08-2016.
Segundo ela, “a Olimpíada seria não apenas a conciliação dos povos, mas também a dos vários Brasis amalgamados num só, conflitos e contradições magicamente apagados”.
E continua:
“Entre 2009 e 2016 aconteceu muita coisa. Mas aconteceu principalmente 2013. Se há algo que não vira passado facilmente é 2013, o incontornável que tantos querem contornar. É nos protestos das ruas que fica evidente que o imaginário de conciliação não poderá mais ser sustentado. Desde então, não há combinação, recolocação ou arranjo possível que dê uma imagem coesa ao Brasil – ou uma cara “brasileira” ao Brasil. As fraturas que historicamente foram ocultadas ou maquiadas já não podem ser. O Brasil ou os Brasis tornaram-se irredutíveis à conciliação também na produção de imagens e de símbolos”
“Não é ruim que o Brasil chegue à Olimpíada sem uma cara – escreve a jornalista. Ou mais semelhante ao antropofágico Abaporu de Tarsila do Amaral. Não é ruim que os estereótipos ruíram e todos os rearranjos antes possíveis já não parem mais em pé. Não é ruim se perceber fragmentado. Não é ruim se desidentificar para que outras identidades, múltiplas, se tornem possíveis. Já não dá para conciliar o inconciliável”.
Eis o artigo.
O mais fascinante desta Olimpíada no Rio é a negação de uma ideia de Brasil. É a impossibilidade de apresentar um imaginário coeso sobre o país para fora – e também para dentro. É a total impossibilidade de conciliação. Esta é a potência do momento – confundida às vezes com fracasso, com estagnação ou mesmo com impotência. O Brasil chega à Olimpíada sem que se possa dizer o que o Brasil é.
Para que isso se torne mais claro, é preciso voltar ao ano de 2009, ao momento em que o Brasil foi escolhido para sediar a Olimpíada de 2016. Há vários vídeos sobre o discurso de Lula após o anúncio. Não o discurso oficial, mas o discurso do então presidente feito para as câmeras de TV. Aquele que é espetáculo dentro do espetáculo. Particularmente, prefiro o da Globo (assista abaixo), pelo que esta rede de comunicação representa na história recente do país, e pela linguagem que escolhe ao contrapor a fala de Lula com a reação dos apresentadores e comentaristas. Quando se pensa que essa “conciliação” foi possível apenas sete anos atrás, tudo fica ainda mais interessante.
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Sugiro assistir a estes sete minutos, preciosos para compreender aquele e este momento. Mas também transcrevo aqui a fala de Lula, para que se torne mais fácil refletir sobre os tantos sentidos desse discurso, agora que podemos olhar para ele pelo retrovisor. E para que seja possível prestar atenção nos personagens então secundários, congelando a imagem por um momento.
Lula está emocionado. Não acredito que esteja fingindo se emocionar. Ainda que ele fale com a consciência de que está produzindo um documento para a história, consciência que ele sempre mostrou ter ao longo de seus dois mandatos como presidente do país, ele acredita no que diz. Como Lula vê o país e como entende o povo brasileiro é crucial para compreender o Brasil atual, dada a importância do personagem e o papel de protagonista que desempenhou e desempenha. Naquele momento, há uma festa de comemoração nas areias de Copacabana, como se a multidão que ali está tivesse a função de produzir a imagem capaz de comprovar a tese de seu líder.
Lula diz para as câmeras de TV, e ao dizer o líder carismático está num de seus momentos de maior carisma:
– O Rio perdeu muitas coisas. O Rio foi capital, o Rio foi coroa portuguesa, e foi perdendo... Eu acho que essa Olimpíada é um pouco uma retribuição ao povo do Rio de Janeiro que muitas vezes aparece na imprensa, só nas páginas dos jornais... É preciso respeitar porque o povo é bom, o povo é generoso. Acho que o Brasil merece. Aqueles que pensam que o Brasil não tem condições vão se surpreender. Os mesmos que pensavam que nós não tínhamos condições de governar esse país vão se surpreender com a capacidade do país de fazer uma Olimpíada.
Diante da pergunta de por que o Rio ganhou de cidades como Madri, Tóquio e Chicago, que disputavam ser sede da Olimpíada, Lula afirma:
– A gente tava com a alma, com o coração. Ou seja, era o único país que queria de verdade fazer uma Olimpíada. Porque para os outros seria mais uma. Nós tínhamos que provar a competência de fazer uma Olimpíada. Então eu acho que as pessoas veem isso nos olhos da gente. (...) Essa foi a diferença. Esse país precisa ter uma chance. Não é possível que esse país não tenha, no século 21, a chance que não tivemos no século 20.
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Todos os chefes de Israel usam o poder para derramar sangue.
Aí são desprezados o pai e a mãe, o imigrante é oprimido, a viúva e o órfão são explorados.
Você desprezou as coisas sagradas e profanou os meus sábados.
Aí existe gente que calunia para derramar sangue,
existe gente que come sobre os montes e pratica ações criminosas.
Aí há gente que mantém relações com a madrasta
e faz violência contra a mulher menstruada.
Um pratica imoralidade com a mulher do seu próximo, outro desonra a sua nora,
outro violenta a própria irmã, a filha do seu pai. (Ez 22, 6-11)
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O Brasil chega à Olimpíada sem cara - Instituto Humanitas Unisinos - IHU