19 Dezembro 2013
O Papa Francisco celebra nesta semana o seu 77° aniversário de forma relativamente tranquila e serena, o que não está impedindo os demais de fazerem a festa – incluindo a revista pró-gay “The Advocate”, que o escolheu como sua Personalidade do Ano.
A reportagem é de John L. Allen Jr. e publicada por National Catholic Reporter, 17-12-2013. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
A verdade é que Francisco já deu a si mesmo um grande presente de aniversário 24 horas antes, ao nomear novos membros da Congregação para os Bispos buscando estabelecer as bases para uma nova geração de “bispos no estilo Francisco”.
Nos Estados Unidos, a atenção esteve – o que é compreensível – focada na nomeação do cardeal Donald Wuerl, de Washington, e na remoção efetiva do cardeal Raymond Burke, presidente da Assinatura Apostólica, a suprema corte do Vaticano. Colocar o moderado Dom Wuerl e tirar o conservador Burke poderá não ajudar muito, porém parece ser um sinal do tipo de bispos que Francisco pretende promover nos Estados Unidos.
Como papa, Francisco é o responsável não só pelos 6% dos católicos do mundo que vivem nos EUA, mas também pelos mais de 1,2 bilhão de fiéis em todo o planeta.
A este respeito, vale a pena olhar para as nomeações feitas pelo pontífice na segunda-feira relativas à Congregação para os Bispos: são 30 no total, incluindo 12 novos membros e confirmações para 18 prelados que já tinham assento.
Para fins de análise, duas hipóteses podem ser apresentadas:
1) Os 12 novos membros refletem melhor a sensibilidade pessoal do Papa Francisco, dado que a maioria das 18 confirmações foram para o pessoal do Vaticano cujas ocupações, em regra geral, os intitula a ter uma assento na mesa.
2) Com efeito, o tipo de pessoa que o Papa Francisco escolhe para a Congregação para os Bispos é um padrão para o tipo de bispos com os quais ele quer identificar esta comissão.
Se estes postulados estiverem corretos, poderemos tirar algumas conclusões iniciais sobre como um “bispo no estilo Francisco” se parece: ideologicamente moderado com um apoio amplo dos demais bispos junto de um verdadeiro compromisso com o evangelho social.
Do México, Francisco virou-se não para o cardeal Norberto Rivera Carrera, normalmente visto como um protegido de João Paulo II e um incentivador da ala conservadora da Igreja, mas sim para o cardeal Francisco Robles Ortega, de Guadalajara, que vem de uma classe trabalhadora e que, embora nunca tenha feito parte da teologia da libertação, tem boas relações com setores progressistas da Igreja mexicana.
Dom Robles tem o respeito de seus irmãos bispos, sendo eleito, em novembro de 2012, para comandar a conferência episcopal como presidente. Este religioso tem sido lembrado também pela sua franqueza, ao se desculpar, numa homilia recente, pelos “escândalos por parte daqueles que lideraram a Igreja”.
Da Colômbia, Francisco escolheu o cardeal Rúben Salazar Gómez, que esteve em apuros por pretensamente modificar os ensinamentos morais da Igreja.
Em 2011, este recebeu críticas por expressar apoio à legalização das drogas e, em 2012, foi obrigado pela Secretaria de Estado do Vaticano a alterar alguns comentários feitos em que estava implicada a aceitação da legalização do aborto em três casos previstos pela lei colombiana, que incluía estupro, incesto e ameaça à vida da mãe.
Apesar destas controvérsias, Dom Salazar tem também o apoio dos demais bispos de seu país, tendo sido eleito duas vezes presidente da Conferência dos Bispos da Colômbia.
De Westminster, no Reino Unido, o Papa Francisco nomeou Dom Vincent Nichols, em geral visto como sendo um moderado político e doutrinal que vem sofrendo críticas da direita de seu país por sua suposta ajuda morna à velha missa em latim e pela nova estrutura criada por Bento XVI para acolher ex-anglicanos na Igreja Católica, entre outras razões.
Por outro lado, os admiradores dizem que Dom Nichols é um talentoso administrador e construtor de consensos, que trabalha como o presidente eleito da Conferência dos Bispos da Inglaterra e País de Gales.
Em termos de novos funcionários do Vaticano nomeados para a Congregação para os Bispos, o Papa Francisco acrescentou vários dentre os escolhidos por ele mesmo, incluindo seu novo secretário de Estado,
Dom Pietro Parolin, e o novo prefeito da Congregação para o Clero, Dom Beniamino Stella. Tanto este quanto aquele são diplomatas italianos aposentados conhecidos por terem abordagens pragmáticas e, normalmente, não ideológicas.
O pontífice também escolheu duas autoridades vaticanas que herdou do Papa Bento XVI, incluindo um brasileiro: o cardeal João Braz de Aviz, prefeito da Congregação para os Religiosos, que sofreu críticas por estar supostamente sendo demasiado compassivo em alguns casos, inclusive quanto às questões em curso das irmãs americanas no Vaticano.
Seus esforços em promover a reconciliação com as irmãs religiosas começaram mesmo antes de ele chegar a Roma, em uma entrevista concedida ao site National Catholic Reporter – NCR no dia em que sua nomeação, no Vaticano, foi confirmada.
“Quero aprender e caminhar junto delas”, disse a respeito das religiosas. “Precisamos ver as pessoas de perto, temos que conhecê-las, saber o que irá ajudá-las a superar todo e qualquer problema que possa existir”.
Certamente, ninguém poderá acusar Dom Braz de ter vivido uma vida protegida, desconectada dos sofrimentos das pessoas comuns dos países em desenvolvimento.
Quando ainda era um jovem padre, Dom Braz estava indo rezar uma missa quando se deparou com um assalto a carro forte. Foi ferido durante o tiroteio, com balas perfurando seus pulmões, intestinos e um olho. Embora tenha sobrevivido e os cirurgiões tenham conseguido recuperar seu olho, ainda carrega fragmentos daquelas balas em seu corpo.
De fato, Francisco não se desfez dos elementos mais conservadores da Congregação. Por exemplo, ele confirmou o cardeal George Pell, da Austrália, que igualmente faz parte do Conselho de Cardeais, assim como o cardeal espanhol Antonio Cañizares Llovera, prefeito da Congregação para o Culto Divino e conhecido em Roma como o “Pequeno Ratzinger” – não só por causa de seu tamanho diminuto, mas também por sua afinidade pelas opiniões doutrinais de Bento XVI.
Sem dúvida, o Papa Francisco acha importante manter um certo equilíbrio, contribuindo, assim, para garantir que os bispos de todo o mundo estejam aptos a entender as preocupações dos católicos em geral.
No entanto, não há dúvida também de que, a partir de segunda-feira, o Papa Francisco alterou o centro da gravidade, dentro do organismo responsável por escolher os bispos, em direção ao meio – não só com os membros dos EUA, como se vê, mas também com os demais.
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Preparando uma geração de “bispos no estilo Francisco” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU