06 Junho 2016
Cerca de 8 milhões de pessoas foram deslocadas à força de suas casas através de violência ou outras revoltas sociais em 2015; segundo a ONU, o maior número já registrado em um único ano.
Enquanto o Secretário Geral Ban Ki-moon classifica a crise global dos refugiados como a "pior catástrofe humanitária" desde a Segunda Guerra Mundial, governos e grupos de assistência têm debatido o que pode - e deve - ser feito sobre a crise.
O eticista e teólogo católico romano padre David Hollenbach, jesuíta, que dirige o Centro de Direitos Humanos e Justiça Internacional do Boston College, dedicou-se a estudar o assunto no ano passado depois de ser nomeado para a cátedra Cary e Ann Maguire de 2015 de Ética e História Americana na Biblioteca do Congresso John W. Kluge Center, em Washington, D.C.
Hollenbach argumenta que os Estados Unidos e outros países desenvolvidos têm a obrigação moral de encontrar soluções. Ele falou sobre essas responsabilidades no programa de televisão da PBS "Religião e Ética Semanal".
A entrevista é de Kim Lawton, publicada por Religion and Ethics Newsweekly, 27-05-2016. A tradução é de Luisa Flores Somavilla.
Eis a entrevista.
Como você caracteriza a escala da crise de refugiados?
Eu estou chamando-a de humanidade em crise. Existem atualmente mais de 60 milhões de pessoas deslocadas no mundo. Este é o maior número desde a Segunda Guerra Mundial.
São pessoas sem casa, sem lugar para morar, sem cidadania e essencialmente sem nenhuma maneira de proteger-se contra problemas contínuos de violações dos direitos humanos.
Enquanto muitas notícias concentram-se em imigrantes que tentam entrar na Europa, a maioria dos refugiados não está nos países em desenvolvimento?
Isso é certo. Dos países que acolhem os refugiados que estão chegando, a maioria dessas pessoas, mais da metade, está em países subdesenvolvidos. Países como o Líbano ou o Quênia, por exemplo, ou o Chade, ou lugares que fazem fronteira com a República Centro-Africana. Países onde não há forte desenvolvimento econômico estão sendo convidados a acolher um grande número de refugiados.
Assim, a questão é como podemos encontrar uma maneira de ajudar esses países muito pobres? Estamos em posição de ser capazes de fazer algo sobre isso e, portanto, o meu argumento seria que nós temos o dever de fazê-lo.
Por que é um "dever"? Por que você acredita que os norte-americanos têm essas obrigações éticas?
Primeiro, há uma profunda necessidade. Em segundo lugar, temos capacidade de fazer algo sobre isso. Se você não pode nadar, você não é obrigado a saltar no rio para salvar uma criança de um afogamento e ainda por cima provocar outra morte em decorrência disso. Mas se você for um bom nadador, você tem a obrigação de entrar e ajudar essa criança que está em perigo de afogamento.
Além disso, estamos conscientes da crise. Não estamos ao lado da Síria ou do Sudão do Sul ou do Leste da República Democrática do Congo, mas temos consciência suficiente do que está acontecendo para que eu possa dizer que temos "proximidade moral" com essas necessidades.
E nós podemos fazê-lo sem causar a nós mesmos uma carga exagerada. Dispomos de recursos.
Especialmente com a crise de refugiados do Oriente Médio, algumas pessoas culpam os Estados Unidos e dizem que temos alguma responsabilidade por causa das nossas ações no Iraque. Você acha que isso é justo? Você acha que os EUA têm determinadas obrigações morais por causa das ações que tomamos naquela parte do mundo?
Acho. Nós não causamos essa enorme crise de refugiados da Síria diretamente. As causas são o governo sírio, o ISIS e alguns dos rebeldes sírios que estão fazendo todos os tipos de coisas horríveis. Mas a nossa intervenção no Iraque foi o início do conjunto de circunstâncias que levou ao desmantelamento da estrutura da sociedade naquela região.
Portanto, eu diria que, embora não sejamos a causa deste deslocamento, a nossa intervenção no Iraque foi uma das situações que ocasionaram este deslocamento. E por causa disso, eu penso que nós podemos argumentar que os Estados Unidos têm algum dever.
É um dever apenas do governo, ou também dos indivíduos?
Certamente existem obrigações do governo. Temos a capacidade de asilar um maior número de refugiados. Mas não podemos resolver o problema dos refugiados admitindo esses 60 milhões de pessoas deslocadas. O que podemos fazer é auxiliar os países que estão acolhendo imigrantes e pessoas deslocadas, para prestar-lhes uma assistência econômica significativa.
Encontrar formas de contribuir para políticas que respondam de forma mais adequada é um dever governamental. Mas também temos responsabilidades individuais. Muitas das organizações que respondem aos mais necessitados são organizações religiosas ligadas a igrejas, sinagogas, e até mesmo cada vez mais ligadas a mesquitas.
Nós podemos ajudar nisso através de nossa participação no esforço de nossa própria comunidade religiosa.
Como você responde a quem diz que o acolhimento a refugiados apresenta riscos de segurança?
Não há muita evidência de que os terroristas vieram para este país como refugiados.
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Eticista diz que EUA tem o dever moral de responder à crise de refugiados - Instituto Humanitas Unisinos - IHU