As mulheres da Amazônia em um sistema de violação de direitos. Artigo de Ivânia Vieira

(Foto: Reprodução | Portal Amazônia)

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09 Março 2023

"As lutas das mulheres da floresta pelo direito à vida percorrem, há séculos, os caminhos desse emaranhado de impedimentos do qual participam os poderes executivo, legislativo e judiciário, as instituições", escreve Ivânia Vieira, jornalista, professora da Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), doutora em Processos Socioculturais da Amazônia, articulista no jornal A Crítica de Manaus, cofundadora do Fórum de Mulheres Afroameríndias e Caribenhas e do Movimento de Mulheres Solidárias do Amazonas (Musas).

Eis o artigo. 

A invisibilidade atua vigorosamente para estabelecer posicionamentos da consciência coletiva. Quando se captura os sentimentos de desprezo e do não-reconhecimento – esteio da invisibilidade social – e os relacionam os temas mulheres, mulheres indígenas, negras, transgêneros, povos indígenas e Amazônia é possível dimensionar o tamanho do efeito do sistema de invisibilizar pessoas, territórios, regiões.

Na Amazônia, a vida das mulheres está diretamente vinculada a esse complexo. A região é percebida como periferizada em país periférico membro da América Latina igualmente submetida a invisibilização que, por sua vez, manejam o jogo de poder e criam camadas de invisibilidades internas.

As lutas das mulheres da floresta pelo direito à vida percorrem, há séculos, os caminhos desse emaranhado de impedimentos do qual participam os poderes executivo, legislativo e judiciário, as instituições. Esse conjunto se pronuncia por meio da montagem e operacionalização da estrutura de invisibilização social, e tem por parte da sociedade o referendo na instância da consciência coletiva – o conjunto de crenças e de sentimentos comuns a participantes da mesma sociedade determinado com vida própria, como propõe Durkheim.

A consciência coletiva pode levar a constrangimentos e coação forçando os membros da sociedade às regras de conduta estabelecidas nesse sistema. Na Região Amazônica, as marcas desse agir estão espalhadas e enraizadas impondo sujeição territorial, aos povos e às culturas amazônicas. As mulheres enfrentam um conjunto de violências silenciadas ou transformadas, tratadas por outras etiquetas e até reapresentadas ao mundo, pela lente hegemônica, como características próprias dessas mulheres filhas da Amazônia.

A potência da ação de invisibilidade responde, entre outros aspetos, pela produção ainda acanhada de trabalhos científicos que tratem da vida das mulheres na Amazônia profunda; desnudam continuamente os processos sistemáticos de violação dos direitos dessas mulheres; estabeleçam um eficiente monitoramento das condições de existência, o que envolve acesso à atenção médica integral, à segurança, à valorização de suas culturas e seus modos de viver.

Às mulheres da Amazônia falta a presença efetiva do Estado e sobram os ataques, os atentados, as agressões e os assassinatos. A convergência da omissão e do patriarcado faz funcionar uma força de intencionalidade na vigência dos mecanismos de violência contra a mulher e na acomodação do sistema para continuar operando os mecanismos dessa prática de violação da integridade física, psicológica, dos direitos sociais dos quais a pessoa mulher é detentora.

A educação como prática da liberdade é um dos instrumentos para promover ranhuras e realizar transformações necessárias, como a desconstrução contínua do sistema patriarcal que molda os processos mentais e normatizam a opressão das mulheres. Inquietar-se e agir para a inclusão da perspectiva da mulher nos acontecimentos, na história é um dos passos desse exercício.

É esse megaesquema do invisibilizar, realimentado pelas instituições, que as mulheres da Amazônia enfrentam no dia a dia e tentam desmontá-lo, dar visibilidade, denunciá-lo e superá-lo. Fazem lutas solitárias, desdobram-se para avançar no eco dessas vozes e na garantia de um princípio, o direito de viver como pessoas detentoras de direitos humanos e de dignidade.

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