29 Abril 2011
Por ocasião da realização da Jornada Teológica da América Central e Caribe, que terminou ontem, sexta-feira, dia 29 de abril, na Guatemala, Pablo Richard, teólogo chileno, radicado na América Central, concedeu uma entrevista sobre o Impacto do Concílio Vaticano II e a teologia latino-americana. A entrevista é publicada por Adital, 29-04-2011.
A Jornada Teológica realizada na Guatemala é a primeira de quatro jornadas a serem realizadas neste ano. Elas preparam a realizãção do Congresso Continental de Teologia, a ser realizado de 08 a 11 de outubro, em São Leopoldo, RS.
Eis a entrevista.
Já está acontecendo a Jornada Teológica da América Central e Caribe, você irá falar sobre o impacto do Concílio Vaticano II e da teologia na América Latina. Poderia fazer uma introdução sobre o tema?
O momento do Vaticano II e depois de Medellín (Colômbia) e Puebla (México), que foi quando lemos o Vaticano II a partir da América Latina, essa época da teologia da libertação das comunidades de base, da grande quantidade de gente que participativa, eu digo que isso foi uma época de graças, foi um bom tempo a que nós chamamos de Kairós - um tempo de graça - mas a partir dos anos 90, nascem dois modelos de igreja.
Um, onde continua esse tempo bom, digamos assim, esse Kairós que chamamos a Igreja povo de Deus, mas surge outro modelo de igreja que rejeitava o Vaticano II. Surgem novos movimentos como: Opus Dei, Legionários de Cristo, Arautos do Evangelho e a igreja volta outra vez aos setores mais dominantes, os setores mais opressores, incluindo a igreja, essa igreja de cristandade - como eu chamo - perdem os pobres, a igreja, essa massa oficial perderam aos pobres, hoje em dia as populações marginais.
Para uma igreja católica, existem 20 igrejas evangélicas, os sacerdotes saíram das comunidades e foram para as paróquias de maior poder. Inclusive, agora as pessoas ricas dizem: "finalmente, a igreja está nos ajudando outra vez, porque havia nos abandonado etc.". Então, eu faço uma comparação um pouco entre a igreja do povo, que continua o Vaticano II, Medellín e Puebla, todas essas reformas, e essa outra igreja "cristandade" que está adormecida durante esse período de grande auge da teoria da libertação.
Sobre a existência de dois tipos de igreja, essa divisão é boa ou ruim?
É algo excelente. Não são duas igrejas, são dois tipos diferentes dentro de uma mesma Igreja. Porque se gera um movimento de renovação fora da Igreja, não gera nenhum impacto, tem que ser feito dentro da Igreja.
Mas é bom porque essa tradição do Vaticano II, de Medellín-Puebla e da teologia da libertação, essa se mantém na Igreja dos pobres. E essa igreja tem sua estrutura, está organizada, tem seus princípios não são maliciosos por aí dispersos. Mas temos esta outra igreja de cristandade, essa igreja mais hierárquica, etc.
Agora o problema tem sido justamente o poder mais central da igreja, porque o Vaticano está destruindo o próprio Vaticano II, a teologia da libertação, as comunidades eclesiais de base têm sido pouco a pouco deslegitimadas, deixadas de lado... E nisto tem concentrado toda a sua força; na defesa de um aparato institucional de cristandade, essa palavra de cristandade surge quando a igreja no século IV uniu-se ao império romano, então nasce o Império Romano Cristão e nessa época a igreja se fez imperial e o império se fez cristão, surgiu toda uma estrutura.
Nós dizemos que esta igreja de cristandade toma, retoma esse modelo de igreja imperial e para mim essa igreja não foi um triunfo do cristianismo, foi um fracasso do cristianismo. Com Teodósio chega a ser a religião oficial e isso faz muito mal à igreja. Muitos o percebem como triunfo, que finalmente o império... Não, para mim o império cristão é o fracasso para o movimento de Jesus.
Hoje em dia esta igreja do Vaticano II recupera essa tradição do movimento de Jesus, mas reaparece esse modelo de cristandade, este modelo imperial. Então, nós dizemos que o Papa se parece mais com o Imperador Romano do que a São Pedro. O Papa usa todas as insígnias que usavam os imperadores romanos, incluindo as cores, dos cardeais, por exemplo, eram cores dos senadores romanos dentro do Império. É uma Igreja que se apóia mais no poder e no dinheiro para sobreviver.
Mas a igreja dos pobres é uma igreja que os pobres precisam para viver, tem muita gente que na igreja encontra a possibilidade de ser sujeito, de ser pessoa, no trabalho que fazemos nesse nível. Eu, pessoalmente, trabalho com as pessoas nas ruas, tenho isso na minha paróquia - a rua - com umas cem pessoas mais ou menos, trabalhamos com eles. Alguns são homossexuais, travestis, doentes da Aids, na violência, vamos formando pequenos grupos da igreja, nesta igreja - que vamos construindo na rua - as pessoas encontram a possibilidade de sobreviver. Essa igreja sobrevive dessa gente que a igreja hierárquica afasta.
Nós não pedimos dinheiro para nada, mas lhes damos a oportunidade de se reunir, de conversar.
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Dois modelos de igreja dentro da mesma igreja. Entrevista com Pablo Richard - Instituto Humanitas Unisinos - IHU