“A valorização do Centro Histórico com o uso social que se pode fazer do Cais Mauá não pode ser reduzida a ganhos econômicos”, diz o sociólogo.
Para o professor e pesquisador Milton Cruz, a cidade moderna é aquela que pensa humanisticamente, valorizando os espaços públicos para convívio social, e é conectada com questões ambientais e não só econômicas. Assim, entende que a proposta de revitalização do Cais Mauá, em Porto Alegre, é uma bela oportunidade de pensar a cidade com vistas ao futuro. Entretanto, destaca que muitos desses princípios não parecem estar sendo levados em conta. “Não apresenta estudos e pesquisas que mostrem qual a dinâmica atual do Centro Histórico em termos econômicos, sociais e culturais, quais as tendências esperadas para o futuro e como o empreendimento irá promover a qualificação do desenvolvimento da região”, destaca. “Penso que o debate em torno da revitalização do Cais Mauá revela dois projetos de cidade: a cidade (rebelde) da modernidade tardia contra a cidade fordista-industrial. E que o futuro da cidade depende da capacidade da sociedade civil em apresentar um Projeto Alternativo de Modernização capaz de articular as propostas fragmentadas”, completa.
Além disso, na entrevista concedida por e-mail à Instituto Humanitas Unisinos - IHU, Cruz critica a ideia de apoiar toda a reforma num modelo econômico/comercial que visa transformar o Cais em apenas mais um grande centro de compras. “A localização de um empreendimento comercial existente em todas as partes do mundo na Orla do Guaíba (uma região peculiar da cidade) diminuiria o diferencial de Porto Alegre na rede de cidades globais e aumentaria a sua homogeneização. Queremos nos tornar iguais às demais cidades que apostaram tudo no automóvel e nos shoppings?”, questiona. E ainda há outro detalhe: o empreendimento é apoiado na dependência de um modal rodoviário já saturado. “Como um shopping com 4.800 vagas de estacionamento para automóvel na orla do Guaíba não agravará os problemas criados pela circulação dos atuais 30.000 veículos/dia? E qual a garantia de que não estamos construindo um ‘shopping fantasma’, como os existentes em muitas cidades norte-americanas, que logo precisará passar por uma reconversão em seu uso?”, acrescenta.
Milton Cruz (Foto: Câmara Municipal de Porto Alegre)
Milton Cruz é doutor e mestre em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Atua como pesquisador do Observatório das Metrópoles/Núcleo Porto Alegre. Participou como pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA e da Fundação de Economia e Estatística - FEE/RS. Ainda é graduado em Ciências Sociais e em Engenharia Eletrônica. Em 22-10-2015, ele proferiu a conferência “Cais Mauá: duas visões em disputa sobre qual o projeto de cidade”, no Instituto Humanitas Unisinos - IHU.
Ontem, 27-09-2023, o Guaíba atingiu 3m18cm e a água invadiu o Cais Mauá e avançou sobre o parque urbano da orla. Neste contexto, republicamos, a entrevista a seguir, publicada originalmente em 04 de novembro de 2015.
IHU On-Line - Como o senhor avalia o projeto de revitalização do Cais Mauá? Quais os avanços e limitações do projeto?
Milton Cruz - O Consórcio Cais Mauá afirma, no relatório de impacto social, econômico e ambiental (EIA/RIMA) apresentado para a Secretaria do Meio Ambiente de Porto Alegre, que o projeto para a Orla do Guaíba, localizado entre a Rodoviária e a Usina do Gasômetro, irá “revitalizar” a região. Mas o EIA/RIMA não apresenta estudos e pesquisas que mostrem qual a dinâmica atual do Centro Histórico (bairro que se desenvolveu com as atividades do porto Cais Mauá) em termos econômicos, sociais e culturais, quais as tendências esperadas para o futuro e como o empreendimento (formado por um Shopping, três edifícios corporativos — torres e garagens) irá promover a qualificação do desenvolvimento da região.
O Centro Histórico já tem uma dinâmica própria que o torna um dos bairros com maior poder de atração da cidade. Ali estão localizadas a sede do Governo Estadual e Municipal, a Assembleia Legislativa e a Câmara Municipal. Também conta com a maioria dos bancos presentes no estado, o Mercado Público, o Museu de Artes do Rio Grande do Sul - MARGS, o Santander Cultural, a Casa de Cultura Mário Quintana, a Usina do Gasômetro, o Anfiteatro Pôr do Sol, comércio de rua bastante diversificado. Além disso, conta com a infraestrutura de transporte que contempla o Aeroporto Internacional Salgado Filho, o trem metropolitano (Trensurb), o transporte hidroviário de turismo e de passageiros (Catamarã, Cisne Branco), a estação rodoviária (que recebe ônibus de todo país, do Mercosul e interior do estado) por onde passam as linhas municipais de quase todos os bairros da cidade, além da paisagem natural que permite aos porto-alegrenses contemplar a beleza do pôr do sol sobre as águas do Guaíba.
Exemplos de outras cidades
O EIA/RIMA também não fala das alternativas de revitalização implementadas nas áreas portuárias de outras cidades e o seu resultado econômico e social, o que ajudaria a buscar ideias para a elaboração de um projeto que mais se ajusta à realidade de Porto Alegre. Várias cidades no mundo sofreram com a perda de função de seus portos e tiveram de buscar novas alternativas para eles, como ocorreu com Boston nos anos 1950, Nova York em 1960, Baltimore em 1970, Roterdã em 1980, Buenos Aires e Barcelona em 1990, e Belém em 2000.
A modernização tecnológica dos meios de transporte e das comunicações mudou a relação da cidade com o porto assim como com as ferrovias. Mas esta modernização não é um processo natural, depende de decisões tomadas principalmente pelos governos, como foi o caso brasileiro de assumir o transporte rodoviário (as rodovias pavimentadas, o automóvel e o caminhão) como o símbolo do desenvolvimento [1]. Esta escolha produziu uma infraestrutura de transporte e um comportamento social que promove o uso exacerbado do automóvel para o transporte de passageiros e dos caminhões para o transporte de cargas em detrimento de um modelo de transporte mais equilibrado, mais eficiente em termos de gasto de energia e menos poluente, pois despreza o transporte ferroviário e hidroviário.
Fazendo uma reflexão sobre os impactos negativos do uso que se faz do automóvel nas cidades do Brasil de hoje (e destacando que estes problemas são criados por apenas 19% da população que utiliza o carro para ir ao trabalho), constatamos que ele causa mais de 45 mil mortes no trânsito por ano no país, contribui significativamente na poluição do ar, para a perda de tempo no trânsito e o estresse urbano. Neste contexto, pode-se perguntar ao Consórcio Cais Mauá e, inclusive, aos governos estadual e municipal que estão aprovando o projeto: como um Shopping com 4.800 vagas de estacionamento para automóvel na orla do Guaíba não agravará os problemas criados pela circulação dos atuais 30.000 veículos/dia? E qual a garantia de que não estamos construindo um “shopping fantasma”, como os existentes em muitas cidades norte-americanas, que logo precisará passar por uma reconversão em seu uso?
O projeto do Shopping inviabiliza a ideia de uma praça contínua (Praça Brigadeiro Sampaio) e arborizada que ligaria a Rua dos Andradas, Sete de Setembro e Siqueira Campos com a Usina do Gasômetro, criando um espaço de convivência contíguo e aberto ao público através do rebaixamento da Av. João Goulart. Esta proposta, de movimentos como o Cais Mauá de Todos [2], reduziria o ruído provocado pelos automóveis e melhoraria a sensação térmica do entorno que tem prédios residenciais.
Na perspectiva de um planejamento estratégico da cidade, é preciso considerar: em primeiro lugar, a perda de atratividade dos Shoppings, pois os dados mostram que em 1990, nos Estados Unidos, se construíram 140 por ano e em 2007 nenhum foi construído; em segundo lugar, que a localização de um empreendimento comercial existente em todas as partes do mundo na Orla do Guaíba (uma região peculiar da cidade) diminuiria o diferencial de Porto Alegre na rede de cidades globais e aumentaria a sua homogeneização. Queremos nos tornar iguais às demais cidades que apostaram tudo no automóvel e nos Shoppings?
O exemplo de Detroit, cidade norte-americana sede da General Motors que já foi a quinta maior cidade do país e hoje é a décima oitava, que em 2013 decretou falência, deve nos servir de alerta para os riscos que a cidade corre ao ficar dependente de apenas um setor econômico para o seu desenvolvimento. A concorrência das montadoras japonesas e de outros países fez desmoronar o sonho de vida dos norte-americanos daquela cidade hoje abandonada. Este exemplo recomenda que devemos analisar com cautela a justificativa da geração de empregos, pois o projeto de “revitalização” do Cais Mauá não se articula (não dialoga) com a tendência atual da economia mundial (também chamada de sociedade do conhecimento), que está mais dependente de serviços de alta especialização que suportam setores inovadores como os da tecnologia da informação.
Não foram realizados estudos sobre a evolução dos serviços e o comércio de Porto Alegre e da Região Metropolitana que hoje funcionam como uma conurbação onde se estabelecem intensas trocas e deslocamentos. Tampouco se leva em consideração os Relatórios Climáticos, como o do IPCC/AR de número 6 (Ministério da Ciência e Tecnologia/INPE), que mostra a tendência de aumento da temperatura superficial de 2 a 4 graus centígrados. Qual o impacto das mudanças climáticas no Centro Histórico e no Guaíba? Que tipo de medida mitigatória poderia ser tomada para aumentar o grau de segurança dos moradores e o bem-estar de uma região altamente densificada e com temperaturas superiores aos demais bairros? O regime de chuvas que vêm se apresentando na Região Metropolitana e no Rio Grande do Sul revela a vulnerabilidade de nossas cidades, hoje muito mais construídas (com construções que não foram projetadas para o aproveitamento da água da chuva e da energia do sol, e tampouco para o uso da arborização como reguladora microclimática e para o embelezamento da paisagem) que nos anos 1990. As chuvas deste mês fizeram o nível das águas do Guaíba igualar as marcas dos anos 1960 e mostraram que o Muro da Mauá apresenta problemas na sua contenção com o vazamento de uma das comportas, assim como as bombas instaladas para levar as águas da cidade para o Guaíba (que apresentaram problemas) e o sistema de drenagem natural.
O empreendimento apresenta como aspectos positivos a recuperação e utilização do Setor Armazéns, previsto para operar em meados de 2018 (que poderia ser a ancoragem inicial do empreendimento), a criação de uma área de convívio para população no Setor Docas, onde se situa o Frigorífico e uma Praça hoje não utilizada pela população. O diagnóstico do Centro Histórico indicou a carência de equipamentos e espaços para crianças, idosos, jovens, e famílias. O diagnóstico das carências e potencialidades do Centro recomenda que a prioridade seja dada para a revitalização e o uso imediato das Praças e dos Armazéns, com a instalação de atividades que alavanquem a atual dinâmica cultural e social já existente do outro lado do Muro da Mauá, como são as Bienais do Mercosul, a Feira do Livro, as atividades culturais do Margs e da Casa de Cultura Mário Quintana, e as visitas de turistas ao patrimônio histórico e cultural.
O cronograma físico-financeiro proposto pelo Consórcio Cais Mauá precisa ser alterado segundo estas prioridades, que poderiam ser monitoradas e avaliadas na sua função de revitalização do Centro Histórico da capital gaúcha, e que devem dar um retorno mais rápido a um menor custo e com menos riscos para a cidade. Outra potencialidade não explorada pelo empreendimento, que apenas reserva 347 vagas para bicicletas, é a instalação de uma ciclovia de 8,7 Km entre o muro e o Guaíba interligando toda a extensão do Cais Mauá com o norte e o sul da cidade, ajustando-se ao Plano Cicloviário da Prefeitura Municipal de Porto Alegre.
As questões problemáticas aqui apresentadas fazem parte do mundo contemporâneo em rápida transformação, mas que o EIA/RIMA não leva em consideração, pois o seu enfoque é o do planejamento e da construção da cidade fordista-industrial, hoje em declínio. A velocidade com que os governos locais conseguem tomar (boas) decisões para o planejamento que prepara as cidades para as mudanças sociais, econômicas e ambientais ainda é mais lenta que a dos problemas criados pela modernização urbana e as mudanças climáticas.
IHU On-Line - Em que medida a recuperação do Cais Mauá pela iniciativa privada, tornando-o também um empreendimento imobiliário, ressignifica o debate acerca dos espaços públicos e de uso comum da cidade? Como deve ser o papel do poder público nesse processo?
Milton Cruz – O projeto, que se vislumbra no EIA/RIMA apresentado ao órgão municipal encarregado de aprovar o andamento do empreendimento, segue a lógica das grandes obras que buscam ganhar com a infraestrutura urbana instalada e a dinâmica social e econômica de uma região com capacidade de atração de consumidores de toda cidade e da Região Metropolitana. Uma região que agregará ao seu patrimônio histórico e cultural a paisagem do Guaíba e do Pôr do Sol, que hoje não pode ser desfrutada, com todo o valor simbólico e afetivo que a população porto-alegrense lhe atribui [3]. A valorização do Centro Histórico com o uso social que se pode fazer do Cais Mauá não pode ser reduzida a ganhos econômicos a serem garantidos por consumidores. O espaço é, em primeiro lugar, um patrimônio de uma cidade que pode e deve ter garantida a sua função social criando lugares de convivência aos diferentes estratos sociais e espaços de educação urbana para a cidadania.
Para que a cidade cumpra sua função de educadora da cidadania e garanta o bem-estar coletivo, o Poder Público deve atuar como mediador e regulador dos empreendimentos que impactam na vida da cidade, equilibrando o interesse econômico privado com as demandas da população e as recomendações de especialistas como os estudiosos das mudanças climáticas. Continuar acreditando que mais construções (edifícios, viadutos etc.) é sinônimo de desenvolvimento é não aprender com o passado recente que nos apresenta muitos exemplos de obras que não cumprem papel algum no desenvolvimento e ainda deixam problemas para o Poder Público resolver, mas que garantiram o lucro de empresas da construção civil.
De acordo com um levantamento feito pela BBC Brasil, o prejuízo de apenas três "elefantes brancos" da Copa — os estádios Mané Garrincha (Brasília), Arena da Amazônia (Manaus) e Arena Pantanal (Cuiabá) — atingiu pelo menos R$ 10 milhões desde o fim do Mundial. O exemplo da Copa indica que ainda domina a prática da implantação de grandes empreendimentos na cidade sem consulta à população, como recomenda o Estatuto da Cidade de 2001, sem análise do papel do empreendimento na dinâmica real da cidade e da região e sem o acompanhamento da sociedade nas fases de planejamento, implantação e funcionamento das obras.
Este aprendizado sugere que o melhor seria a participação da sociedade na definição de qual o melhor projeto para o Cais Mauá. O instrumento da Operação Urbana Consorciada permite a participação da sociedade, dos moradores, do empreendedor e do governo em obras que impactam significativamente na cidade. A Lomba do Pinheiro, um bairro da zona leste de Porto Alegre, vem implementando um projeto-piloto de Operação Urbana Consorciada. Esta Lei Complementar nº 627/2009 permite, por meio de uma parceria entre o poder público e o setor privado, alternativas de financiamento para a organização do transporte coletivo, ampliação dos espaços públicos, implantação de programas habitacionais de interesse social ou mesmo a melhoria da infraestrutura e do sistema viário da região onde é realizada [4]. Esta experiência compreende um conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Executivo Municipal, por intermédio da Secretaria do Planejamento Municipal – SPM, com a participação de proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados. O objetivo é alcançar transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização ambiental na área.
Poderia ser proposta criação de um Comitê de Desenvolvimento do Centro Histórico para formular e acompanhar os planos e os projetos urbanísticos com 1/3 (um terço) de representantes do Município, 1/3 (um terço) de representantes da comunidade local, e 1/3 (um terço) de representantes da sociedade civil organizada; e a criação de uma Operação Urbana Consorciada do Centro Histórico; além da criação de um Sistema de Acompanhamento das Ações do Cais Mauá, que se relaciona com mais de 15 programas e projetos do município.
Levando em consideração os usos que a população faz da Orla do Guaíba, onde ela tem acesso livre para caminhar, namorar, andar de bicicleta e skate, passear com o cachorro, tomar um chimarrão, passear de barco ou sentar para contemplar o momento em que o sol se põe no horizonte e sobre o “espelho d´água” que o Guaíba cria, é de se perguntar se as pessoas poderão fazer o mesmo no Cais Mauá. O convívio da população com esta paisagem desperta emoções que se expressam em palavras como: “minha cidade amada”, “maravilhoso”, “saudades”, “amo tudo isso” e “rio mais lindo do mundo”, o que mostra o valor afetivo dos porto-alegrenses com a Orla do Guaíba e que deveria ser preservado e até estimulado pelo projeto. Valorização que se agregaria ao patrimônio cultural, afetivo e à identidade da cidade, que ainda não aparece na proposta de revitalização do Cais Mauá, mas que poderia tornar o empreendedor um exemplo de agente econômico inovador na realização de uma iniciativa orientada pela responsabilidade ética, social e ambiental.
IHU On-Line - O muro da Avenida Mauá é visto por muitos como entrave para integrar a cidade à orla do Guaíba. Como o senhor vê esse debate acerca do muro e das barreiras físicas que impedem essa integração? E que outras barreiras não físicas estão em jogo nessa ideia de revitalizar o espaço?
Milton Cruz - Acredito que o muro da Mauá tornou-se um símbolo emblemático das barreiras que impedem o acesso ao patrimônio cultural e afetivo da cidade que a população porto-alegrense valoriza muito, como a Orla do Guaíba, o Parque da Redenção e a Feira do Livro. Desde 1941 o muro nunca foi acionado para proteger a cidade como foi projetado e, talvez, viesse a falhar em muitos pontos como sugere o vazamento de uma das comportas neste ano de 2015 e os alagamentos na Rodoviária, Voluntários e outras regiões ao norte do Centro Histórico. Passaram-se 74 anos sem que a população, principalmente a do Centro, pudesse ter acesso ao Cais e suas praças. Várias gerações perderam a oportunidade de criar seus filhos em contato com o Guaíba, o que não pode ser mensurado economicamente, mas deve ser avaliado na perspectiva da educação urbana que a cidade propicia, ou não, aos seus moradores, principalmente para aqueles que não têm acesso aos bens culturais e econômicos fundamentais para a formação da consciência cidadã moderna.
Na perspectiva da (boa) cidade do futuro, aquela que promove valores como o respeito ao outro e ao diálogo, se fazem necessários projetos que promovam a interação entre indivíduos diferentes em termos de renda, culturais, crença religiosa e etnia, de forma a que as crianças aprendam, desde pequenas, a conviver com pessoas que partilham valores distintos daqueles da sua família. Condomínios fechados, prédios e casas gradeados, parques e praças cercados constroem uma percepção social da cidade que está em perigo e que precisa se proteger, e desconstrói a imagem da cidade acolhedora e amiga que permite que as crianças brinquem na rua.
Felizmente temos projetos que fecham por alguns dias no ano as ruas, dominadas pelo automóvel, para as crianças brincarem com seus pais (como no dia da Criança), para o aniversário da Associação de Moradores ou para os ciclistas realizarem oficinas aos que querem aprender a andar. Ver crianças brincando com seus pais ou ciclistas andando na rua desenvolve uma percepção de bairro muito mais amigável e afetiva que aquela imagem produzida pelos carros andando velozmente pela mesma via. A mudança de uso do espaço urbano produz percepções e sentimentos diferentes sobre as possibilidades que a cidade moderna oferece. Os projetos devem qualificar esta percepção e as sensações que o indivíduo urbano elabora ao interagir com seu bairro e a cidade.
Para muitos pesquisadores, as mudanças radicais pelas quais estamos passando caracterizariam um novo período do capitalismo que vem sendo denominado como a sociedade pós-moderna (Harvey) [5] ou sociedade da modernidade tardia (Giddens) [6]. Para Giddens, este período cria instabilidades que ameaçam a segurança do indivíduo, isto é, podem desorganizar a sua capacidade de dar um sentido de ordem e continuidade ao seu “projeto de vida”. Esta habilidade do indivíduo em dar sentido a sua vida é fundamental para a experimentação de emoções estáveis positivas, para se evitar a ansiedade e o adoecimento, e para se construir uma sociedade emancipada das relações que geram subjetividades alienadas e dependentes.
Para Boaventura de Sousa Santos [7], a sociedade que caminha para a emancipação não pode reproduzir as relações de poder e alienação que caracterizam a ação instrumental que hoje domina a economia e a política. O projeto da sociedade emancipada deve ser conduzido por uma subjetividade que orienta sua ação a partir do “mapa emancipatório” que busca o reconhecimento (identidade) e a redistribuição (igualdade) e tem como princípios norteadores a solidariedade (ética), a participação (política), e a expressão estética (prazer, autoria, artefactualidade). Para Habermas [8], os espaços sociais devem garantir interações comunicativas que se baseiem na consistência dos argumentos e no reconhecimento do outro como portador de opiniões que devem ser valorizadas e levadas em consideração na tomada de decisão. As experimentações participativas como o Orçamento e o Planejamento Participativo seriam criações locais que privilegiam este tipo de interação, as trocas comunicativas.
A partir destas abordagens, é necessário analisar o projeto e a prática dos atores, que se destacam no planejamento e na construção da cidade da modernidade tardia, buscando por elementos que caracterizam os espaços, os equipamentos, as tecnologias e os modos de gestão que favorecem a convivência urbana e dão estabilidade e segurança para o indivíduo interagir comunicativamente e viver a cidade como criação e construção (social) organizada para o bem-estar coletivo. Lugares como a praça pública em que pais e filhos podem brincar após o trabalho e aos fins de semana, equipamentos e tecnologias modernas como o transporte público que permite deslocar-se pela cidade em busca de serviços de saúde e atividades culturais e de lazer, e governança e gestão inovadoras que introduzem novos instrumentos de participação e novas modalidades de deslocamento com as ciclovias e as pedovias (que incentivam andar de bicicleta e a pé).
IHU On-Line - Como se integrar a debates como esse do Cais, que tratam de recuperação de áreas públicas, evitando que se tornem apenas mercadoria do capital especulativo e mercado imobiliário? Qual o papel da sociedade civil nesse contexto?
Milton Cruz - A sociedade civil cumpriu um papel muito importante na luta contra o modelo de cidade construído pelo regime político-econômico ditatorial, um modelo elitista, excludente e que dispensava a participação ativa e organizada da sociedade na elaboração de políticas públicas. A sociedade civil conseguiu introduzir na Constituição de 1988 e nas Leis Orgânicas Municipais o direito do indivíduo de participar do planejamento da cidade, e com a criação do Ministério das Cidades e a aprovação do Estatuto da Cidade, de 2001, definiu diretrizes para a organização da Cidade de modo que ela cumpra a sua função social, isto é, para que ela não se torne uma mercadoria acessível apenas àqueles que podem pagar, mas que acolha a todos que contribuem para a sua construção e aos jovens que herdarão suas virtudes e seus problemas.
Entretanto, acredito que este período de muita atividade e criatividade se esgotou. A euforia com a participação social desapareceu e a crença no seu poder transformador hoje é desestabilizada pelo poder fragmentador e desorganizador das relações políticas e econômicas clientelistas. Estamos vivenciando um período em que o Orçamento Participativo (que ainda hoje é inspiração para mais de mil cidades de todo mundo que o experimentam em diferentes modalidades) enfrenta grandes dificuldades para realizar a promessa de passarmos, segundo Abers (2000), “Do clientelismo à cooperação” e consolidarmos uma nova arquitetura de gestão pública capaz de fazer interagir o governo local com a organização da sociedade civil na produção de políticas públicas que respondam, de modo participativo e inovador, aos desafios da sociedade da complexidade e da transformação acelerada e às expectativas da sociedade que busca o bem-estar individual e coletivo.
Mas a sociedade civil ainda cumpre um papel fundamental na desnaturalização da atual modalidade de modernização e no esclarecimento e na formação de uma opinião pública que seja capaz de intervir em favor da construção de uma cidade culturalmente rica e diversificada que se mostre capaz de se rebelar contra a homogeneização e ao fenômeno que vem tornando as instituições e os negócios cada vez mais permeáveis à prática da corrupção e da troca de favores. A cidade de Porto Alegre já deu mostras desta capacidade ao criar o Orçamento e o Planejamento Participativo, o Fórum Social Mundial, ao organizar o Movimento do Não contra o projeto do Pontal do Estaleiro e, agora, o Movimento Cais Mauá Para Todos.
Entretanto, este é um período de grande fragmentação da ação política e governamental (de emperramento das instituições democráticas) em que a cidade e a cidadania reclamam por novas modalidades de participação nos benefícios criados pela produção urbano-industrial que é, hoje, a maior da história da humanidade, mas ainda é extremamente mal distribuída. A rede de cidades brasileira cresceu muito nos últimos anos acrescentando aos polos tradicionais de desenvolvimento, como as metrópoles de São Paulo e Rio de Janeiro, muitas outras regiões que estão demandando políticas públicas eficazes na mobilidade urbana, na segurança, na saúde, e, principalmente, na inclusão de muitos na categoria de cidadãos e projetos de bairros e territórios que garantam o bem-estar individual e coletivo.
IHU On-Line - A partir do debate em torno da revitalização do Cais Mauá, como pensar um projeto de cidade do futuro que preconize não só desenvolvimento econômico, mas também bem-estar social em ambientes urbanos?
Milton Cruz - Penso que o debate em torno da revitalização do Cais Mauá revela dois projetos de cidade: a cidade (rebelde) da modernidade tardia contra a cidade fordista-industrial. E que o futuro da cidade depende da capacidade da sociedade civil em apresentar um Projeto Alternativo de Modernização capaz de articular as propostas fragmentadas (ainda muito influenciadas pelo modelo fordista-industrial de cidade) e convencer a opinião pública da sua consistência e sustentabilidade. Os instrumentos de regulação, controle e planejamento devem orientar-se a partir do objetivo da modernização includente que promove os valores da cidadania e a construção da subjetividade comprometida com o futuro da humanidade. Faz urgente regular o “apetite” voraz de setores do mercado em lucrar com o patrimônio histórico e cultural e a infraestrutura urbana construída pelas gerações anteriores.
[1] O Plano de Metas de Juscelino Kubitschek destinou 93% dos recursos para os setores dos transportes, energia, e indústrias de base, enquanto os outros dois setores incluídos no plano, alimentação e educação, ficaram com o restante. Fonte: http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/artigos/Economia/PlanodeMetas. Acesso em 27/10/2015. (Nota do entrevistado)
[2] Cais Mauá de Todos: movimento coletivo de resistência ao modelo empregado no projeto de revitalização do Cais Mauá e que luta pelo uso comum da área pública. Saiba mais sobre o grupo em http://on.fb.me/1SlJVyC. (Nota da IHU On-Line)
[3] As páginas do Facebook intituladas “Pôr do Sol na Orla do Guaíba” e “Orla do Guaíba” apresentam, respectivamente, 2.248 e 52.576 “curtidas” e “visitas”, fotos do sol no horizonte, do “espelho d´água” e comentários sobre o que os usuários sentem ao caminhar, namorar, andar de bicicleta e skate, passear com o cachorro, tomar um chimarrão, passear de barco ou sentar para contemplar o momento em que o sol se põe. A paisagem desperta emoções que se expressam em palavras como: “minha cidade amada”, “maravilhoso”, “saudades”, “amo tudo isso”, e “rio mais lindo do mundo”. Fontes: https://www.facebook.com/P%C3%B4r-do-Sol-na-Orla-do-Gua%C3%ADba-196859143678334/; e https://www.facebook.com/pages/Orla-do-Gua%C3%ADba/185301931541340. Acesso em 27/10/2015. (Nota do entrevistado)
[4] Fonte: SMURB, Secretaria da Prefeitura de Porto Alegre. (Nota do entrevistado)
[5] David Harvey (1935): é um geógrafo marxista britânico, formado na Universidade de Cambridge. É professor da City University of New York e trabalha com diversas questões ligadas à geografia urbana. (Nota da IHU On-Line)
[6] Anthony Giddens: sociólogo inglês, foi diretor da "London School of Economics and Political Science" (LSE). É autor de 34 obras, publicadas em 29 línguas, e de inúmeros artigos. Em 1985 foi co-fundador da "Academic Publishing House Polity Press". É também conhecido como o mentor da idéia da Terceira Via. Entre suas obras publicadas em português citamos As Conseqüências da Modernidade (Oeiras: Celta, 1992); Capitalismo e moderna teoria social: uma análise das obras de Marx, Durkheim e Max Weber (Lisboa: Editorial Presença, 1994); Transformações da Intimidade – Sexualidade, Amor, e Erotismo nas Sociedades Modernas (Oeiras: Celta Editora, 1996). (Nota da IHU On-Line)
[7] Boaventura de Sousa Santos (1940-): doutor em Sociologia do Direito pela Universidade de Yale, Estados Unidos, e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Portugal. É um dos principais intelectuais da área de ciências sociais, com mérito internacionalmente reconhecido, tendo ganho especial popularidade no Brasil, principalmente depois de ter participado nas três edições do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre. Confira a entrevista O Fórum Social Mundial desafiado por novas perspectivas, concedida por Boaventura ao sítio do Instituto Humanitas Unisinos – IHU em 30-01-2010, disponível em http://bit.ly/BoaventuraIHU. (Nota da IHU On-Line)
[8] Jürgen Habermas (1929): filósofo alemão, principal estudioso da segunda geração da Escola de Frankfurt. Herdando as discussões da Escola de Frankfurt, Habermas aponta a ação comunicativa como superação da razão iluminista transformada num novo mito, o qual encobre a dominação burguesa (razão instrumental). Para ele, o logos deve contruir-se pela troca de idéias, opiniões e informações entre os sujeitos históricos, estabelecendo-se o diálogo. Seus estudos voltam-se para o conhecimento e a ética. (Nota da IHU On-Line)
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