12 Junho 2015
Por ocasião do Sínodo sobre a família de 2015, a associação católica homossexual francesa Devenir un en Christ quis envolver os seus membros em uma ampla reflexão sobre as perguntas propostas. As respostas recebidas foram resumidas na síntese que oferecemos abaixo e que, depois, foi enviada à Secretaria do Sínodo.
O texto foi publicado no sítio da associação Devenir un en Christ. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
A homossexualidade afeta de perto a família: inúmeras pessoas cristãs estão envolvidas nessa realidade, direta e indiretamente (pais, parentes, crianças...); as novas formas de conjugalidade também interrogam a família. Essa importante questão merece ser abordada no marco do Sínodo sobre a família. A associação Devenir un en Christ tenta propôr aqui algumas reflexões sobre esse assunto, a partir de uma ampla consulta interna.
Nunca é fácil para uma pessoa se descobrir homossexual. Alguns testemunham: "Se fosse possível, eu seria heterossexual; minha vida seria muito mais fácil". Porque a homossexualidade não é uma escolha. Diante da descoberta da sua homossexualidade, muitos se perguntam: "Eu sou normal? Como faço para 'sair do armário'? Qual será o meu futuro?". Além disso, se alguns sempre se sentiram atraídos por pessoas do mesmo sexo, a homossexualidade, para outros, pode surgir mais tarde, às vezes dentro do casamento ou de um engajamento religioso ou sacerdotal.
Em todos esses casos, a aceitação da homossexualidade muitas vezes é objeto de sofrimentos interiores, e muitos testemunham ter experimentado solidão: "Foi um choque, isso não correspondia àquilo que eu queria fazer da minha vida, era preciso a todo custo me livrar disso". Então, para alguns, é um verdadeiro caminho de combatente, em que se alternam lutas contra as próprias tendências, orações para que as coisas mudem, às vezes desespero: "Muitas vezes, eu quis morrer pela vida ter me infligido um fardo tão pesado. Muitas vezes, eu quis morrer diante do desencorajamento e do desespero, em relação a uma vida que eu queria mais simples. Por muito tempo eu me considerei como uma pessoa anormal e indigna". Para outros, felizmente, as coisas são mais fáceis de viver.
Para os parentes, a realidade da homossexualidade não é mais fácil de aceitar. Muitos falam de um verdadeiro tsunami, de um choque terrível, quando ficam sabendo da homossexualidade de um filho, de um cônjuge ou de um pai. Aí também esse anúncio levanta muitas questões e muitas culpas: "O que eu fiz de errado na educação do meu filho? Ele pode se curar?". Ou: "Meu marido vai me deixar? Nossa união ainda tem sentido?". Então, é preciso viver o luto dos sonhos que foram feitos, dos futuros netos.
Mas, para passar do choque inicial à aceitação, um longo caminho resta a ser feito. Em um primeiro momento, a maioria das pessoas não sabem o que dizer: em muitas famílias cristãs, o tema da homossexualidade continua sendo um tabu, quando não é visto como uma abominação. É muito difícil de se abrir sobre essas questões em família, por medo da rejeição, da exclusão. É preciso dizer que certas palavras, às vezes ouvidas, podem ser muito duras: "A pior coisa que poderia me acontecer é ter uma filha homossexual" ou: "Você vai acabar no inferno".
No entanto, a experiência mostra como o diálogo em família é libertador: "Que graça é viver na verdade com as pessoas que amamos e que nos amam!". Longe de fazer explodir as famílias, essa abertura é muitas vezes a ocasião para reforçar os laços: "Ao longo do tempo e dos anos, os nossos laços se reforçaram e nos levaram a relações mais verdadeiras" ou: "A homossexualidade do meu marido levou cada um de nós a irmos além de nós mesmos, a crescer".
A homossexualidade não pode ser reduzida a um sofrimento, porque ela pode ser a oportunidade de um verdadeiro caminho de vida. "A aceitação da homossexualidade transformou a minha vida. Eu passei de uma forma de prisão a uma libertação. Foi uma Páscoa". Alguns pais reconhecem como essa prova fez com que eles saíssem do seu lugar, das suas certezas, dos seus julgamentos, do medo diante daquilo que as pessoas diriam.
Descobrir-se diferente leva a aprofundar a sua relação com Deus, a redescobrir o seu verdadeiro rosto: "O fato de ser homossexual me permitiu tomar consciência de que Deus nos ama verdadeiramente tal como somos, muito mais ainda do que podemos nos amar". Assim, alguns se atrevem a afirmar que a homossexualidade era, para eles, um caminho de graça para crescer na sua fé. Uma mãe de família testemunha: "As pessoas homossexuais me fizeram conhecer a profundidade convincente da sua fé. A sua caridade e o seu testemunho me surpreenderam, me ajudaram a aprofundar a fé, e eu lhes agradeço do fundo do coração".
De fato, um desejo autêntico de fecundidade se faz luz em muitos, levando-os a se engajar com pessoas em dificuldade, presos, pessoas com deficiência, mas também com o serviço da Igreja, principalmente nas suas próprias paróquias: "Se eu não fosse homossexual, eu acho que não teria feito esse caminho", declara um deles.
Essa fecundidade é vivida por alguns em uma vida de casal. Para além das diferenças objetivas entre os casais heterossexuais e homossexuais, um engajamento e um amor autênticos podem ser vistos em todos os casais estáveis. A vida em casal lhes permite encontrar um caminho de equilíbrio e de humanização, enquanto o celibato era para eles uma via mortífera. "Desde que estou em um casal, estou muito mais feliz: eu vivo um renascimento".
E mesmo que o amor seja um amor ferido e imperfeito, não há amor humano que não precise de cura e de realização. A dificuldade é a aprendizagem da alteridade, que se descobre em uma relação homossexual, em que o outro se revela sempre diferente de nós: a partir da acolhida dessas diferenças, pode nascer uma complementaridade e uma verdadeira fecundidade humana, social e espiritual. Também é preciso notar que as pessoas homossexuais em um casal muitas vezes devem inventar para elas mesmas o seu próprio caminho, já que nenhum modelo de vida lhes é proposto.
Muitas pessoas homossexuais cristãs manifestam um apego real à Igreja e um grande amor por ela. Elas são gratas pela sua benevolência e pela sua acolhida, e estão sensíveis ao diálogo aberto no Sínodo sobre a questão da homossexualidade. Elas encontram na doutrina cristã um apoio para a sua fé e reconhecem a moderação e a tolerância do discurso da Igreja, que insiste, a propósito da homossexualidade, nas noções de consciência esclarecida, de gradualidade, de respeito, de mistério das suas origens.
Muitos testemunham ainda as belas acolhidas por parte de padres, especialmente no âmbito do sacramento da reconciliação: "Graças à acolhida recebida, eu me reconciliei comigo mesmo. No meu retorno, havia reencontrado a alegria de viver". As palavras abertas do Papa Francisco foram um conforto real para muitas pessoas homossexuais.
No entanto, a acolhida dos representantes da Igreja não manifesta sempre essa abertura. São muitas as pessoas homossexuais que testemunham um desconforto por parte deles, o seu desconhecimento da homossexualidade, de fechamentos a priori. "Um dia, um padre me negou a absolvição. Foi um sofrimento terrível. No fim, nunca mais fui me confessar". Alguns pais dizem igualmente que certas palavras equivocadas lhes culpabilizaram, enquanto esperavam da Igreja um conforto e uma ajuda.
O discurso oficial da Igreja sobre a homossexualidade também pode provocar feridas profundas, culpas e desencorajamento. "Alguns termos me feriram mais do que qualquer comentário depreciativo. Eu me senti mal-entendido, sem lugar na Igreja, deixado à beira do caminho. Então, como posso me sentir amado por Deus, quando me sinto rejeitado pela Igreja?".
Nas paróquias, a acolhida varia muito de uma comunidade para outra. Se muitas vezes se sente um certo desconforto, contudo, as coisas parecem estar evoluindo na direção da abertura. Várias dioceses francesas criaram grupos de escuta ou disponibilizaram pessoas de referência para a acolhida das pessoas homossexuais; as pastorais familiares começam a se interessar por essa questão que afeta de perto a família.
Também é preciso assinalar as associações, muitas vezes próximas da Igreja, que trabalham para que as pessoas envolvidas com a homossexualidade possam ser plenamente elas mesmas e unificar a sua vida de fé com a sua vida de homens e de mulheres: "Foi mais frequentemente nas associações cristãs que eu vivi uma verdadeira acolhida, que me permitiu me revelar sem medo e progredir no meu caminho de fé. Depois dessa acolhida, eu pude voltar para a paróquia. Houve um antes e um depois".
Para muitos, o discurso da Igreja sobre a homossexualidade não são mais entendidos hoje. Esse discurso parece bastante vago, já que muitas vezes muda de um pastor para outro, ou se foi pronunciado em privado ou em público. Os próprios artigos do Catecismo parecem pouco realistas em relação à vivência das pessoas: os modelos oferecidos são desencorajadores para aqueles que não têm os meios para alcançá-los. A distinção entre os atos e as pessoas continua sendo, para inúmeros fiéis, difícil de compreender: "O discurso da Igreja é complicado, porque ela nos acolhe, mas não acolhe os nossos atos: portanto, não nos acolhe por quem nós somos".
O apelo à castidade (restrita ao único sentido de continência), em particular, parece uma exigência muito elevada e um fardo impossível de suportar para muitos. Para alguns, o celibato continente pode ser um caminho real de crescimento e de vida. Mas muitos são os fiéis que não conseguem ser castos e para os quais essa demanda parece irrealista e injusta: uma vez que não escolheram ser homossexuais, por que o celibato lhes é imposto como o único caminho? Por que o amor lhes seria negado?
É igualmente difícil de compreender a condenação dos atos homossexuais em razão da lei natural. "A Igreja qualifica a homossexualidade como desordenada e contrária à natureza, enquanto que, para mim, é a minha natureza, é aquilo que estrutura a minha vida afetiva e lhe dá ordem e sentido". Muitas vezes, a impressão é de que o discurso eclesial se interessa mais pelo ato sexual do que pela vida afetiva.
Ora, aquilo que os fiéis esperam da Igreja hoje se situa em outro plano. Eles esperam dela um discurso de amor, de acolhida e de respeito: "Precisamos de uma Igreja mais humana e mais compassiva, que acolha todo o mundo com doçura e humildade". Dirigindo-se à Igreja, eles esperam encontrar a mesma acolhida incondicional que Cristo demonstrou no Evangelho. "Toda pessoa que se dirige a Igreja se dirige àquele que disse: 'Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida".
A vocação da Igreja é de abrir caminhos de vida e de caminhar com as pessoas. É precisamente isso que os cristãos envolvidos com a homossexualidade esperam: que a Igreja lhes ajude a inventar as suas vidas, a encontrar o seu lugar na comunidade dos fiéis e no mundo, que lhes guie através de conselhos concretos por um caminho que permaneça realmente fora de todo quadro normativo: "É preciso que a Igreja diga a nós, pessoas homossexuais, se aquilo que nós vivemos pode ter um sentido, um valor. É preciso poder construir, e a mensagem da Igreja não permite isso hoje".
A Igreja não deve ter medo da homossexualidade: ela não é uma ameaça para a sua doutrina, nem para a família. Ao contrário, as pessoas homossexuais desejam muitas vezes lhe oferecer os seus talentos para se colocar ao seu serviço. "Essa diferença é uma riqueza para a Igreja. Há um tesouro em cada uma dessas pessoas", testemunha um padre.
Longe de reivindicar um lugar à parte, a maioria das pessoas homossexuais cristãs aspiram a ser fiéis como os outros. "Dentro da Igreja, eu sou filho de Deus, um simples fiéis, um irmão entre os irmãos, e é isso que importa".
Quais são as expectativas das pessoas homossexuais envolvidas com a homossexualidade em relação à Igreja?
Então, quais pistas de reflexão podem ser propostas?
"Possa a Igreja, graças ao Sínodo, afinar o seu discurso, sem laxismo nem rigidez, para ser mais bem ouvida!"
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A descoberta da homossexualidade em uma família católica. Uma contribuição ao Sínodo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU