"Nos anos 1960-70, os sociólogos identificavam a secularização com o fim da religião. No entanto, algo mudou nos anos 1980. A história da secularização que havia sido feita até aquele momento não se sustentava mais porque a religião não estava de forma alguma desaparecendo. Eu já não acreditava na sociologia oficial há muito tempo, então decidi oferecer outra história. É o que fiz no livro A Secular Age". É assim que o filósofo canadense Charles Taylor resumiu ao L'Osservatore Romano, em 2019, os motivos que o estimularam a escrever e publicar seu célebre livro em 2007 - traduzido e publicado pela Editora Unisinos, São Leopoldo, 2010, sob o título "Uma era secular" -, que investiga o lugar da religião em nossas sociedades, que mudaram profundamente nos últimos séculos.
Ao se defrontar com o problema central "O que significa dizer que vivemos em uma era secular?", o filósofo argumenta que os distintos itinerários que as pessoas percorrem em suas vidas particulares - que em muitos casos as levam a buscar diferentes experiências religiosas, algumas, inclusive, incompatíveis e contraditórias entre si -, é o diferencial o aspecto importante do nosso tempo. "Acredito que o que é realmente importante na época atual seja o conceito de itinerário. As pessoas seguem itinerários muito diferentes; mesmo que o caminho seja o cristão, as pessoas hoje são movidas por diferentes interesses e paixões. E aqui está algo verdadeiramente extraordinário. De certo modo, no mundo atual, toda a tradição cristã é vivida de maneira contemporânea. Quero dizer que, nesta época, há uma enorme quantidade de busca espiritual e essa busca se concentra em fontes de épocas muito diferentes, pertencentes a diferentes tradições. As pessoas são atraídas por coisas diferentes em seu itinerário", observou, quando esteve em Roma para receber o Prêmio Ratzinger.
Anos antes, em 2015, ao comentar aspectos de A Secular Age em entrevista ao jornal El País, reproduzida no site do IHU, Taylor destacou as "diferentes maneiras de ser cristão ou ateu" nos dias de hoje. "É uma situação completamente nova na história da humanidade. Minha ideia era descrever o presente e entender como se passou da fé para a falta de fé".
Um dos efeitos dessa transição e mudança de época, destaca, pode ser observado no modo como as pessoas atribuem sentido à vida ou têm dificuldades de encontrar respostas para essa que é uma das questões da existência humana. "Hoje as pessoas não têm claro o sentido da vida. Há séculos sabiam que cada um tinha que ganhar sua salvação – como se falava em Quebec – obedecendo a Igreja, sendo um bom cristão. E havia um imenso medo de ser condenado. O significado da vida era tão claro que ninguém se queixava da falta de sentido. Com as mudanças, alguns acreditam que a vida não tem sentido. As reações podem variar desde uma tentativa de encontrar sentido no absurdo, como Camus, até se afundar ou paralisar. Acho que existe algo no ser humano que age contra isso: um desejo de sentido. Pode-se dizer que a vida não tem sentido ou que o sentido é incerto, mas há constantemente no homem movimentos de significação que renascem na vida e isso indica que somos menos diferentes dos antigos do que pensamos, às vezes com um sentimento de superioridade", pontuou.
Autor de, entre outros, Sources of the Self (1989) (As fontes do "self" - A construção da identidade moderna) e The Malaise of Modernity (1992), Charles Taylor participará do XX Simpósio Internacional IHU - A (I)Relevância pública do cristianismo num mundo em transformação, promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU.
Esta é a segunda vez que o filósofo participa de eventos promovidos pelo IHU. Em 2013, em sua primeira visita ao Brasil, ele participou do Ciclo de Debates desenvolvido em duas perspectivas temáticas: "O debate liberais-comunitários: colóquio com Charles Taylor", que ocorreu nos dias 24 e 25 de abril, e "Religiões e Sociedade nas trilhas da secularização. Diálogos com Charles Taylor", realizado entre 26 e 29 daquele mês. Na ocasião, Taylor ministrou a conferência "Pertença religiosa numa era secular. Desafios e possibilidades".
Influenciado teoricamente pelos teólogos franceses Henri-Marie de Lubac, Jean Daniélou e Yves-Marie-Joseph Congar, e orientado em suas pesquisas acadêmicas pelo filósofo Isaiah Berlin e pela filósofa Elizabeth Anscombe, Charles Taylor é um dos expoentes do comunitarismo, juntamente com o filósofo britânico Alasdair MacIntyre, e participa do debate público discutindo de modo inter-relacionado temas como política e religião a partir do multiculturalismo.
No ano passado, o professor emérito do Departamento de Filosofia da McGill University, no Canadá, publicou o artigo "Liberdade e igualdade não bastam: uma cartilha sobre a Fratelli tutti" na revista americana Commonweal, sobre a mais recente encíclica papal e a profunda divisão das sociedades democráticas. "Francisco está agudamente ciente da maneira pela qual a nossa fé neoliberal demasiadamente grande na globalização e nos mercados aumentou a desigualdade, a divisão, o ressentimento e uma sensação de injustiça", declarou. No texto, reproduzido no sítio do IHU, ele resume não só as constatações, mas também os convites reiterados pelo pontífice. "Francisco não está apenas nos dizendo que não cumprimos com nossas responsabilidades morais, que ficamos aquém das exigências (morais) do Evangelho; além dessas exigências morais, o Evangelho também nos convida a crescer, a emergir das nossas vidas estreitas e movidas pelo medo".
A situação dos imigrantes, para a qual o Papa Francisco tem chamado a atenção desde o início do seu pontificado, também tem sido um tema abordado por Taylor em suas reflexões sobre como o comunitarismo pode oferecer uma saída aos impasses gerados pela coexistência de várias culturas num mesmo território, em contraposição a visões universalistas e individualistas. Em artigo publicado na revista Reset em 2011, o filósofo criticou a postura dos países contrários ao ingresso daqueles que fogem de seus países por causa dos conflitos políticos, sociais e pela falta de oportunidades. "A campanha europeia contra o 'multiculturalismo' muitas vezes parece ser um caso clássico de 'falsa consciência', em que a culpa de determinados fenômenos de guetização e de alienação dos imigrantes é endossada a uma ideologia externa, em vez de reconhecer a incapacidade da política nacional de promover a integração e de combater a discriminação", disse.
Em sua homilia na cidade de Lampedusa, ao Sul da Itália, uma principais rotas de entrada de refugiados do Norte da África em direção à Europa, em 08 de junho de 2013, o Papa cunhou uma das frases clássicas de seu pontificado: "A globalização da indiferença nos tirou a capacidade de chorar". Como o próprio Francisco anunciou, a homilia daquela celebração teve como objetivo "propor uma provocação à consciência de todos", a partir das perguntas do próprio Deus: "'Adão, onde estás?': é a primeira pergunta que Deus faz ao homem depois do pecado. 'Onde estás, Adão?'. E Adão é um homem desorientado, que perdeu o seu lugar na criação, porque presume que vai tornar-se poderoso, poder dominar tudo, ser Deus. E quebra-se a harmonia, o homem erra; e o mesmo se passa na relação com o outro, que já não é o irmão a amar, mas simplesmente o outro que perturba a minha vida, o meu bem-estar. E Deus coloca a segunda pergunta: 'Caim, onde está o teu irmão?' O sonho de ser poderoso, ser grande como Deus ou, melhor, ser Deus, leva a uma cadeia de erros que é cadeia de morte: leva a derramar o sangue do irmão! Estas duas perguntas de Deus ressoam, também hoje, com toda a sua força! Muitos de nós – e neste número me incluo também eu – estamos desorientados, já não estamos atentos ao mundo em que vivemos, não cuidamos nem guardamos aquilo que Deus criou para todos, e já não somos capazes sequer de nos guardar uns com os outros. E, quando esta desorientação atinge as dimensões do mundo, chega-se a tragédias como aquela a que assistimos".
Para discutir o papel do cristianismo hoje, num mundo secularizado, "ferido", "indiferente" e "doente", como o qualifica o Papa Francisco, Charles Taylor ministrará a conferência "Secularização e o papel do cristianismo hoje. Desafios e perspectivas", na próxima quinta-feira, 17-06-2021, às 10h. A palestra será transmitida pela página eletrônica do IHU, pelo Canal do IHU no YouTube, via Zoom e pelas redes sociais do IHU.
O XX Simpósio Internacional IHU iniciou em 04 de junho e terá palestras mensais ao longo do ano de 2021, de forma virtual e gratuita. Todas as atividades serão transmitidas com a opção bilíngue pela plataforma Zoom, e em português pelo canal IHU Comunica do Youtube, e nas páginas do IHU no Facebook e no Twitter. Para garantir certificação de participação, é necessário realizar inscrição neste link e acompanhar as informações para o registro de presença nos chats das atividades.
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A coordenação do Simpósio também está recebendo artigos para a apresentação de comunicações no dia 22 de outubro. Os trabalhos podem ser enviados até dia 20 de setembro. Informações sobre o processo estão disponíveis aqui.
Para assistir à palestra de abertura do XX Simpósio Internacional IHU - A (I)Relevância pública do cristianismo num mundo em transformação, intitulada "Presença fragmentada. O mal-estar pós-moderno do Cristianismo", ministrada pelo Prof. Dr. Armando Matteo, acesse o vídeo abaixo.
Na última sexta-feira, 11 de junho, foi ministrada a conferência "A Igreja e união de pessoas do mesmo sexo: o Responsum e seus impactos pastorais", pelo Prof. Dr. Michael G. Lawler e o Prof. Dr. Todd A. Salzman, que também integram a programação do Simpósio. A palestra está disponível no vídeo abaixo.
Armando Matteo é professor de Teologia Fundamental na Pontifícia Universidade Urbaniana de Roma e recentemente foi nomeado pelo Papa Francisco como subsecretário adjunto da Congregação para a Doutrina da Fé.
Desde 2019 é editor do Jornal da Universidade Urbaniana. Ele é autor de vários ensaios, incluindo: "Come Strestieri. Por que o cristianismo se tornou estranho aos homens e mulheres de nosso tempo" (2008), "A primeira geração na descrença. A difícil relação dos jovens com a Igreja" (2010), "A fuga dos quarenta anos. A difícil relação das mulheres com a Igreja" (2012), "Todos morrem muito jovens. Como a longevidade está mudando nossas vidas e nossa fé" (2016) e "Todos jovens, sem jovens. As expectativas não cumpridas da primeira geração incrédula" (2018). Seu último livro é Pastoral 4.0: eclissi dell’adulto e trasmissione delle fede alle nuove generazioni” ("Pastoral 4.0: eclipse do adulto e transmissão das fés às novas gerações", em tradução livre, EDB, 2020).
O Prof. Dr. Matteo apresentou a primeira palestra do XX Simpósio Internacional IHU: "Presença fragmentada. O mal-estar pós-moderno do Cristianismo", na sexta-feira, 04 de junho de 2021, às 10h.
Prof. Dr. Armando Matteo. Foto: Missionari Saveriani
Charles Taylor é professor emérito do Departamento de Filosofia da McGill University, no Canadá, e autor de livros influentes, incluindo “As fontes do self: a construção da identidade moderna” (Loyola, 2010), “A ética da autenticidade” (É Realizações, 2011) e “Uma era secular” (Unisinos, 2010). Ele recebeu muitas homenagens, incluindo o Prêmio Templeton e o Prêmio Berggruen.
O Prof. Dr. Taylor proferirá a palestra: "Secularização e o papel do cristianismo hoje. Desafios e perspectivas", na quinta-feira, 17 de junho de 2021, às 10h.
Prof. Dr. Charles Taylor. Foto: Central European University | Flickr CC
Francesco Cosentino é professor de Teologia Fundamental da Pontifícia Universidade Gregoriana, de Roma.
É Bacharel em Teologia pela Pontifícia Universidade Teológica da Itália Meridional, Doutor em Teologia Fundamental pela Pontifícia Universidade Gregoriana, com a tese "Para além da 'morte de Deus': Cristianismo, imaginação, imagens de Deus. Para uma resposta teológica ao ateísmo contemporâneo". Atualmente trabalha com a Congregação para o Clero, do Vaticano. É autor dos livros "Dalla fine del mondo. Il sogno di Papa Francesco sulla Chiesa" (Ed. Tau, 2016), "Incredulità" (Ed. Cittadella, 2017) e "Lievito nella pasta. Evangelizzare la città postmoderna" (EMP, 2018) e, publicado neste ano, "Quando finisce la notte – Credere dopo la crisi" ("Quando a noite termina - Acreditar depois da crise", em tradução livre, EDB).
O Prof. Dr. Cosentino ministrará a palestra: "O declínio do cristianismo: possibilidade de um novo começo para a fé cristã?", na segunda-feira, 12 de julho de 2021, às 10h.
Prof. Dr. Francesco Cosentino. Foto: Dongi
Todd Salzman é professor na Creighton University, EUA. Ele tem doutorado em Teologia pela Universidade Católica de Lovaina, na Bélgica. Foi professor na University San Diego. Foi homenageado pelas Nações Unidas e várias organizações não-governamentais (ONGs), em Nova York, em 2001. Autor de diversos livros e artigos científicos, citamos "A pessoa sexual: por uma Antropologia Católica renovada" (Ed. Unisinos, 2008) e, recentemente, pelo IHU, "Amoris Laetitia: aspectos antropológicos e metodológicos e suas implicações para a teologia moral", no Cadernos Teologia Pública, Nº 136.
O Prof. Dr. Salzman proferirá a palestra: "O magistério moral da Igreja no contexto do pontificado do Papa Francisco: desafios e perspectivas", na quinta-feira, 19 de agosto de 2021, às 10h.
Prof. Dr. Todd Salzman. Foto: Catholic Ethics
Tina Beattie é professora de Estudos Católicos na Universidade de Roehampton, em Londres, e diretora do Digby Stuart Research Centre for Religion, Society and Human Flourishing. Suas pesquisas versam sobre teologia católica, teologia feminista e teoria psicanalítica. Entre suas publicações, destacamos "Theology after Postmodernity: Divining the Void" (Londres: Oxford University Press, 2013) e "New Catholic Feminism: Theology and Theory" (Londres: Routledge, 2006). Também escreve para The Tablet e The Guardian.
A Profa. Dra. Beattie proferirá a palestra: "Mulheres na vida da Igreja. Avanços e obstáculos no Pontificado de Francisco", na quinta-feira, 02 de setembro de 2021, às 10h.
Profa. Dra. Tina Beattie. Foto: Site pessoal
Felix Wilfred é professor emérito da Faculdade de Filosofia e Pensamento Religioso, da Universidade de Madras, Chennai, Índia. É Mestre em Filosofia e Doutor em Teologia pela Pontifícia Universidade Urbaniana, de Roma. Foi presidente da Revista Internacional de Teologia Concilium e colaborador da Enciclopédia Católica Nova, Lexikon für Theologie und Kirche, Quaestiones disputatae, ambas publicações alemãs. Além disso, contribui para "Os teólogos modernos" (Cambridge, UK) e "Dicionário do Cristianismo Cambridge", Universidade de Cambridge, Reino Unido.
O Prof. Dr. Wilfred proferirá a palestra: "O cristianismo em face das grandes questões do mundo atual. Desafios e Perspectivas", na quinta-feira, 09 de setembro de 2021, às 10h.
Prof. Dr. Felix Wilfred. Foto: Misereor
Andrea Grillo é filósofo e teólogo italiano, leigo, especialista em liturgia e pastoral, professor do Pontifício Ateneu Santo Anselmo, de Roma, do Instituto Teológico Marchigiano, de Ancona, e do Instituto de Liturgia Pastoral da Abadia de Santa Giustina, de Pádua. Ele é Doutor em teologia pelo Instituto de Liturgia Pastoral, de Pádua. Também é membro da Associação Teológica Italiana e da Associação dos Professores de Liturgia da Itália.
O Prof. Dr. Andrea Grillo proferirá a palestra: "A crise do cristianismo e o futuro da fé cristã. Desafios e possibilidades para a teologia hoje", na quinta-feira, 07 de outubro de 2021, às 10h.
Prof. Dr. Andrea Grillo. Foto: Breviarium
Anne-Marie Pelletier é licenciada em literatura moderna e possui doutorado em Estudos da Religião. É professora emérita da Université Paris-Est-Marne-la-Vallée. Suas publicações se concentram na hermenêutica bíblica ("D’âge en âge, les Écritures", Lessius, 2004) e na antropologia ("Questions éthiques et sagesse biblique", 2018). Há vários anos, ela também busca uma reflexão sobre o feminino sob o prisma da revelação bíblica ("Le christianisme et les femmes", 2001 ; "Le signe de la femme", 2006 ; "L’Église, des femmes avec des hommes, à paraître au Cerf en septembre", 2019).
A Profa. Dra. Anne-Marie Pelletier proferirá a palestra: "A crise do cristianismo hoje. Uma abordagem na perspectiva das mulheres", na quarta-feira, 13 de outubro de 2021, às 10h.
Profa. Dra. Anne-Marie Pelletier. Foto: Site pessoal
Alec Ryrie é pastor anglicano, professor visitante de História da Religião do Gresham College, Inglaterra. Ele é Bacharel em História pela Cambridge University, Mestre em Estudos da Reforma pela University of St. Andrews e Doutor em Teologia pelo St. Cross College, de Oxford, Inglaterra. Sua tese foi publicada em formato de livro com o título "The Gospel and Henry VIII". Ele é presidente da Sociedade de História Eclesiástica, editor do The Jorunal of Ecclesiastical History. É autor dos livros "Private and Domestic Devotion in Early Modern Britain" (Ed. Routledge, 2016), "Unbelievers: An Emotional History of Doubt” (Ed. Harvard University, 2019)
O Prof. Dr. Ryrie proferirá a palestra: "Valores cristãos, valores seculares e por que eles precisarão uns dos outros na década de 2020", na terça-feira, 09 de novembro de 2021, às 10h
Prof. Dr. Alec Ryrie. Foto: Gresham College | Flickr CC
XX Simpósio Internacional IHU. A (I)Relevância pública do cristianismo num mundo em transição
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