27 Novembro 2018
Deus não existe, estimava o astrônomo que morreu em março. Cientista também e teólogo, Thierry Magnin, reitor da Universidade Católica de Lyon e futuro secretário-geral da Conferência Episcopal da França (a partir de 1º de julho de 2019), leu sua obra póstuma com aparência de testamento e deu-lhe uma resposta.
A reportagem é de Thierry Magnin, publicada por La Vie, 15-11-2018. A tradução é de André Langer.
Muitos de nós foram marcados pela vida do famoso astrônomo inglês Stephen Hawking, nascido em 1942 e falecido em março passado. Este cientista excepcional, casado e pai de três filhos, que foi acometido pela doença de Charcot aos 21 anos de idade, comunicava-se por meio de um sintetizador de voz e movimentos de sobrancelhas. Grande especialista em física e cosmologia, especialmente dos buracos negros, ele havia se distinguido com a publicação de Uma Breve História do Tempo (Editora Intrínseca), em 1988. Em seu Breves Respostas para as Grandes Questões (Editora Intrínseca), este homem corajoso mostra um espírito rebelde e brincalhão, cheio de inteligência, força e vulnerabilidade.
Ele conta de maneira humilde e franca suas pesquisas dos anos 1960 sobre a história do Universo e o Big Bang, sua tentativa, junto com o matemático e físico Roger Penrose, para reconciliar a relatividade de Einstein e a física quântica – conjunto de trabalhos que lhe valeu a eleição, em 1979, para a Cátedra de Matemática de Cambridge, anteriormente ocupada por Isaac Newton e Paul Dirac!
“Eu vivenciei coisas extraordinárias neste planeta e, ao mesmo tempo, viajei através do Universo pelo pensamento, através do meu cérebro e das leis da física. Cheguei aos confins da galáxia, mergulhei em um buraco negro e recuei até as origens dos tempos. Na Terra, tive altos e baixos, conheci o sucesso e o sofrimento, em plena forma e com deficiência. Meu maior privilégio foi ter contribuído para a nossa compreensão do Universo – resume. Mas esse Universo estaria vazio sem as pessoas que eu amo e que me amam. Sem elas, todas essas maravilhas se dissipariam”.
Grande parte da pesquisa pessoal de Hawking é sobre a existência de Deus. “Muitas pessoas, que não conhecem a ciência, confiam em reconfortantes explicações religiosas... Meu trabalho não prova nem nega a existência de Deus. Consiste simplesmente em encontrar uma maneira racional de entender o Universo”, escreve. O Universo seria uma máquina governada por leis que a ciência torna acessíveis à mente humana, ao passo que as “antigas histórias da criação não são mais relevantes ou passíveis de confiança”.
Sobre este ponto, o leitor perspicaz permanecerá insatisfeito. É mais um deus-explicação que Hawking persegue, um deus de causas e efeitos, cuja transcendência não aparece. O autor considera que as explicações científicas são preferíveis à figura do “grande relojoeiro”, que se tornou inútil. Pois bem. Mas ele se situa claramente do lado do “como isso funciona” e muito pouco do “por quê”.
Estudar os primórdios do Universo no tempo e no espaço é uma coisa. Perguntar, com Leibniz, “o que faz o mundo existir aqui e agora, o que o sustenta e por que há algo e não nada?” é outra.
A origem de “o que é”, como mostra claramente a física quântica, escapa justamente ao cientista. Da mesma forma, o filósofo destacará que o Universo que ele descreve poderia não existir, uma vez que uma quantidade significativa de aleatoriedade preside seu início e sua evolução. Mas o que é tão contingente não pode ter sua fonte em si mesmo. A esta pergunta clássica, o livro não faz nenhum eco.
Dizem que é realmente uma pena que um homem desta envergadura não tenha podido dialogar com exegetas especialistas do sentido da Criação na Bíblia, desde os relatos do Gênesis até estas palavras dos Atos dos Apóstolos: “Em Deus vivemos, nos movemos e existimos” (At 17, 28). Ou que ele não tenha feito uma boa leitura de um Teilhard de Chardin explicando como “Deus faz menos as coisas, mas faz com que elas mesmas se façam”, sem que a Causa primeira se misture com seus efeitos.
Sobre a questão do futuro, Hawking nos convida, juntamente com outros cientistas, a reagir fortemente às ameaças ecológicas, assim como ao uso irracional do extraordinário potencial da engenharia genética, da inteligência artificial e das interfaces cérebro-máquina. “Nosso futuro é uma corrida entre a tecnologia e a sabedoria. Precisamos garantir que a sabedoria vença”, aconselha. Aqui o livro é estimulante, e muitas vezes nos perguntamos de onde o autor tira sua força.
Hawking está em boas condições para nos convidar, em suas últimas palavras, a “viver plenamente” a nossa existência: “Lembre-se de olhar para as estrelas, e não para os seus pés. Tente achar um sentido para o que vê. Seja curioso. Em todas as circunstâncias, há sempre algo que você pode fazer e ter sucesso. Nunca desista. Confie em sua imaginação. Faça o futuro acontecer”.
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Stephen Hawking e Deus, um último encontro perdido - Instituto Humanitas Unisinos - IHU