13 Setembro 2018
Portadores de boas notícias, Isaías e Jesus enfrentam fortes resistências e profundas incompreensões. Confiam inteiramente, no entanto, no Deus que os enviou, permanecendo fiéis à Sua Palavra, e não às palavras dos homens. A confissão de fé de Pedro, reconhecendo Jesus como Messias, é um primeiro passo na fé. Mas é preciso ir mais longe.
A reflexão é de Marcel Domergue (+1922-2015), sacerdote jesuíta francês, publicada no sítio Croire, comentando o evangelho do 24º Domingo do Tempo Comum, do Ciclo B (15 de setembro de 2018). A tradução é de Francisco O. Lara, João Bosco Lara e José J. Lara.
Referências bíblicas:
1ª leitura: «Ofereci as costas para me baterem e as faces para me arrancarem a barba» (Isaías 50,5-9).
Salmo: Sl. 114(115) - R/ Andarei na presença de Deus, junto a Ele na terra dos vivos.
2ª leitura: «A fé, se não se traduz em obras, por si só está morta» (Tiago 2,14-18).
Evangelho: «Tu és o Messias»… «E começou a ensinhar-lhes: "o Filho do homem devia sofrer muito..."» (Marcos 8,27-35)
Pergunta insólita esta, mas constante, se estamos frente a um desconhecido. Sua resposta passa por diversas outras perguntas: de onde vem? De que região? De que meio social? É uma questão de lugar, mas também de origem: filho ou filha de quem? O que fazem os seus pais? Interroga-se também sobre a profissão, a função, até mesmo sobre o pertencimento político. Quando acabamos de responder a todas as questões, imaginamos ter feito todo o mapeamento da pessoa. Mas que nada: o outro permanece sempre sendo um mistério. Ainda vou mais longe: até eu, sou um mistério para mim mesmo.
Acredito conhecer-me? Pura ilusão! Aliás, nem os outros me veem tal como eu me vejo. Até chegamos a dizer: "Não me acreditava capaz disto!" Para o bem ou para o mal... De todo modo, quando se trata dos outros, nos contentamos com etiquetas: "É um padre", já ouvi pessoas falarem de mim. Vai, portanto, reagir deste ou daquele modo. Vai dizer isto ou aquilo; sabe-se de antemão como se comporta. As etiquetas nos tranquilizam. Neste contexto é que devemos situar a pergunta de Jesus: "E vós, quem dizeis que eu sou?"
A pluralidade das respostas - João Batista, Elias, um dos profetas - manifesta que os contemporâneos de Jesus não conseguem classificá-lo. De Nazaré? Filho de José e Maria? Carpinteiro? Mas nada de tudo isto corresponde ao que ele faz e diz. Encontramos assim a famosa questão da identidade que percorre todos os evangelhos, chegando até ao pé da Cruz. Jesus escapa a qualquer definição, a qualquer "classificação".
"E vós, quem dizeis que eu sou?", pergunta Jesus aos seus discípulos. É evidente que estes que deixaram tudo, para segui-lo, não devem enxergá-lo da mesma forma que os outros. Em Marcos, a resposta de Pedro, em nome de seus companheiros, é mais concisa do que em Mateus; neste, Simão chega até mesmo a declarar Jesus como "Filho do Deus vivo" (16,16).
E o que representa a palavra "Messias"? A princípio, Messias é quem recebeu a unção real ou sacerdotal; é de qualquer forma um personagem "consagrado". No tempo de Jesus, esperava-se a vinda de um "filho de Davi", por consequência, um herdeiro da realeza davídica que viesse trazer a autonomia para os Israelitas. Um libertador, portanto, mas também um soberano.
No livro dos Atos (1,6), após a crucifixão e a Ressurreição, os futuros Apóstolos perguntam a Jesus: "Agora é o tempo em que irás restaurar a Realeza em Israel?". Mal entendido tão mais fácil de acontecer cada vez que Jesus volta a falar do "Reino de Deus", expressão da qual ainda não compreendem o sentido. Por outro lado, haviam se posto aos poucos a conceber o Messias como um personagem sobrenatural.
Com efeito, o "Filho de Davi" herdara ao longo do tempo características do "Filho do homem", nome que Jesus se deu com muita frequência, e, em particular, no versículo 31 de nossa leitura. Esta expressão encontra-se em diversos textos bíblicos, mas é de Daniel 7,13-14 que é preciso lembrar: depois da destruição das bestas monstruosas que haviam provocado catástrofes - pensemos nos diversos impérios que oprimiram Israel, mas também nas "potestades e dominações" de que nos fala Paulo - aparece nas nuvens do céu "um como Filho de homem" a quem "foi outorgado o poder, a honra e o reino". Todas elas, palavras que se realizam.
Mencionamos acima o mistério que cada um de nós representa. Mas o mistério de Jesus contém e ultrapassa todos estes mistérios que somos cada um de nós. Ao mesmo tempo, se acha exposto a plena luz o sentido último das nossas vidas. Assim que Pedro declarou ser Jesus o "Messias" ("Cristo", em nossa língua herdada do grego) põe-se este a anunciar-lhes os seus sofrimentos, a sua morte e ressurreição.
É que o "de onde ele vem" (Nazaré, sua família, sua profissão) não é suficiente para revelar "quem ele é". O "para onde ele vai" é que dirá a última palavra; e última palavra que, aliás, permanecerá um mistério... Última palavra também sobre Deus: pois aí ficamos sabendo que Ele não só nos deu a vida, mas, ainda mais, que deu a Sua vida para nos fazer viver. Ser "Filho", "imagem do Deus invisível", Messias, Filho do homem, é isto. "Cristo" quer dizer rei, é claro, mas seu poder real não se exerce sobre nós que, com Ele, somos "herdeiros do Reino" (cf., entre outros, Romanos 8,17), mas sobre a morte e tudo o que é contra nós, tudo o que vai no sentido da decadência.
Está aí, no fundo, a nossa criação à imagem e semelhança de Deus, isto é, a nossa geração como filhos, que vai se seguindo e atravessando todos os obstáculos destrutivos. Jesus vai comparar o que irá se passar na Cruz com as dores do parto (João 16,21 e Romanos 8,22). No final, temos a vida. Jesus não quer que seus discípulos saiam dizendo ser ele o Messias, porque as pessoas não estavam ainda em condições de compreender estas coisas. Será necessário vir o Espírito.
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A identidade de Jesus - Instituto Humanitas Unisinos - IHU