05 Novembro 2014
“É tempo de acabar com os diplomatas de salão, que tem pouco ou nada de eclesiástico, com sucessivas maledicências que remetem a uma infeliz imagem da diplomacia Pontifícia”, e no provimento de certas cadeiras da cúria para as quais não se exige qualidade eminente “seria bom declarar explicitamente” aos titulares que se pretende excluir “todo direito” ao colégio de cardeais para evitar o aumento do número de “nulidades no S. Colégio”. É o que se lê em uma passagem atribuída a Pio X, reencontrada e estudada nos arquivos vaticanos de Paolo Valvo, pesquisador da Universidade Católica, que nos presenteou com uma edição crítica sobre a Revista de História da Igreja italiana.
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada pelo Vatican Insider, 03-11-2014. A tradução é de Ivan Pedro Lazzarotto.
A passagem, “até então inédita”, escreve Valbo, “fornece um quadro sintético das reformas que precisariam ser confrontadas nos primeiros anos do pontificado” do Papa Sarto. Trata-se de 14 páginas datilografadas e não firmadas, destinadas a quinze cardeais membros da Congregação para os trabalhos eclesiásticos extraordinários. Não se encontrou a minuta do documento, mas também se não existem elementos que permitam a sustentação o texto foi elaborado pessoalmente pelo Pontífice, “tudo faz pensar que tenha sido ao menos inspirado nele”.
O extensor material poderia ter sido o monsenhor Pietro Gasparri, futuro Secretario de Estado. Os documentos não possuem data, mas a partir de dois elementos presentes nas páginas se pode chegar a conclusão que foi escrito entre as últimas semanas de 1903 e as primeiras semanas do ano sucessivo (entre os destinatários está citado o então cardeal Rafael Merry de Val, que recebeu o título eclesiástico em 09 de novembro de 1903; cita-se também, de forma resumida, a codificação do direito canônico, examinada detalhadamente pelos cardeais em 04 de março de 1904).
No documento são tratados diversos temas: o relacionamento da Santa Sé com a Igreja universal, a reforma da Cúria e a situação econômica da Santa Sé, a libertas Ecclesiae (Igreja livre) entre a fé e a diplomacia, a’codificação” do Direito canônico, a realização de um catecismo universal “ou no mínimo nacional”.
O documento traça uma caricatura do diplomático pontifício. Os representantes do Papa “devem ser eclesiásticos de conduta não somente moral, mas eclesiásticos exemplares. É tempo de acabar – se lê – com os diplomatas de salão, que nada ou muito pouco possuem de eclesiásticos, com sucessivas maledicências que remetem a uma infeliz imagem da diplomacia pontifícia: o representante pontifício é primeiro eclesiástico e depois diplomático”. Está afirmado também que não se deve “mais promover uma missão mais alta aquele que por alguma razão não soube desempenhar dignamente uma missão inferior”. Além disso, é necessário que se faça entender “claramente aos novos promovidos” que não existe “uma carreira propriamente dita, ou seja, não existe passagem de direito de uma missão inferior a uma superior”. E se recomenda aos núncios de que “fiquem mais em contato com os bispos, por exemplo convidando-os seguidamente para almoçar”.
Em um dos pontos que retratam a situação econômica da Santa Sé, ainda que seja “difícil”, é afirmado: “Existem na Cúria cadeiras que antigamente possuíam grande importância, mas hoje existem apenas títulos”, isto é, títulos e encargos quase puramente honorários, para permanecer entre os cardeais. Pio X acredita que devem ser mantidas as honras, mas que sejam excluídos “todos ou quase todos” salários. “Além do mais, no provimento dos cargos seria prudente declarar explicitamente aos titulares que se pretende excluir todo direito também no sentido amplo do Colégio de Cardeias, caso contrário ocorre a Santa Sé conferir estes cargos sem exigir qualidades eminentes, que na realidade hoje são necessárias para os mesmos, e os titulares pretendem, em razão do cargo, o chapéu cardinalício, aumentando assim o número de nulidades no Sacro Colégio”.
Para finalizar, no documento existe a proposta de “suprimir todos os salários” àqueles cardeais que “pelo trabalho que desempenham possuem casa, uma vez que esta já representa uma retribuição”; enquanto que aos cardeais que não possuem casa “deve ser fixado uma retribuição idêntica para todos, por exemplo, aproximadamente £ 3.000,00 anuais”.
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Pio X contra os “Núncios por indicação” e os cardeais “que nada fazem” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU