31 Mai 2023
Dom José Luis Azuaje, arcebispo de Maracaibo (Venezuela), foi presidente da Caritas América Latina e Caribe durante os últimos 10 anos. Nesta entrevista, ele faz um balanço do que viveu durante este tempo, destacando alguns elementos que marcam o que o Papa Francisco chama de "a carícia da Mãe Igreja para os seus filhos mais necessitados".
A entrevista é de Luis Miguel Modino.
Como linha fundamental da Caritas, destaca o "serviço aos irmãos mais necessitados, aos pobres", ao ponto de sublinhar que "se se desligar deste serviço aos irmãos mais necessitados, pode ser outra coisa que não a Caritas". Isto é importante num continente marcado por vários problemas, como o empobrecimento, a desigualdade e o desenraizamento das famílias.
Uma Caritas que teve um papel fundamental durante a pandemia da Covid-19, pois esteve sempre presente. Um processo que deve ser continuado, "com um sistema sinodal, de redes, de quadros, de articulações onde todos podem participar e ninguém fica de fora".
O que significou para o senhor ser presidente da Caritas América Latina e Caribe nos últimos 10 anos?
Primeiro, uma graça de Deus, porque muitas vezes estamos quietos nas nossas dioceses e somos chamados para certos serviços, e quando nos sentimos chamados pela Igreja, respondemos. E esse chamamento, sobretudo neste tempo, que para mim é privilegiado, porque coincide com um tempo entre Bento e o Papa Francisco, é um tempo de grande mobilidade, de grande criatividade, sobretudo na área da doutrina, que aprendemos com o Papa Bento, com as grandes encíclicas sobre a caridade, bem como tudo no campo da prática pastoral, que sugere um dinamismo, criar coisas novas, pôr mãos à obra, e agora estamos num processo sinodal que, mais do que qualquer outra coisa, é simplesmente a própria essência da Igreja.
O que é que mais o marcou pessoalmente durante este tempo?
O encontro com os nossos irmãos e irmãs mais necessitados. Nos diferentes países, nas diferentes experiências das Caritas nacionais há sempre um ponto fundamental, que é o serviço aos irmãos mais necessitados, aos pobres, e isso dá-nos uma orientação fundamental, que se a Caritas continuar a enquadrar-se sobretudo neste serviço aos irmãos mais necessitados é porque está a cumprir a sua missão, se se desligar deste serviço aos irmãos mais necessitados, pode ser outra coisa qualquer que não a Caritas.
Por isso é importante sentirmo-nos imersos nesta realidade. O Papa Francisco diz-nos, tocar a realidade, tocar a dor humana, tocar a dor da mãe terra. Isso é fundamental para podermos ter um processo de conversão pessoal, pastoral e eclesial dentro de nós.
Fala de dor, quais são as principais dores que a América Latina e o Caribe e os seus povos têm vivido nos últimos anos?
O empobrecimento é uma das dores mais graves, a desigualdade é outra das dores mais graves, o desenraizamento familiar, e vemos migrações forçadas, tanto na área da violência como também na área das políticas erráticas em muitos dos nossos países. Creio que são grandes dores que o nosso povo está a viver e que, pouco a pouco, a Caritas tem respondido e quer continuar a responder através das suas equipes de trabalho.
Respostas que poderíamos dizer que aumentaram durante a pandemia da Covid-19. Na sua opinião, qual foi a importância da missão da Caritas durante esse período que afetou tanto a vida das pessoas no continente?
A primeira importância é que a Caritas esteve sempre presente, muitas instituições ficaram paralisadas exceto a Caritas, a Caritas manteve a sua atividade. É uma coisa muito bonita quando se faz um balanço, esteve em todos os países, mesmo com o risco da vida humana de cada um dos servidores, mesmo dos voluntários. Este é um elemento fundamental neste tempo de pandemia e sobretudo de tanto sofrimento, acompanhar os nossos irmãos e irmãs, não só no campo da medicina, mas também na própria família.
A criatividade com que se desenvolveram tantas atividades e ações a favor dos nossos irmãos e irmãs mais necessitados naquele momento, sobretudo os que estavam infectados. Este é um elemento fundamental da nossa Caritas, a nossa Caritas nunca esteve fechada, esteve sempre aberta.
Poderíamos dizer que a Caritas é a melhor expressão ou uma das melhores expressões da Igreja em saída de que tanto fala o Papa Francisco?
O próprio Papa Francisco o diz, a Caritas é a carícia da Mãe Igreja para os seus filhos mais necessitados. Isto é fundamental, devemos continuar a cultivá-la e aprofundá-la, e neste sentido é um apelo agora que vamos começar um novo mandato de quatro anos, com novas autoridades, com novas equipes de trabalho, muitas pessoas serão chamadas a prestar os seus serviços, a fazê-lo de forma desinteressada e sobretudo com sentido de fé, profundamente de fé pela dedicação aos irmãos mais necessitados de toda a América Latina e Caribe.
E o que diria aos novos dirigentes da Caritas América Latina e Caribe, o que os encorajaria a fazer neste caminho que agora se inicia com o 20º Congresso da Caritas América Latina e Caribe?
Continuar o processo, o processo que já está a decorrer há alguns anos. A primeira área do processo é o trabalho sinodal, que tentamos canalizar a partir da área das redes de serviços com articulações. Nestes 10 anos, foram criadas muitas instituições, REPAM, REMAM, CEAMA, CLAMOR, Rede Aquífero Guarani e Gran Chaco, plataformas de direitos humanos, assistência à infância.
São plataformas que foram criadas onde a Caritas esteve envolvida e vai continuar envolvida. Sabemos que Dom Gustavo, assim como Nicolás e tudo o que é CORE, os responsáveis por áreas, que é a governação da Caritas América Latina e Caribe, vão continuar a aprofundar estas questões que já vêm de há alguns anos, mas sobretudo com um sistema sinodal, redes, quadros, articulações onde todos podem participar e ninguém fica de fora.
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“Se a Caritas se desligar deste serviço aos mais necessitados, pode ser outra coisa que não ela mesma”. Entrevista com Dom José Luis Azuaje, presidente da Caritas América Latina e Caribe - Instituto Humanitas Unisinos - IHU