10 Fevereiro 2014
Quase 70 bilhões de animais terrestres são mortos todos os anos para alimentar os cerca de 7 bilhões de seres humanos. São cerca de 10 animais mortos, anualmente, para cada pessoa.
A reportagem foi publicada pelo portal EcoDebate, 07-02-2014.
Segundo a FAO, a criação de animais domesticados, no mundo, a serviço do apetite do homo sapiens, atinge cerca de 200 milhões de búfalos, 800 milhões de cabritos, 1 bilhão de porcos, 1,1 bilhão de ovelhas, 1,45 bilhão de bovinos e dezenas de bilhões de galinhas. A pecuária ocupa 26% da superfície terrestre global. O Brasil tem o maior rebanho bovino do mundo, com cerca de 215 milhões de cabeças (mais gado do que gente).
O impacto da população de ruminantes, especialmente bovinos, sobre o meio ambiente é muito grande. O metano liberado a partir dos sistemas digestivos dos animais criados pela pecuária é responsável por 14,5% de todos os gases de efeito estufa emitidos pelas atividades antrópicas. O gás metano é cerca de 30 vezes mais potente que o efeito do dióxido de carbono no aquecimento do planeta (um boi gera 58 quilos de metano por ano).
O consumo anual médio per capita de carne no mundo desenvolvido foi de cerca de 80 quilos em 2012 e está projetado para crescer para 89 quilos em 2030. Enquanto isso, no mundo em desenvolvimento foi de 32 quilos em 2012, projetado para crescer para 37 em 2030. Se gasta 15 mil litros de água para produzir um quilo de carne. Além de ser ruim para o meio ambiente, o consumo de carne também afeta a saúde humana.
Segundo um estudo feito na Universidade da Califórnia, publicado no periódico JAMA Internal Medicine, as pessoas que não comem carne têm mais chances de ter uma vida longa, se comparadas com aquelas que têm uma dieta “carnívora”. O trabalho envolveu mais de 73 mil participantes, reunidos entre 2002 e 2007 e acompanhados pelo período de quase seis anos.
Um novo estudo da Clínica de Cleveland (EUA ) diz que uma substância química encontrada na carne vermelha é ruim para o coração. Segundo os pesquisadores, a carnitina é processada por bactérias no intestino, dando início a uma cadeia de eventos que resultam em altos níveis de colesterol e no aumento do risco de doenças cardíacas. Reportagem do jornal O Globo (30/01/2014) mostra que quase metade da carne bovina produzida no Brasil está fora do alcance da fiscalização do Ministério da Agricultura (Mapa) e não tem o Certificado de Inspeção Federal (CIF). Todo o controle de resíduos do uso de antibióticos, vermífugos e hormônios (que são proibidos no país) nos rebanhos cabe a órgãos municipais e estaduais, que geralmente não dispõem de meios adequados para a função.
No Reino Unido, o governo não recomenda comer mais do que 70g de carne vermelha ou processada por dia. Por tudo isto, cresce o movimento do Meatless day (pelo menos um dia sem carne na semana). Um dia sem comer carne é bom para a saúde e pode ajudar a combater o aquecimento global. Uma das campanhas de maior impacto é o Meatless Monday (“Segunda sem Carne”), movimento que surgiu nos Estados Unidos em 2003 e tem se espalhado ao redor do mundo.
O economista Nicholas Stern já defendeu comer menos carne para combater o aquecimento global. Estudo publicado pela revista Nature Climate Change propõe a redução da emissão de metano empurrando para cima o preço da carne através de um regime fiscal ou comércio de emissões. O aumento de impostos sobre a carne poderia reduzir o consumo pois “uma mudança na dieta em grande escala não vai acontecer voluntariamente , sem incentivos”. O professor de solos e mudança global na Universidade de Aberdeen, Pete Smith, um dos autores do estudo, disse: “Uma das maneiras mais eficazes para reduzir o metano é reduzir as populações globais de ruminantes, especialmente bovinos”.
No Brasil a pecuária bovina é usada, dentre outras coisas, para ocupar áreas que são desmatadas visando a comercialização e a valorização da terra. Gado, desmatamento e especulação de terras andam juntas. Reportagem publicado no Portal Ecodebate mostra que o rebanho bovino da Amazônia Legal cresceu 140% e passou de 26,6 milhões para 64 milhões de cabeças, entre 1990 e 2003, constituindo-se no principal fator de desmatamento. A violência e os homicídios também costumam acompanhar este processo. As plantações de soja também ocupam áreas desmatadas e já existem projetos no Congresso Nacional tentando legalizar a plantação de cana nas áreas em que a floresta foi destruida. Ou seja, primeiro se desmata para vender as madeiras e depois se ocupa os terrenos para as atividades antrópicas e a monetarização do território transformado em lucro e especulação. Por isto tem gente que diz que o Brail precisa de menos Friboi e mais “free boi”.
Mas a redução da população de bovinos e ruminantes domesticados não tem razões apenas econômicas. Há também uma questão ética e de respeito aos animais. Siddartha Gautama, o Buda, que viveu há cerca de 2500 anos atrás, praticava uma dieta vegetariana e defendia o direito à vida dos animais. Diversas outras personalidades da história também criticaram a matança de animais sencientes em função da alimentação humana. O veganismo defende o fim da exploração e do abuso dos animais por convicções éticas. O vegano não aceita a utilização de animais para alimentação, apropriação, trabalho, vivissecção, confinamento, nem outros usos da vida animal pelo ser humano
Portanto, reduzir a população de bovinos e demais ruminantes é uma forma de combater a escravidão animal e um meio de diminuir o desmatamento e o aquecimento global. Com mais espaços livres das atividades antrópicas, o mundo pode avançar com o processo de reselvagerização da flora e da fauna, livres do utilitarismo e do domínio onipresente de uma única espécie invasora, egoísta e espaçosa.
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Reduzir a população de bovinos para combater o desmatamento e o aquecimento global, artigo de José Eustáquio Diniz Alves - Instituto Humanitas Unisinos - IHU