Mulheres consagradas na complexa realidade africana

imagem abstrata. | Foto: PxHere

Mais Lidos

  • Esquizofrenia criativa: o clericalismo perigoso. Artigo de Marcos Aurélio Trindade

    LER MAIS
  • O primeiro turno das eleições presidenciais resolveu a disputa interna da direita em favor de José Antonio Kast, que, com o apoio das facções radical e moderada (Johannes Kaiser e Evelyn Matthei), inicia com vantagem a corrida para La Moneda, onde enfrentará a candidata de esquerda, Jeannete Jara.

    Significados da curva à direita chilena. Entrevista com Tomás Leighton

    LER MAIS
  • Alessandra Korap (1985), mais conhecida como Alessandra Munduruku, a mais influente ativista indígena do Brasil, reclama da falta de disposição do presidente brasileiro Lula da Silva em ouvir.

    “O avanço do capitalismo está nos matando”. Entrevista com Alessandra Munduruku, liderança indígena por trás dos protestos na COP30

    LER MAIS

Revista ihu on-line

O veneno automático e infinito do ódio e suas atualizações no século XXI

Edição: 557

Leia mais

Um caleidoscópio chamado Rio Grande do Sul

Edição: 556

Leia mais

Entre códigos e consciência: desafios da IA

Edição: 555

Leia mais

07 Setembro 2017

"Revitalizar a nossa solidariedade para uma evangelização mais profunda na complexa realidade contemporânea". Com esse título ambicioso, a Associação das Mulheres Consagradas da África Oriental e Central (Acweca) convocou sua 17ª. assembleia plenária na capital da Tanzânia, entre 26 de agosto e 2 de setembro últimos. O evento, organizado pela Conferência Episcopal da Tanzânia, contou com a participação de cento e cinquenta religiosas de nove países: Eritreia, Etiópia, Quênia, Maláui, Sudão, Sudão do Sul, Tanzânia, Uganda e Zâmbia. A Missa inaugural, no domingo 27 de agosto, foi oficiada pelo Cardeal João Braz de Aviz, Prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica e concelebrada, entre outros, pelo Monsenhor Nkwande, bispo auxiliar da Arquidiocese de Dar es Salaam, responsável pela Conferência Episcopal dos religiosos do país.

A reportagem é de Luca Attanasio, publicada por Vatican Insider, 05-09-2017. A tradução é de Luisa Rabolini.

"O tema deste ano – declarou a presidente da Acweca, Irmã Priscar Matenga - é uma recomendação para que os membros da organização fortaleçam a unidade entre si. Estamos em uma aldeia global, as coisas mudam muito rapidamente. Por isso, é importante, para nós religiosas, reexaminar os nossos caminhos e ver as coisas da maneira como Cristo as viu".

Recém regressada a Roma de Dar es Salaam, onde foi convidada como representante da União Internacional das Superioras Gerais e palestrante, a irmã Patricia Murray, Secretária Executiva da UISG, relata ao Vatican Insider os resultados do encontro, as suas impressões e expectativas.

"O tema do encontro era bastante focado: revitalizar a nossa presença solidária e incentivar nosso papel de protagonistas de uma evangelização profunda dentro de sociedades altamente complexas, algumas das quais aflitas por guerras, conflitos e desastres ambientais. O tema de fundo que deu o tom ao evento foi a formação das irmãs. Para se tornarem vozes proféticas na sociedade, as mulheres consagradas precisam de uma formação muito aprofundada e cuidadosa, particularmente em contextos dramáticos como o Sul do Sudão, Eritréia ou o Sudão. Uma formação mais profunda é a chave para ter capacidades para enfrentar os desafios do país em que se exerce o ministério, em todos os níveis. Devido à grande complexidade dos contextos, as irmãs precisam encontrar uma maneira mais profunda para estarem mais próximas das pessoas, e não como simples prestadoras de serviços. Somos uma realidade profundamente enraizada; só na Tanzânia somos 13 mil e creio que nos nove países o número supere as 50 mil religiosas. Realizamos muitas atividades que trazem um desenvolvimento concreto para a sociedade: esse é sem dúvida um grande benefício. Justamente por isso existe a necessidade de trabalhar cada vez em conjunto e crescer na formação".

Que continente está se tornando a África?

"Na área central e oriental, mas eu diria que em todo o continente, notam-se mudanças profundas. A África está cada vez mais exposta ao materialismo e secularismo e os valores religiosos, que sempre foram uma parte importante da vida dos africanos, parecem estar em grave perigo. A sensação é que se está espalhando uma visão do mundo ligada às posses materiais. O aumento da urbanização e a ruptura dos vínculos tradicionais familiares, bem como a tendência a emigrar para a Europa, estão criando profundos danos à sociedade.

Nesse sentido, do encontro em Dar es Salaam, despontou a necessidade de cuidar cada vez mais das pessoas jovens e das famílias; ajudar os indivíduos a criar uma vida digna que não as obrigue a migrar e se expor ao terrível flagelo do tráfico de seres humanos. As irmãs trabalham nas escolas, nas paróquias, nos hospitais e nos ambulatórios e, claro, devem continuar a fazê-lo, mas a partir de agora precisamos nos concentrar cada vez mais nos jovens e nas famílias, para preservar o futuro da África".

Algumas das irmãs vivem em situações de grande perigo, não é verdade?

"Sim, muitas religiosas estão presentes em áreas de conflito e de grande instabilidade. Todas nós ficamos impactadas com o testemunho de algumas freiras que vivem no Sudão do Sul e Sudão. Elas encontram grandes dificuldades para viver sua vida religiosa, bem como sua vida cotidiana. Cada dia é uma luta para atender as necessidades das pessoas que estão sob seus cuidados e as suas próprias. Algumas delas exercem o seu ministério nos campos de refugiados, onde vivem centenas de milhares de pessoas, e ser um sinal de esperança em tais contextos não é nada fácil. E depois, há também riscos para a sua segurança. Todos lembram muito bem de Veronica Rackova, das Irmãs Missionárias do Espírito Santo, uma médica, que foi morta em maio de 2016 no Sudão do Sul, e das muitas que arriscam suas vidas em áreas onde rebeldes e residentes saqueiam, estupram e matam. Elas sabem que arriscam suas vidas, mas nunca deixaram o país onde vivem. Consideram que o seu papel é de companheiras, ao lado das pessoas, não importa o que aconteça. Elas querem ser um sinal de consolo e sustentação. Lembro que quando eu vivia no Sudão do Sul ouvia muitas pessoas me dizendo: "As irmãs nunca nos deixaram". Eu acredito que a presença, por vezes discreta, simples, de mulheres corajosas ao lado das populações que sofrem, seja um grande sinal, e estou certa de que na Igreja está crescendo o reconhecimento de que o ministério de estar presente seja tão importante quanto o de fazer".

Que expectativas traz do encontro de Dar es Salaam?

"Estou bem mais esperançosa. Eu vi muito trabalho concreto diante dos desafios; as irmãs identificaram a importância de uma boa formação religiosa para ter a profundidade e a coragem para ser um testemunho profético para as sociedades. São muito unidas como grupo, e vejo grandes potencialidades. Também gostei da honestidade quando foi abordada a questão de viver em contextos interculturais e intertribais: nunca é fácil superar as barreiras, mas quando se consegue, as irmãs podem se transformar em um sinal profético. As mulheres consagradas podem mostrar que para além das diversidades, etnias e culturas, é possível viver juntos. Além disso, posso dizer que cada vez emerge mais a realidade de comunidades inter-congregacionais. Portanto, há uma tendência em unir, em priorizar o ‘juntos’ em um mundo que , ao contrário, divide-se. A vida juntos é uma contrainformação em um mundo que exalta as diferenças".

Leia mais